Uma escalada
de sentidos
salta de
falsas
narrativas
*Aylê-Salassié
Filgueiras
Quintão (89
"Vou nomear
sempre
alguém com
quem possa
conversar
por
telefone",
respondeu
Lula ao
jornalista, quando
questionado
sobre a
nomeação do
seu "amigão
pessoal" e
advogado
particular,
Cristiano
Zanin, para
ministro do
Supremo
Tribunal
Federal.
Seguindo por
esse
caminho,
para o
jurista Ives
Gandra,
a divisão
constitucional
entre
Poderes do
Estado no
Brasil tende
a virar
ornamento
nesta
imprevisível gestão
de Governo.
De fato. Até
a história
parece
perder a sua
utilidade .
Na semana
anterior,
Lula
recomendou
ao
ditador da
Venezuela,
Nicolás
Maduro,
recebido com
honras de
Chefe de
Estado :
"Faça sua
própria
narrativa". Ignorou
que Maduro
está com
cabeça à
prêmio (US$
75 mil) por
"crimes
contra a
humanidade", detectados
por uma
Comissão de
investigação
da
Organização
das Nações
Unidas (ONU)
: expulsão
de 3 a 4
milhões de
famílias,
perseguidas
como
Oposição ;
eleições
fraudulentas;
ligação com
o narcotráfico;
violência
policial
contra
civis; e
prisão de
centenas de
políticos .
São milhares
de venezuelanos
sendo
empurrados
para o
Brasil ( 700
mil ), para
a Colômbia (
1 milhão),
para o
Peru, para o
Chile, que
perdem a
cidadania.
Acrescem-se
a isso o
desemprego
e a fome no
País.
Os
venezuelanos
estão se
alimentando
de pombos e
gatos
domésticos,
cachorros de
rua e até
ratos, no
estilo dos
judeus
confinados
pelos
nazistas no
Gueto de
Varsóvia, na
Polônia,
registrado
pelo escritor
Leon Uris,
no livro "Mila
18". Para o
nosso
revolucionário
presidente
do Brasil ,
entretanto, "A
Venezuela é
uma
democracia
plena". É só
mudar a
narrativa.
O
desembarque
de Maduro
por aqui é
fruto de um
encontro de
presidentes
da América
do
Sul, inspirado
pelo
brasileiro,
batizado
de Cúpula
do Sul. Dele
saiu um
documento
intitulado Consenso
do Sul,
segundo o
qual todos
aqueles
países se
esforçariam,
a partir de
agora,
para desenvolver
uma política
ambiental
comum , a
criação de
um padrão
monetário
próprio ,
que
livrasse a
região de
moedas
externas, e
a
implantação
de uma
política de
fronteiras
mais
flexível (O
que é
isso?!).
É a
configuração
que se quer
para a
UNASUL -
União das
Nações Sul
Americanas.
Parece
próxima dos
ideais de
Vladimir
Putin para a
restauração
da velha
URSS-União
das
Repúblicas
Socialistas Soviéticas.
Enquanto o
líder
soviético,
com reservas
monetárias
limitadas e
estilo
stalinista
prefere utilizar-se
de forças
militares
contra os
territórios
vizinhos e
amigos (Chechênia,
Geórgia,
Ucrânia, Bielo
Rússia), o
líder do
Partido dos
Trabalhadores
no Brasil
confia na
sua retórica
artificiosa
e nos cofres
do BNDES.
Especula-se
que o
documento
assinado em
Brasília
teria
motivações
outras, que
não a
simples integração
regional.
Uma delas
seria
enterrar ou
incorporar
o Mercosul
definitivamente
à UNASUL .
Na opinião
de
Volodymyr
Zelenski, da
Ucrânia, o
brasileiro
estaria
tentando
emplacar-se
como uma
referência
regional .
Agora virá a
reunião com
os países
amazônicos, tratada
como uma
preliminar
Conferência
do Clima -
Cop 28, que
o brasileiro
projeta
para
ser realizada
em Belém . É
uma
oportunidade
calculada
para
desfilar
virtudes da
Amazônia e
arrecadar novas
doações em
dinheiro, em
nome do meio
ambiente.
Ora, se é
verdade,
ninguém dá
almoço
de graça.
Não se
cogita de
que a
estratégia
possa
representar
uma ameaça
à
integridade
da
unidade territorial
e política
do Brasil.
Na reunião
de Brasília,
alguns
presidentes,
principalmente
de países
que estão
dando calote
no Brasil -
só a
Venezuela
US$ 1,5
bilhão -,
baixavam a
cabeça para
o novo
documento,
evitando criticar
a narrativa
e a
coerência
do texto.
Lacalle Pou
, do
Uruguai,
acusado como
de
direita; e
Gabriel
Boric, do
Chile,
líder
histórico
da esquerda
no
Continente,
reagiram,
entretanto,
com pronunciamentos
duros contra
as
promessas,
atitudes,
posturas,
omissões e
compromissos
políticos pouco
explícitos
assumidos
pelo
presidente
brasileiro,
em viagens
ao exterior,
sobretudo,
fora
da comunidade
americana.
