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JULIE & JULIA
O interesse de duas mulheres em
divulgar, entre os americanos de
classe média, em épocas
diferentes, o gosto pela
culinária francesa, a mais rica
e variada do mundo, oferece tema
à comédia romântica Julie &
Julia, de Nora Ephron, que,
a despeito de ter magníficas
interpretações, principalmente
as de Meryl Streep e de Amy
Adams, não chega a ser, por
diversas razões, uma película de
pleno agrado e convencimento.
O roteiro, também de Ephron, foi
elaborado com base em dois
livros de memórias, editados
praticamente numa mesma ocasião:
o de Julia Child e o de Julie
Powell. A primeira, Julia (Meryl
Streep), era uma professora
interiorana, de Massachusetts,
casada com um diplomata, Paul
Child (Stanley Tucci),
designado, na década de
cinquenta, para servir como
adido cultural junto à embaixada
dos EUA em Paris.
A segunda, Julie (Amy Adams), é
uma frustrada funcionária
pública, casada com Eric Powell
(Chris Messina), editor de uma
revista, que, nos dias atuais,
vivendo num cubículo (quarto,
sala e cozinha), em cima de uma
pizzaria, no Queens (NY),
resolve divulgar, num blog, suas
experiências com as receitas
culinárias, dadas por Child em
seu livro Mastering the Art
of French Cooking, de grande
tiragem.
Para mesclar as duas histórias,
cujo espaçamento deve ser de
mais de quarenta anos, Ephron
conduz a narrativa pela maneira
mais convencional possível, sem
evitar o uso de clichês e
algumas indesejáveis quedas no
ritmo. Inicia com a chegada a
Paris do casal Child que, após
se instalar num amplo
apartamento, sai à procura de um
restaurante, onde é servido aos
dois, com o devido requinte, um
linguado frito na manteiga.
Julia, que é apaixonada pela
cultura francesa, vai ao
delírio, no dia seguinte, ao
visitar uma feira da cidade. E
decide que, para não ficar sem
fazer nada, enquanto o marido
trabalha na embaixada, ela
deverá frequentar a famosa
escola de culinária Le
Cordon Bleu. Embora a
diretora, Madame Brassart (Joan
Juliette Bruck), advirta-a de
que ela não tem o dom para ser
um chef de cozinha, cujo
curso de especialização é caro e
ministrado só para homens, Julia
não se intimida e enfrenta os
colegas de igual para igual,
mesmo nas tarefas mais
difíceis.
Nos tempos atuais, mais
precisamente após o atentado ao
World Trade Center, Julie,
em seu acanhado apartamento,
incentivada pelo marido, mas
criticada, ao telefone, pela
mãe, tenta conter, no caldeirão
de água fervente, duas lagostas
vivas para fazê-las, como é
preciso, ao termidor. E, depois,
experimenta preparar o boeuf
bourguignon que, mais tarde,
será servido a uma roda de
amigos, com o acompanhamento do
inapropriado, no caso, segundo
os gourmets, vinho
Bordeaux.
O roteiro de Ephron peca, a meu
ver, em não fazer a comparação,
que me parece óbvia, entre os
efeitos da política repressiva
do senador McCarthy, que os
Child enfrentaram na embaixada
de Paris, e as restrições aos
direitos civis impostas, nos
dias atuais, aos cidadãos, como
os Powell, pelo governo Bush à
conta do terrorismo. Fica meio
capenga nisso. E também nada
revela sobre as atividades
profissionais de Eric, que passa
o tempo, como um boboca, a
incensar a mulher, embrenhada
nas dispendiosas aventuras
culinárias até que, um dia, se
cansa e vai embora. Mas depois,
chamado por ela, sem uma
justificativa, ele retorna,
cordeirinho, cordeirinho, como
anteriormente.
Além disso, a reconstituição de
época em Paris, mesmo pontilhada
por canções evocativas da boa
trilha sonora de Alexandre
Desplat, apresenta diversas
falhas tanto pelo tom da
fotografia de Stephen Goldblatt
na cena, por exemplo, que
acontece à frente da livraria
Shakespeare & Co., como
pelos ângulos em que são
focalizados alguns dos pontos
turísticos da capital francesa,
que assumiram, ao que me parece,
característica um tanto quanto
diversa ao longo do tempo em que
transcorre a ação.
A interpretação de Meryl Streep,
porém, faz com que todos os
senões do filme sejam relegados.
A sutileza com que a atriz
recria a personagem – uma
caipira sulista, esnobe, de voz
estridente, insuportável, que
sabe que, com o dinheiro, tudo
se compra – é simplesmente
notável. Streep domina a cena e
demonstra seu prestígio ao ter,
ao seu lado, dois atores que,
com ela, recentemente atuaram:
Stanley Tucci, o estilista
gay de O Diabo Veste
Prada, e Amy Adams, a meiga
irmã James, de Dúvida,
que lhe deu o Oscar de Melhor
Atriz Coadjuvante. Os dois, como
sempre, estão perfeitos. E se
Chris Messina não se destaca
tanto é por causa da personagem
que lhe deram. Porque talento e
preparo técnico é evidente que
ele tem.
REYNALDO DOMINGOS
FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
JULIE & JULIA
EUA/2009
Duração – 123 minutos
Direção – Nora Ephron
Roteiro – Nora Ephron
Produção – John Bernard, Dianne
Dreyer, Nora Ephron e Amy
Robinson
Fotografia – Stephen Goldblatt
Trilha Sonora – Alexandre
Desplat
Edição – Richard Marks
Elenco – Meryl Streep (Julia
Child), Amy Adams (Julie Powell),
Stanley Tucci ( Paul Child),
Chris Messina (Eric Powell),
Joan Juliet Buck (Madame
Bressart)
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