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IEMANJÁ MARIA
Tereza
Halliday – Artesã de Textos
Conheci uma menina chamada
Iemanjá Maria. A cara do Brasil de todas as
crenças. Seu nome foi escolhido em homenagem à
deusa-mãe dos cultos afro-brasileiros e à grande
mãe dos cristãos, detentora de centenas de
invocações que confundem os não-católicos. Entre
elas: Nossa Senhora da Conceição, das Candeias,
dos Navegantes e da Piedade, com as quais se
mescla Iemanjá nos corações e mentes de muitos
devotos.
O sincretismo religioso
envolvendo Iemanjá e a Virgem Maria no Brasil,
foi imperativo de sobrevivência do culto
africano à deusa-rainha dos mares, também
invocada como Inaê e Janaína. Forma de escapar
da perseguição da Igreja Católica e da polícia,
vigente até a primeira metade do século XX. O
manto azul e branco de Nossa Senhora escondia e
protegia Iemanjá.
A religião católica também foi
mestra em sincretismo, não para se esconder, mas
para se espalhar. Ao longo dos séculos,
apropriou-se de festivais pré-cristãos e os
cristianizou, ocupando o espaço dos cultos
pagãos com celebrações cristãs, como a noite de
São João e a noite de Natal. No lugar onde foi
construída, nos séculos XII e XIII, a catedral
de Nossa Senhora de Chartres, na França, havia
um santuário celta onde se cultuava uma deusa –
“a Virgem que deverá dar à luz”. Conta-se que o
último sacerdote druida no local, chorou quando
um bispo lhe disse que o novo templo seria
dedicado à Virgem-Mãe Poderosa. Só podia ser
aquela que os druidas entronizavam muito antes
de Jesus nascer.
Por trás das devoções à Virgem
celta, Iemanjá e Maria, está a profunda
necessidade humana de uma super-mãe que nos
proteja, cuide de nós, atenda a nossos desejos.
Fiéis dos cultos afro-brasileiros (nem todos
afro-descendentes), invocam: “Minha Mãe
Iemanjá, leva para as profundezas do teu mar
sagrado, adoiá... todas as minhas desventuras e
infortúnios. Traz do teu mar todas as forças
espirituais para alento de nossas necessidades”.
Para eles, Iemanjá é a deusa da compaixão, do
perdão e do amor incondicional. Não muito
diferente dos católicos com a Virgem Maria,
nesta oração: “Salve Rainha, mãe de
Misericórdia, vida, doçura e esperança
nossa (...) esses vossos olhos misericordiosos a
nós volvei”. No cristianismo, a venerada
figura bíblica judia - Maria de Nazaré - não é
deusa, mas tem o status altíssimo de mãe de Deus
- aquela que deu à luz um bebê menino, de
natureza divina.
Carentes de misericórdia, de rumo
e prumo “pelos mares sem deuses desta
vida”, como notou Cecília Meireles, ansiamos
por uma fada-mãe, porto seguro, fornecedora de
perdão e segurança, quebradora de galhos,
tiradora do sufoco, cuidadora dos nossos
destinos, defensora, fonte de poder e amparo.
Assim, como Iemanjá e Maria Santíssima.
Mãe de tantos nomes, faces e
lugares: valei-nos em todas as datas, quadrantes
e carências e ilumina a rota do nosso barco.
Para que nosso envolvimento em futilidades e
pequenezas não nos leve a esquecer do que é
maior que o mar.
(Diário de
Pernambuco, 07/12/2009, p.A-11) |
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