DITADURA EM CONSTRUÇÃO _J. R. Guzzo_
Revista Oeste - 07 OUT 2022 -
O Brasil caminha para o segundo turno das
eleições, aquele que vai decidir quem será o
presidente do país nos próximos quatro anos, sob
o controle de uma ditadura. É algo inédito na
história nacional — uma ditadura exercida não
por um ditador com o apoio do Exército, mas pelo
Supremo Tribunal Federal, o TSE, sua principal
ferramenta nesta eleição, e os fungos que se
espalham à sua volta nos palácios de paxá onde
se hospedam os “tribunais superiores” de
Brasília. O fato de não ter existido uma coisa
dessas até agora, naturalmente, não muda em nada
sua essência de tumor maligno; é ditadura nova,
mas destrói a democracia como qualquer ditadura
velha. STF e TSE fazem hoje o que bem entendem
com o cidadão brasileiro, sem controle de
ninguém — e isso inclui acima de tudo, neste
momento, colocar Lula de novo na presidência da
República. Está valendo qualquer coisa, aí. Os
atuais proprietários da cúpula do Poder
Judiciário decidiram que Lula tem de ser
declarado vencedor da eleição do dia 30 de
outubro, de qualquer jeito. É a única conclusão
que aceitam para as atividades de militância
política que têm exercido nos últimos anos. Os
ministros e as forças que giram em volta deles,
na verdade, vêm dando o seu golpe de estado
desde 2018 — quando decidiram não aceitar a
vitória de Jair Bolsonaro nas eleições
presidenciais e passaram a destruir as leis para
expulsar o seu inimigo da política brasileira.
Chegaram, agora, ao momento decisivo do seu
projeto.
O último surto de violência da ditadura
STF-TSE foi rasgar da forma mais primitiva que
se possa imaginar a Constituição Federal do
Brasil: censuraram, sem a mínima tentativa de
disfarçar o que estavam fazendo, e sem o mínimo
apoio em qualquer tipo de lei, o diário Gazeta
do Povo, que circula há mais de 100 anos e
comete o crime, hoje, de ser um veículo
independente, afastado da esquerda, do
“consórcio nacional de veículos” e dos seus
sonhos de impor ao Brasil a imprensa de um
jornal só. A Gazeta publicou no Twitter, como
haviam feito outras postagens, notícias sobre a
expulsão da rede CNN da Nicarágua, e registrou
as maciças ações de repressão feitas pela
ditadura local contra a religião e os
religiosos. Lula não gostou: vive há anos uma
paixão tórrida com o ditador Daniel Ortega, e
ficou com medo de que a tirania do companheiro
pudesse lhe tirar algum voto no segundo turno,
este mesmo que ele diz que já ganhou. Não gostou
e correu ao TSE para pedir censura contra a
Gazeta do Povo — alguém poderia achar que ele,
sendo um admirador tão declarado do ditador,
seja também um admirador dos atos da sua
ditadura. Foi atendido na hora, é claro, como em
tudo o que exige dos ministros do alto
judiciário. Tem sido assim desde o primeiro dia
da campanha eleitoral; Lula manda, o TSE
obedece. Vai ser assim até o último. Isso é
democracia ou é ditadura?
Uma coisa é certa: depois que começa um
processo de destruição das liberdades, as
tiranias nunca devolvem o que tiraram.
É da essência das ditaduras fazer coisas
exatamente como essa; ao mesmo tempo em que
agridem grosseiramente as leis, colocam de pé,
peça por peça, um absurdo em estado puro:
proibiram a Gazeta do Povo de divulgar fatos
absolutamente públicos, no mundo inteiro, e já
apresentados em toda a mídia mundial. Como
transformar em coisa secreta algo que milhões de
pessoas já estão sabendo? É como Dilma com a sua
pasta de dente — depois que saiu do tubo, não há
como pôr de novo para dentro. Nada mais natural,
nesta mesma falsificação desesperada das
realidades, do que o delírio judicial de negar o
encanto mútuo Lula-Ortega. O ministro que
obedeceu à ordem de Lula, neste caso da
Nicarágua, sustentou que a publicação das
informações e opiniões censuradas podia dar a
impressão — imaginem só, “dar a impressão” — que
Lula apoiaria o ditador; isso seria
“inverídico”. Como assim — “inverídico”? Há
vídeos gravados com os elogios de Lula a Ortega.
O PT soltou, até mesmo, uma nota oficial de
apoio ao tirano e à sua tirania. O que mais o
TSE e os seus ministros querem? O fato é que
Lula dá as ordens, com uma arrogância que o
regime militar nunca chegou a ter, e o TSE
obedece — o resto é pura invenção.
É preciso um esforço sobrenatural para se ter
confiança na limpeza de uma eleição feita desse
jeito — e, de qualquer modo, como se podem
esperar eleições democráticas numa ditadura? O
STF, a esquerda e o vasto consórcio que vai da
mídia aos empreiteiros de obras e aos banqueiros
socialistas montaram um embuste para retomar o
poder que haviam perdido. Começaram, desde a
eleição de 2018, a dizer que Bolsonaro iria
“destruir a democracia”; para salvar o Brasil
deste horror, então, os ministros do STF
passaram a violar de forma sistemática as leis,
para perseguir o governo e seus adeptos, e a dar
cada vez mais poderes a si próprios. Disso
resultou a ditadura que temos hoje aí. Ainda não
tem tudo aquilo que uma ditadura precisa, como
nas Nicaráguas e Cubas que as supremas cortes
colocaram sob sua proteção por determinação de
Lula. Mas uma coisa é certa: depois que começa
um processo de destruição das liberdades, as
tiranias nunca devolvem o que tiraram — ao
contrário, vão tirando cada vez mais. Lula,
mesmo sem ter o seu precioso “controle social
sobre os meios de comunicação”, já pratica a
censura agora; proíbe notícias sobre a Nicarágua
e é obedecido no ato. E depois que for
presidente — por acaso vai de parar de censurar?