O
ex-presidente,
Fernando
Henrique
Cardoso, vem
advertindo
que "o
Brasil está
neste
momento carente
de bom
senso", ou -
quem sabe -
engajado em
um projeto
de Poder
mundial,
como o
da China .
Daí a
construção e
reconstrução
de
narrativas
novas sem
aderência
com a
realidade
interna. Para
não ficar na
dependência
da
iniciativa
privada , o
governo
brasileiro
está criando
mais 17
novos ministérios
, que vão se
juntar aos
23 já
existentes.
Serão
milhares de
novos
empregos
instituídos
no coração
do Estado, e
que vão
enfrentar
inovações
tecnológicas
introduzidas
na máquina
pública
pelos próprios
governos.
Não parece
ter relação
com
eficiência
da gestão
pública.
Alardeia-se
uma política
ambiental
comum e
transversalizada,
mas,
paradoxalmente,
o
País, importador
histórico de
petróleo,
tem
dificuldade
de
administrar
as pressões
dos
acionistas
da
Petrobrás e
do
agronegócio,
este
responsável
por não
deixar a
economia
entrar em
estado
distópico .
Sem ele
o PIB seria
negativo. O
marco
temporal
para a
demarcação
das terras
dos índios -
considerada
aquelas habitadas
por
indígenas
até 1988 -
legitima a
sua ocupação
pelos
negócios
agrícolas. A
invasão
de propriedades
rurais e a
reforma
agrária
tendem a ser
substituídas
por um amplo
recadastramento
rural .
Proposta
que visaria
redefinir
quem é ou
não
proprietário
rural e -
quem sabe no
meio urbano
-
no Brasil.
Os Sem Terra
e os Sem
Teto estão à
espera de
uma solução.
Por
açodamento
ou
competência relativa,
são muitos
os tropeços
pela frente.
No Congresso
uma Comissão
Parlamentar
de Inquérito
começa
desconstruir
a narrativa
oficial
da invasão
do Palácio
do Planalto,
constatando-se
, de um
lado, que
agentes do
novo
Governo, inclusive
próximos do
novo
Presidente,
facilitaram
a entrada
dos
invasores.
Em segundo
lugar, os
invasores
não seriam
exclusivamente
os mesmos
acampados à
frente do
quartel do
Exército, no
Setor
Militar
Urbano, mas
centenas de
militantes
que
desceram, em
Brasília, de
dezenas
de ônibus
para,
supostamente,
festejar a
posse de
Lula. A
narrativa
digerida
pela mídia,
e
deglutida pelo
Judiciário,
teria sido
construída
marquetologicamente,
similarmente
a eventos
anteriores com
grande
manipulação
sentimental
da população
.
Assim, aos
trancos e
barrancos,
as coisas
vão pulando
de uma
retórica,
aparentemente,
vazia, invasiva
e insensata,
acomodada no
STF, com
jurisprudências
duvidosas,
para ganhar
forma
no mundo
real . Os
brasileiros
estão
ficando
confusos.
Não sabem
mais
distinguir
com clareza
o que é uma
ditadura de
uma
democracia
social.
Ninguém sabe
para onde se
está indo, e
até com
quem, enfim,
se meteram.
Não existem
sinais de
futuro,
senão de
desconstrução.
A própria
frente
de oposição
no Congresso
esboça
reações
mas,
mostra-se
sensível à
liberação de
R$ 1,7
bilhão
de recursos
para as tais
emendas
parlamentares
. Dinheiro
vivo para
aprovação da
MP de
criação dos
novos
ministérios.
É a
legitimação,
de cara
limpa, do
"toma lá dá
cá", numa
afronta
geral, sem
constrangimentos.
E assim,
resolve-se
com um
telefonema
.
Pelo caminho
vão surgindo
alguns mais
conscientes
arrependidos,
como FHC ,
Joaquim
Barbosa e
partidos
mesmo. Mas o
leite está
derramado.
Tanto
Chávez
quanto
Maduro, ou
Ortega,
Putin
e outros
simularam
exatamente
assim. No
Equador, mal
foi
empossado, o
novo
Presidente
baixou um
ato
suspendendo
as
atividades
do
Congresso.
Resultado:
foi "impichado".
É
ingenuidade assumir
que Lula só
quer uma
visibilidade
universal.
Se é isso,
tem aí algo
de doentio,
vingativo e
narcisista
conduzindo o
Estado
Brasileiro.
A Nação nada
em um mar
de falsas
narrativas.
Está ficando
difícil
confiar em
alguma
coisa, em
instituições
ou em
alguém. O "fake"
começa,
enfim,
a ganhar
materialidade.
* Jornalista
e professor