LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO: CAPACIDADE DE DECIDIR!
De: LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
Date: qui., 14 de set. de 2023
CAPACIDADE DE DECIDIR!
Naquela manhã de segunda-feira, após a
apresentação da defesa no Tribunal do Júri, o
destino de Larry Gene Bell poderia ser decidido.
Ele era acusado de sequestrar, estuprar e matar
Shari Faye Smith de 16 anos. Recentemente,
também era suspeito de fazer o mesmo com uma
menina de 9 anos. Branco, 37 anos, residindo com
os pais, eletricista de profissão, seu histórico
apresentava agressões a mulheres jovens. Com
penalidades leves e liberdade. O caso agora era
mais grave. O que diria a defesa?Ao abrir os
trabalhos, o defensor apresentou testemunhos de
profissionais da área da saúde, começando por
uma assistente social cujo relatório se referia
às constantes faltas de Larry às consultas
psiquiátricas, além de mentir sobre sua mãe. Os
psiquiatras e psicólogos que o atenderam
referiram-se a distúrbios sérios. Desde o
diagnóstico de um sádico sexualmente desviante,
a um Q.I de 88 abaixo da média, além de
potenciais indicativos iniciais de psicose.
Swerling, o advogado de defesa, apostava sua
cartada na possibilidade de que o júri
considerasse seu cliente um indivíduo
irracional. E a conduta de Larry no tribunal
confirmava isto. Embora afirmasse, ao mesmo
tempo, que não era um doente mental. Testemunhos
de pessoas amigas do réu, o consideravam uma
pessoa confiável e se sentiam seguros em sua
companhia. Seu patrão e a esposa, no entanto,
estranharam suas constantes referências ao caso
de Shari Smith. Nas alegações finais, Swerling
afirmou para o júri que se a Promotoria não
tivesse apresentado provas satisfatórias, sem
deixar margem para dúvidas, “tratem de
inocentá-lo e libertá-lo.”
Para um julgamento mais justo os jurados
precisavam entender as alegações da Promotoria.
E as provas acusatórias eram fortes: testemunhas
oculares; telefonemas para a família da vítima;
identificação da voz do assassino; provas
forenses encontradas no “Último Desejo &
Testamento” escrito por Shari no cativeiro;
cabelos, fibras de tecidos, manchas de sangue no
protetor do colchão e nos sapatos do réu, as
gravações dos interrogatórios e acareação com a
irmã e mãe da vítima. E, para completar os
argumentos da Promotoria, o júri ouviu a
explanação de John Douglas, uma lenda do FBI, e
um dos principais especialistas e investigadores
de mentes assassinas e suas motivações. Ele
coordenava os trabalhos na Unidade de Ciência
Comportamental do FBI e seu departamento fora
convidado a participar das investigações do caso
Smith. Na verdade, os especialistas já estavam
trabalhando no caso. “Àquela altura, já tínhamos
um perfil (do suspeito) bem robusto à
disposição.”
O testemunho de John foi essencial para fazer
um retrato mais real de Larry, ao considerá-lo
responsável e capaz de planejar os crimes. Ao
ser perguntado qual suas impressões ao tratar
com o réu, John respondeu que o considerava
lúcido, muito racional e articulado. E
interessado em cooperar com as forças da Lei. E
mais, sua narrativa de se considerar com duas
personalidades, uma boa e outra má, não passava
de uma estratégia para livrar a cara. John
levara em conta ainda a racionalidade com a qual
o suspeito planejava suas ações criminosas. Ele
telefonava para a família da vítima de locais
diferentes, nunca era encontrado quando se
identificava o local das chamadas e, o mais
importante, nunca deixava uma prova de sua
presença. Tinha perfeito controle das decisões
de esconder o corpo. Dificultando muito o
trabalho investigativo.
De janeiro de 1988 a abril de 1993 a defesa
entrou com vários recursos em relação à
condenação de Larry à morte. Todos negados. E em
7 de setembro de 1996, dez anos depois e julgado
também pelo assassinato de Debra May, a criança
de 9 anos, a pedido do procurador-geral a
Suprema Corte da Carolina do Sul estabeleceu o
dia 4 de outubro para a execução de Larry Bell.
E em 4 de outubro de 1996, sexta-feira, ele foi
para a cadeira elétrica. Os autores do livro “O
chamado do serial Killer”, John Douglas e Mark
Olshaker, observam em suas considerações finais,
que qualquer um pode concluir se Larry Gene Bell
sofria de uma doença mental grave e eximi-lo de
culpa. Após vasta argumentação dos dois lados e
muito estudo, John menciona os argumentos que o
convenceram da culpabilidade de Larry e afirma:
“Questiono como alguém, seja qual for a
gravidade de sua anormalidade mental ou
emocional, poderia considerar aceitável
sequestrar, violar e matar duas garotas
inocentes, e a resposta a que chego é que isso é
impossível. O criminoso fez isso para satisfazer
um desejo próprio, apesar de saber que era uma
coisa errada e cruel”.
O caso me fez pensar que sem informação
necessária, sem estudo ou análise dos fatos, é
difícil decidir. E neste mundo de profunda
superficialidade na observação da realidade, o
grave pecado é se recusar a obter o maior número
de informações possíveis. Pois, sem aprofundar o
conhecimento, bombardeado por mentiras ou
aspectos superficiais do real, estamos entrando
no fundo do poço. E nos transformamos, de seres
racionais a fiéis depositários de inverdades, de
falsas narrativas e intransigentes quanto a
ouvir contra-argumentos. Assim, creio que não
resta muita esperança de dias melhores.
(set/2023/luiza) |