O Enfermeiro da Noite
Uma enfermeira
sobrecarregada faz amizade
com um novo colega no
trabalho. Até que uma morte
inesperada a faz enxergá-lo
de outra forma.
Estrelando:Eddie
Redmayne,Jessica
Chastain,Nnamdi Asomugha
De: LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
Date: sáb., 29 de out. de 2022
O BOM ENFERMEIRO
Amy não estava bem. Seu trabalho na UTI
demandava um esforço sem fim. E lá estava ela
prestando seu apoio ao casal setentão, casados
há cerca de três anos, mas parecendo ainda em
lua de mel. Ele, moreno, um pouco gordo,
debruçado sobre a cama na qual sua companheira
permanecia deitada. Magra, com muitas rugas e
vastos cabelos. O esposo não queria ir para
casa. E a doente não queria ficar sozinha.
Então, contra as regras do hospital que proibiam
a permanência dos acompanhantes, Amy sugere que
ele use a poltrona reclinável e lhe fornece um
cobertor.
Sua chefe lhe chama para adverti-la e
aproveita para lhe dizer que o hospital vai
receber um novo enfermeiro. Que parece um bom
profissional. Amy se sente mais animada, mesmo
porque começou a sentir os sintomas graves de
uma séria cardiopatia, que lhe deixa com dores e
sem forças. E somente após quatro
meses completa o tempo para que ela possa usar o
plano de saúde e fazer um transplante de
coração. Quando chega o novo colega de trabalho,
ela encontra um apoio e um novo amigo, que
começa a frequentar sua casa e a ter intimidade
com suas filhas pequenas.
Naquela altura pacientes já começavam a
morrer aleatoriamente, novos e velhos, sem uma
causa identificável. Mesmo porque a direção do
hospital nega informações, fornece dados
limitados e atrasa os contatos. No entanto, dois
detetives se interessam pelo caso e mesmo com o
primeiro paciente cremado, ou seja, sem
corpo para periciar eles continuam a
investigação. Com outras mortes no hospital, Amy
começa a observar e vê Charlie com medicamentos
e mexendo nos sacos de soro. Porém, nada consta
nos documentos que ele utiliza para conseguir os
medicamentos. Pois os pedidos são encerrados,
como se ele não os retirasse. Contactada pelos
detetives e já desconfiada do colega, Amy
esclarece que mesmo assim é possível retirar os
medicamentos - antes que a gaveta nos quais são
guardados venha a fechar. Enquanto isso, a
perícia nos cadáveres demonstra uma dose
excessiva de insulina e deoxidina (duxidina) .
Remédios não indicados para os casos. Amy
continua observando o colega e vê que ele injeta
os medicamentos nos sacos de soro. Dessa
forma, ele é um assassino sem rastros.
Angustiada e zelando por seus pacientes Amy
coopera com a polícia e termina por conseguir
uma confissão de Charles.
O filme é dirigido por Tobias Lindholm,
cineasta e roteirista dinamarquês. Em preto e
branco, com o uso interessante de claros e
escuros para criar o suspense. Uma câmera que
acompanha os acontecimentos no tempo certo. Um
ótimo roteiro de Kristy Wilson – Caims. E um
casal de personagens principais cheios de
talento. Ambos ganhadores do Oscar. Amy é
Jessica Chastain, atriz e produtora nos EUA,
nascida em 1977. Charlie é Edward John David
Redmayne, um excelente e jovem ator inglês, que
transitou por vários filmes e os mais diversos
personagens, com uma atuação carregada de tensão
e autenticidade. Ele é produtor também e foi o
astro de Garota Dinamarquesa e Estranhas
Coisas. O filme é baseado no livro “O bom
Enfermeiro” de Charles Graeber e se trata de uma
história verdadeira. Recebe no Brasil o título
de “Enfermeiro da Noite”. Em inglês, “O bom
enfermeiro". E é encontrado na Netflix. Lembra
as mais de cem mortes causadas por um enfermeiro
no Rio de Janeiro, dizendo ele que era
para receber propinas das funerárias. Ele foi
preso, mas as funerárias nunca foram
investigadas, nem o hospital - pela falta de
fiscalização dos serviços e os assassinatos.
Enquanto isso, as funerárias permanecem nos
hospitais assediando parentes de pacientes
mortos, sabendo antecipadamente quem são. Se o
Estado fornecesse os caixões, talvez a realidade
fosse diferente. Sem falar na exploração
dos cemitérios pela iniciativa privada. Em uma
sociedade injusta e desigual, até a morte é
economicamente
impraticável.
Na verdade, a vida de pacientes em
hospitais está, principalmente, nas mãos dos
enfermeiros e técnicos de enfermagem. Observando
que, cada vez mais, os enfermeiros de curso
superior se afastam dos pacientes e os cuidados
são entregues aos técnicos e agentes de
enfermagem. Quantos destes cursos são
fiscalizados pelo MEC? Por outro lado, sem um
sistema de admissão realmente rigoroso, sem uma
fiscalização séria dos serviços muita coisa pode
acontecer entre as paredes de um hospital. Na
vida real, para aumento dos lucros, alguns
hospitais podem optar por uma política de
redução dos custos, empregando os menos capazes.
Sem reconhecerem também a importância do
trabalho de enfermagem. Basta lembrar o escarcéu
que estão fazendo com o novo piso salarial da
categoria. Só para saber: quanto ganha um
Diretor de Hospital?
E até que ponto o corporativismo e o
medo deixam passar os mais escabrosos casos de
morte ou exploração dos pacientes? Por exemplo,
no caso do médico no Brasil que fazia sexo oral
com as pacientes sedadas após o parto - os
outros médicos companheiros de trabalho não
notaram nada? Como os obstetras não perceberam
a sedação indevida das pacientes? Foi um
pequeno, corajoso e íntegro grupo de enfermeiros
e técnicos de enfermagem que descobriu,
mobilizou a polícia e provou o ato criminoso.
Na história real do filme “O bom Enfermeiro”,
Charles é um serial killer, que até ser preso
continuou matando por omissão dos hospitais que
silenciaram, para não se envolverem em
processos. Assim, ele trabalhou em 19 hospitais
e matou cerca de 400 pessoas. O assassino
recebeu prisão perpétua, sem direito a revisão
para redução da pena. A enfermeira mudou-se
para a Florida, operou o coração e está bem. Mas
os hospitais não foram processados.
(10/2022/LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO) |