Vai ouvir democraticamente as críticas e as
informações que o desagradam? E os seus
parceiros dos tribunais superiores? Eles violam
a lei e a Constituição agora. Vão parar de fazer
isso depois do dia 30 de outubro? Todos aí —
Lula, STF e quem mais está do seu lado — se
convenceram, da maneira mais conveniente para
eles todos, que para salvar a democracia é
preciso destruir a democracia todos os dias. É
uma fraude, mas está dando certo — parar por
que, então?
A ditadura pode não estar completa, mas já
tem o seu currículo de obras. Fazem censura,
como no caso da Gazeta do Povo. Pressionam,
exatamente pelos mesmos motivos, o programa Os
Pingos nos Is, da Rádio Jovem Pan. Mandam a
polícia às 6 horas da manhã invadir residências
e escritórios de cidadãos cujo delito foi
conversar entre si num grupo particular de
WhatsApp.
“Desmonetizam” quem apoia o governo nas redes
sociais, ou fala mal do complexo Lula-PT.
Prendem pessoas que não têm ninguém a quem
recorrer — só ao próprio STF, o que transforma
os seus direitos numa piada. Bloqueiam contas no
banco para punir gente de “direita” — ser de
“direita” passou, na prática do STF, a
configurar infração penal. Prendeu durante nove
meses um deputado federal em pleno exercício do
mandato — por delito de opinião, o que é
proibido de forma absoluta na lei, sem que ele
tivesse cometido crime inafiançável e sem que
fosse preso em flagrante na prática deste crime.
Foi um triplo zero em matéria de legalidade. A
ditadura do judiciário, a propósito, ignora até
hoje o perdão legal que o deputado recebeu do
presidente da República — proibiu a sua
candidatura nessas eleições, é claro, e o impede
de exercer os seus direitos de cidadão. Por que
não poderia acontecer de novo, no minuto que
Alexandre Moraes ou outro resolva? Ele tem a
polícia debaixo das suas ordens diretas; num
país em que as forças armadas têm armas, mas não
têm autoridade para fazer nada, é mais do que
suficiente para qualquer violência.
No Brasil fica na cadeia quem os ministros
STF querem, e por quanto tempo quiserem.
Fala-se muito, desde o dia da eleição, em
crescimento do número de adeptos do presidente
Bolsonaro no Senado — e a ”nova situação” que
isso poderia trazer para o STF. Mas o que vale
na vida real o mandato de um senador, ou de
qualquer parlamentar eleito pela população
brasileira? Não vale nada. Alexandre Moraes, ou
algum barroso, fachin, etc. que anda por aí pode
mandar a Polícia Federal prender qualquer
senador, e na hora que lhe der na telha. A PF
vai obedecer — hoje ela não cumpre mais as leis
do país, cumpre apenas as ordens de Moraes, como
numa capatazia de senzala. O presidente do
Senado vai perguntar se o Supremo quer mais
alguma coisa; querendo é só pedir, Excelência. O
infeliz do senador pode ficar trancado numa cela
por quanto tempo o STF quiser — até o resto da
vida, em tese, pois a vítima não poderá recorrer
à justiça para fazer valer seus direitos. Só
pode recorrer a quem ordenou a sua prisão. Que
tal? É verdade que prisão de senador é coisa que
não aconteceu até hoje. Não aconteceu porque não
foi preciso. O Senado, o único poder da
República que pode tomar medidas para deter o
STF, vive de quatro diante dos ministros, que
julgam as causas dos escritórios de advocacia
ligados aos senadores, sem falar dos enroscos de
muitos deles com o Código Penal. Esperar o que
disso aí? Nem um abaixo-assinado com 3 milhões
de assinaturas pedindo o julgamento de ministros
do STF por violação das leis foi aceito pelo
presidente do Senado: o que mais seria preciso,
para mostrar a vontade da população nesse caso?
Quem decide se os pedidos são examinados ou não
é o presidente do Senado, e o cidadão que está
atualmente nesta cadeira é possivelmente o
senador mais obediente do mundo; trata os
membros do STF não como pares de um outro poder,
mas como senhores a quem deve vassalagem. Ele é
um beneficiário direto da ditadura do
Judiciário. Por que iria mudar?
O centro da infecção está intacto, e, como em
geral acontece nestes casos, a infecção se
espalha pelo organismo todo; é difícil haver
ditadura de um lado e democracia de outro. O
ex-presidente de um partido político de direita,
para acrescentar um último exemplo, está preso,
em prisão domiciliar. Não existe a mais remota
indicação de que possa sair de lá um dia, porque
Moraes não quer que ele saia, os outros
ministros vão atrás, e acabou a conversa. Em
democracia de verdade a cadeia é só para quem
está condenado legalmente ou aguardando o
julgamento, que tem de ser feito dentro de
prazos fixados em lei; no Brasil fica na cadeia
quem os ministros STF querem, e por quanto tempo
quiserem. Dizem que “não é assim”. Mentira; é
exatamente assim. Também dizem que estão
salvando a democracia com censura à imprensa,
polícia na casa das pessoas às 6 da manhã e a
autoridade eleitoral posta a serviço de um dos
candidatos. É golpe, apenas isso — um golpe que
está a caminho de sua conclusão. |