Theresa Catharina de Góes Campos

 

 

 
LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO: QUANDO A VIDA DÁ UM NÓ!

De: LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO

Date: ter., 20 de jun. de 2023

Subject: nó

QUANDO A VIDA DÁ UM NÓ!

Uma das coisas que mais me distraem na vida é pregar botões, costurar pedaços rasgados de roupa ou fazer barras de vestido. Por momentos o mundo fica suspenso. Nenhuma preocupação. Nenhuma lembrança perturbadora. Uma paz que chega de mansinho e aos poucos envolve a alma. Depois, a satisfação pelo trabalho realizado. O que não tem nada a ver com a beleza do acabamento ou a perfeição dos pontos. Pelo contrário! Sou péssima nos acabamentos. E sempre espero que aquela barra do vestido longo, por este motivo, não apareça aos olhos mais atentos das amigas.

Assim a costura se desenvolve e as horas passam sem perceber. No entanto, acontece sempre de aparecer um nó irremediável na linha. Que é sempre usada em grande comprimento e dobrada. E o fato de ser sempre muito extensa é para evitar, com pouca visão, ter de procurar mais vezes o pequeno buraco da agulha. Mas é exasperante estar tão em paz e, de repente, a agulha se recusar a trabalhar porque um nó impede de terminar o ponto a ser dado. Então, quando é possível, exercitando a paciência, talvez consiga desatar o nó. Vai levar algum tempo. Pois não se trata de um obstáculo qualquer. Ele fica entranhado nas finas linhas de carretel, de um jeito difícil de entender. E não sabemos por que uma frágil linha dobrada, consegue se impor com tanta resistência, se contorcendo em si mesma.

Assim, é possível imaginar que acontecem também em nossas vidas alguns nós de difícil solução. Principalmente os inesperados. Aquela discussão sem sentido que apareceu ao acaso, no trabalho ou em casa e que desandou em ofensas e mal-entendidos. Aquele trabalho que nos foi negado. O caso de amor que acabou de repente, sem que nos déssemos conta. Os nossos pecados. Enfim, dá para fazer uma lista relativamente grande dos nós que acontecem na vida.No entanto, muitas vezes, nascemos já enrolados. O nó fazendo parte de nossa maneira de ser no mundo. E lembro a declaração de um grande ator no Papo de Segunda, um programa do GNT. Acarinhado pela fama por seu desempenho em trabalho recente, ele, no entanto, confessou que sempre se julgou inferior a todo mundo. Referiu-se a quanto se julgava feio. Embora fato não comprovado. E ao ser perguntado acerca de seu casamento, ele respondeu de uma forma comovente. Ele afirmou, se não me falha a memória: “Ela me faz querer levantar todos os dias”. Apresentadas algumas fotos do casal, ela aparece sempre com um riso aberto, feliz da vida.

Para cada nó da vida, pensei, é preciso amor. É um baita e piegas lugar comum. Porque muitos de nós convivemos com a solidão, tentando dela desfrutar. Sim, podemos tentar resolver sozinhos os nós da vida. Valiosas liberdade e independência. No entanto, o aconchego, o ombro amigo, a cumplicidade respeitosa dos que nos cercam são muito bem-vindos. Não existe força maior para nos ajudar a desatar os nós que aparecem.

E se é para falar de amor, dizia o poeta Vinícius que é preciso ser fiel, sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro. “Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada – para viver um grande amor”. E continua: ´” É preciso um cuidado permanente não só com o corpo como com a mente pois qualquer “baixo” seu, a amada sente – e esfria um pouco o amor”. Mas uma sensação de completude aparece nas palavras de Mário Cesariny: “Tú estás em mim como eu estive no berço/ como a árvore sob sua crosta/ como o navio no fundo do mar”. (19/2023/luiza)

 

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