O Brasil virou PáriaJ. R. Guzzo/Revista Oeste
Tinha de acontecer, mais cedo ou mais tarde — e
é óbvio que acabou acontecendo. O Supremo
Tribunal Federal tantas fez para proteger a
corrupção no Brasil, mas tantas, com tanta
arrogância e tão pouco caso com o decoro mínimo
esperado de sua conduta, que conseguiu enfim
chamar a atenção do mundo para o que estão
fazendo aqui. Um ano atrás a porção da
comunidade internacional que se considera mais
civilizada e mais apta a decretar regras de
comportamento para as demais festejava a
“vitória da democracia” no Brasil. Que sorte
para o planeta, não? O perigo do “populismo de
direita” foi derrotado. O amor venceu. O Brasil
“voltou”. Não contavam com a astúcia do ministro
Dias Toffoli. Em apenas um ano, com a sua
inédita sucessão de sentenças em favor da
ladroagem e dos ladrões, ele conseguiu demolir
toda essa conversa. Eis o Brasil, por sua conta,
colocado entre os párias do mundo — os países
sem lei, sem códigos morais e sem vergonha que
fazem parte da face escura da humanidade.
A destruição do STF como uma casa de respeito
já era obra avançada, com o teto e as paredes no
chão, pela atuação do ministro Alexandre de
Moraes. Ele, com o STF atrás de si, aboliu os
direitos civis que estão na Constituição para
instalar uma ditadura penal no Brasil —
aberração que transformou o Supremo em delegacia
de polícia destinada a reprimir adversários
políticos do regime atual. Mais dia, menos dia,
a sua vez vai chegar. Moraes tem tudo para
acabar no noticiário da imprensa internacional
como uma dessas figuras de Terceiro Mundo que
aparecem, de tempos em tempos, como sucessores
de Idi Amin quando o ditador entrava em sua
personalidade de magistrado. Mas Toffoli chegou
antes. A insegurança jurídica criada nos últimos
anos pelo STF, na qual ninguém sabe qual é a lei
que está valendo hoje, superou as fronteiras da
violação às garantias democráticas e mergulhou
de cabeça no bas-fond da roubalheira do Erário.
Aí já ficou demais. É como o sujeito que em vez
de tirar o calção de banho dentro da piscina,
para ninguém ver, sobe no trampolim para mostrar
a todo mundo que está nu.
A verdade sobre o alto Judiciário no Brasil,
conhecida aqui dentro, mas escondida nesse tempo
todo pela mídia internacional de primeira linha,
veio à luz do sol da pior maneira possível para
o STF. O Financial Times de Londres, que
funciona como um boletim de comportamento para
governos e nações de todo o mundo, publicou uma
exposição 100% objetiva, competente e arrasadora
sobre a atual disparada da corrupção no Brasil —
e o papel essencial que Toffoli e o STF exercem
nesse conto de horror. É muito ruim, porque o
Financial Times está entre a meia dúzia de
veículos de imprensa que são lidos em salas de
diretoria, reuniões de ministros do Primeiro
Mundo e os gatos mais gordos da alta burocracia
global. É acompanhado nos departamentos de
marketing e pelos fiscais mais severos da
obediência ao politicamente correto. Enfim, para
resumir a ópera: está entre as leituras
preferidas da turma de Davos que deixa Lula, a
ministra Marina e a direção do PT sempre tão
agitados. Pior que tudo, talvez, uma matéria
publicada ali serve como uma espécie de “liberou
geral” para a elite da mídia globalizada. Saiu
no FT? Então pode sair em qualquer lugar.
Notícia publicada no jornal Financial Times
(5/2/2024): “Supremo Tribunal Federal ordena
investigação de grupo anticorrupção” | Foto:
Reprodução/FT
Está tudo ali. A anulação da multa de R$ 10
bilhões da J&F e de R$ 3,8 bilhões da Odebrecht
que, por força de acordo judicial, as duas
empresas se comprometeram a pagar para seus
diretores não serem presos pelo crime de
corrupção ativa. Toffoli, sozinho, cancelou as
duas, de modo que os réus confessos nem foram
para a cadeia nem pagaram o que tinham de pagar.
É citado o relatório da Transparência
Internacional que rebaixou o Brasil em dez
posições na lista dos países mais corruptos do
mundo em 2023, sua pior colocação desde 1995 — e
que cita nove vezes o nome de Toffoli. O artigo
revela a destruição dos sete anos de luta contra
a corrupção feita pela Lava Jato. Cita os 2,2
mil anos de sentenças de prisão anulados em
favor dos 165 ladrões condenados. Menciona a
anotação que o Departamento do Tesouro dos
Estados Unidos fez sobre a ladroagem da
Petrobras nos governos Lula-Dilma — segundo os
americanos, o maior caso de propina já
registrado na história. Revela aos leitores mais
qualificados do mundo que Toffoli foi advogado
do PT antes de ser nomeado por Lula para o STF.
Informa que o ministro Cristiano Zanin foi
advogado pessoal do mesmo Lula.
É um desastre com perda total. “Graças às
decisões de Toffoli, o Brasil tornou-se um
cemitério de provas de crimes que geraram
miséria, violência e sofrimento humano”, diz o
Financial Times, citando o texto da
Transparência Internacional. “O país está se
tornando cada vez mais, aos olhos do mundo, um
exemplo de corrupção e de impunidade.” O jornal
informa também qual foi a reação do ministro
diante do relatório: mandou investigar
criminalmente a entidade, com base numa notícia
patentemente falsa, e já enterrada há muito
tempo, sobre ilegalidades imaginárias que teria
praticado no Brasil. É uma das regras de ouro da
filosofia penal do já citado Idi Amin. “Nós aqui
temos liberdade de expressão”, dizia ele. “O que
não podemos garantir é a liberdade de quem se
expressa.” É o puro STF do Brasil de hoje, só
que de efeito real equivalente a três vezes
zero. A Transparência Internacional tem sede em
Berlim. Não pode ser indiciada, desmonetizada ou
presa por Alexandre de Moraes e sua Polícia
Federal. É uma perfeita palhaçada. |