Theresa Catharina de Góes Campos

 

 

 
A FALÁCIA, DE ORDEM PSEUDO-HISTÓRICA, DE QUE HOUVE GOLPE DE ESTADO OU REVOLUÇÃO NA DATA DE 31 DE MARÇO DE 1964

Não houve. Nem uma coisa, nem outra. As duas versões, cultuadas pela esquerda e pela direita, são enganadoras, mentirosas, que têm como objetivo esconder ou dissimular, como é costumeiro, no Brasil,o que, de fato, aconteceu, naquela data, em Brasília.

Como jornalista de " O Estado de S. Paulo", credenciado no Congresso Nacional, passei a madrugada de 31 de março para 1º de abril, junto ao gabinete do presidente do Senado Federal, senador Auro de Moura Andrade, atento a tudo o que ali ocorria. Posso afirmar, que as versões acima citadas pretendem, antes de tudo, não reconhecer, primeiro, a atitude cívica, a meu ver, do ex-presidente João Goulart, de deixar, discretamente, em silêncio, o poder, sem espernear - como é moda hoje, em dia -, e sem tampouco escrever carta acusatória, a quem quer que fosse, como o fizera antes Jânio Quadros, vestindo assim, possivelmente, a indumentária de vítima, disputada na atualidade, ao tomar ciência das pressões que sobre ele, Goulart, se exerciam, tanto internamente, como as vindas do exterior. Essas, por sinal, fortíssimas, personificadas, principalmente, pelo embaixador Lincoln Gordon, dos EUA, que, com a regularidade, de mais ou menos trinta minutos, enviava, naquela madrugada, seus emissários, levando mensagens sigilosas ao presidente do Congresso Nacional.

Goulart viajou no avião presidencial para Porto Alegre, e, lá chegando, dirigiu- se prontamente para a sede do Comando do III Exército, chefiado pelo general Amaury Kruel, a fim de demovê-lo da ideia de marchar, com suas forças, para Brasília, no intuito de defender sua permanência no poder, como presidente eleito pelo povo brasileiro. Embora os jornalistas, lá presentes, não tivessem tido oportunidade de participarem das conversações, que ambos, reservadamente, ali trocaram, alguns deles captaram a afirmativa inicial, de João Goulart de que " não queria ver sangue de irmãos derramado por sua causa"!... Tudo o mais o que aconteceu, em Brasília, naquela angustiante madrugada, digo eu, sob o comando do senador Auro de Moura Andrade, foi exatamente o que estava prescrito na Carta Magna, vigente, de 1946. Por falta de comunicação, como a que temos hoje, graças à evolução dos aparelhos digitais, ele certamente se equivocou, ao anunciar, em sua alocução, ao Congresso reunido, a vacância do poder por já estar o presidente João Goulart fora do território brasileiro. Não era verdade. Goulart ouviu-o, pelo rádio, em silêncio, na sede do III Exército, cercado de jornalistas, com os quais, normalmente, gostava de conversar. E só viajou para a sua propriedade rural, no Uruguai, mais tarde, quase ao nascer do outro dia.

Ainda de acordo com os dispositivos constitucionais, vigentes, diante da vacância do cargo presidencial, assumiu-o, por um breve período, o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli ( 1964 ), até que, convocado, novamente, o Congresso Nacional se reuniu para eleger o marechal Castelo Branco como presidente da República, para exercer o mandato, de 1964-1967.

Eleito, Castelo Branco, um democrata convicto, de muitos bons conhecimentos intelectuais, conseguiu, em pouquíssimo tempo, formar um dos mais brilhantes ministérios da história desta República, integrado por figuras de escol, de conhecimentos técnicos específicos para as funções de que iriam cuidar, como, entre outros, Luís Viana Filho, Vasco Leitão da Cunha, Roberto Campos, Pedro Aleixo, Milton Campos, Flávio Suplicy de Lacerda, Costa e Silva, Severo Gomes, Octávio Gouveia de Bulhões, Eduardo Gomes, Paulo Egídio Martins, Luís Gonzaga do Nascimento e Silva e outros.

Então, eu fui designado, pelo jornal, o mais influente órgão de imprensa da ocasião, a cobrir os trabalhos presidenciais, no Palácio do Planalto. A missão - lembro-me bem - foi pesadíssima porque, logo, de início, o novo governo empreendeu fazer as já reclamadas reformas estruturais, criando o Banco Central - o país, sempre atrasado em tudo, era o único na América Latina, que não possuía a instituição -, bem como dando envergadura ao sistema financeiro nacional, no modelo que tem até hoje.

Em vista disso, era, a cada dia, mais volumoso o trabalho, que eu tinha, dando linguagem jornalística aos dispositivos de uma quantidade enorme de decretos, decretos-leis e projetos de leis, a serem remetidos ao Congresso Nacional, emitidos pela Presidência da República.

Diante de tudo isso, fico perplexo, ao ler os "catedráticos" de UOL dizerem que houve golpe de estado no dia 31 de março de 1964. Ou os militares aposentados, do Clube Militar, afirmarem que, naquela data, aconteceu uma revolução, no país. E me pergunto: - como eu não percebi isso? Será que eu vivia, naquela oportunidade, num país de sonhos?

Ponderando bem, em seguida, eu até concordaria com as duas partes, envolvidas, na questão de ser ou não ser, se elas concordassem em mudar a data para o golpe, ou para a revolução, para o dia 13 de dezembro de 1968, quando o presidente da República, general Arthur da Costa e Silva, premido pela situação de guerrilha urbana, com terroristas assaltando bancos, baixou o Ato Institucional número 05, engendrado pela mente do mineiro Francisco Campos, o mesmo que, a pedido de Getúlio Vargas, em 1937, criou o Estado Novo.... Mas essa seria certamente uma outra história!

Reynaldo D. Ferreira

 

Jornalismo com ética e solidariedade.