De pequenos deslizes
a declarações
capazes de detonar
grandes crises
diplomáticas, como
aquela na qual comparou
a ofensiva militar
israelense em Gaza
ao Holocausto,
Lula tem errado no
cálculo quando fala
sem um discurso
previamente
elaborado por
auxiliares ou se
rende à pressão
ideológica de seus
seguidores.
Integrantes do
governo demonstram,
em privado e sob
reserva, temor de
que situações como a
que detonou a crise
com Israel se
repitam e possam
causar problemas
ainda mais sérios
daqui até o final do
governo.
Outra preocupação é
com a maneira como o
presidente tem se
mostrado permeável à
influência de
algumas pessoas que
o cercam, em
especial a
primeira-dama Janja
Lula da Silva, e
repetido o que ouve
sem antes consultar
ou discutir os temas
mais delicados com
seus auxiliares.
Muitas vezes, as
derrapadas envolvem
temas caros à
militância petista e
de esquerda. Lula as
pronuncia de viva
voz como se falasse
apenas para seu
público, sem
considerar os
reflexos
institucionais. É
como se esquecesse
que é presidente — e
como se deixasse de
lado o fato
imperativo de que
tudo o que fala tem
implicações para o
país.
Lula parece bem
menos pragmático do
que em outros
tempos, mais exposto
a influências de
ordem ideológica
para agradar as suas
claques e, ainda,
mais suscetível a
gafes.
Nas declarações
sobre a guerra em
Gaza, no geral, e na
comparação dos
ataques de Israel ao
Holocausto, em
particular, há quem
veja boa dose de
influência de Janja.
É sabido que, sobre
esse tema, a
primeira-dama tem
posições que a
aproximam das
franjas mais
radicais da
militância. Ela não
esconde, por
exemplo, que entende
que a campanha de
Israel em Gaza é
genocídio. As falas
de Lula têm
refletido o que
Janja pensa,
observam esses
mesmos integrantes
do governo.
Além disso, há dedos
apontados também
para Celso Amorim,
assessor especial do
presidente para
assuntos
internacionais.
Super influente no
Planalto desde o
início do governo e
com poderes
comparáveis aos dos
poderosos
conselheiros de
segurança nacional
que servem aos
presidentes
americanos, Amorim
tem se mostrado mais
ideológico do que na
época em que ocupou
o cargo de
chanceler, nos dois
primeiros mandatos
de Lula. Com
frequência, suas
posições atropelam o
conhecido
pragmatismo do Itamaraty.
A ponto de Mauro
Vieira, o chanceler
oficial, ter que se
curvar.
Condescendente com
Putin e Maduro
No mesmo giro no
qual fez a mais do
que polêmica
declaração sobre a
guerra em Gaza,
também falando de
improviso, Lula
derrapou ao
responder perguntas
sobre a morte
de Alexei Navalny,
o principal opositor
de Vladimir Putin, e
sobre a expulsão
de observadores de
direitos humanos da
ONU pelo regime do
ditador venezuelano
Nicolás Maduro.
De Navalny, ele
disse que é preciso
primeiro aguardar o
resultado das
investigações, como
se fosse possível
esperar uma apuração
diligente e séria do
governo que já havia
tentado matá-lo
outras vezes.
“Senão você julga
agora que foi não
sei quem que mandou
matar e não foi.
Depois você vai
pedir desculpas?
Para que essa pressa
de acusar alguém?”,
respondeu.
Quando indagado
sobre a decisão do
regime de Maduro de
mandar embora da
Venezuela pelo menos
doze funcionários do
escritório local do
Alto Comissariado
das Nações Unidas
para os Direitos
Humanos, Lula saiu
igualmente pela
tangente.
Não tenho as
informações do que
está acontecendo na
Venezuela, a briga
da Venezuela com a
ONU”, declarou em
Adis Abeba, capital
da Etiópia, como se
um político que a
todo tempo se gaba
como o grande líder
sul-americano
pudesse simplesmente
não saber de algo
tão relevante
acontecendo ali do
lado, em um país
vizinho.
O risco da
autoconfiança
Seja com declarações
improvisadas que não
embutem o fator
diplomático, seja
assumindo posições
que levam mais em
conta simpatias
baseadas na
ideologia (no caso
de Maduro) ou em
cálculos de outra
ordem (no caso de
Putin, parceiro nos
Brics), Lula sem
script virou uma
preocupação até para
seus mais próximos
aliados pelo simples
risco de deflagrar
turbulências
inesperadas.
Por mais que se
saiba que é algo
quase impossível,
dado o conhecido
grau de
autoconfiança do
petista, no entorno
presidencial há quem
entenda que ele deva
cuidar melhor de
suas aparições
públicas.
Isso ajudaria não
apenas a evitar
crises, mas também
gafes desagradáveis
como a da semana
retrasada, quando o
presidente
brasileiro foi
convidado a plantar
uma oliveira na
embaixada da
Palestina em
Brasília.
Lula perguntou ao
embaixador Ibrahim
Alzeben quando
nasceriam as uvas (veja aqui).
O vídeo, publicado
em seus perfis,
viralizou nas redes
e a cena virou
motivo de piada.
Ninguém disse a ele,
no ato, que
oliveiras dão
azeitonas — e não
uvas.
Assim como a falta
de gente que possa
avisar claramente
quando se está
errado, excesso de
autoconfiança, quase
sempre, tem
consequências
desagradáveis.
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