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("Bubble")
A INCURSÃO DE SODEBERGH NA OBRA DE BRESSON
“Bubble”, de Steve Sodebergh, é uma incursão
estilística e filosófica na obra de Robert
Bresson, falecido em 1999 – sob influência de
quem deve ter realizado sua formação
cinematográfica – tido pelos estudiosos como o
mais jansenista dos cineastas franceses, que não
usava uma linguagem seca, como ele próprio
admitia, mas ascética, como muitos hoje a
identificam.
É essa linguagem ascética, portanto, que o
espectador vai identificar, desde a primeira
imagem de Sodebergh, projetada na tela, que
mostra o amanhecer numa pequena, fria e
miserável cidade do Estado de Ohio – um dos
vários bolsões de pobreza do país que tem a mais
forte economia do mundo – onde Martha (Debbie
Doebereiner) e Kyle (Dustin James Ashley) são
amigos porque trabalham numa fábrica de bonecas.
Para eles, os dias, insípidos, são sempre
iguais. Ela, uma solteirona, obesa, levanta
muito cedo e depois de dar o café ao pai,
doente, pega o carro e apanha Kyle na porta de
casa – um trailer – para irem ambos trabalhar.
Já no percurso eles falam da necessidade da
fábrica de contratar mais um funcionário, pois,
a demanda de bonecas vem crescendo nos últimos
tempos.
A chegada de Rose (Misty Dawn Wilkins), que
trabalhara antes num asilo de idosos,
desestabiliza a amizade de Kyle e Martha, pois,
esta logo percebe o interesse da nova
funcionária - que não lhe causa boa impressão –
por seu único amigo. Uma manhã, depois de Rose
sair, na noite anterior, com Kyle, é encontrada
morta. A polícia é chamada para começar a
inquirição e, afinal, descobrir quem foi o
assassino.
Além da linguagem ascética de Bresson – que
lembra a de seu filme “Um condenado à morte
escapou” (1956) – também como ele, Sodebergh,
para narrar a história escrita por Coleman Hough,
usa gente do povo, não-atores, os quais, sem vôo
próprio, obedecem à risca às suas determinações.
Nesse particular, as intérpretes respondem
melhor às exigências impostas pela linha da
direção, que emprega variação de cores, na
fotografia de Peter Andrews, e apenas ponteio de
violão, como comentário musical, para destacar
o lado emocional da mais importante personagem.
É em Martha, em sua rotina de vida, sem
esperança, sem perspectiva e agravada pelo
desprezo, que Sodebergh fixa a questão da
ausência ou do silêncio de Deus, constante na
obra de Bresson. É essa questão, por exemplo,
que determina o suicídio da camponesa Mouchette,
em “Mouchette” (1967). E talvez seja também a
explicação para a última frase que Martha
pronuncia, no seu desespero: “Meu Deus!...”
Também como os filmes de Bresson, “Bubble” é de
curta duração – apenas 73 minutos - , tendo sido
rodado em três semanas, no ano passado, logo
depois que Sodebergh concluiu as filmagens de
“Marcas da Violência”, que poderia, a meu ver,
ter alcançado mais indicações ao Oscar do que
apenas a de Maria Bello como Melhor Atriz
Coadjuvante. Apesar disso, “Bubble” foi
selecionado para os Festivais de Toronto,
Veneza e Nova Iorque, nos quais - como não
poderia deixar de ser - foi bem recebido pela
crítica. Uma estratégia original se montou para
o lançamento do filme nos EUA, onde os
espectadores tiveram a opção de escolher ver a
obra de Sodebergh nos cinemas, na televisão de
alta definição ou em DVD, colocado também à
venda na data da estréia.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
Roteiro, Revista
www.noticiasculturais.com
www.arteculturanews.com
www.thereseacatharinacampos.com
FICHA TÉCNICA
BUBBLE
BUBBLE
EUA/Canadá, 2005
Duração 73 min.
Direção – Steven Sodebergh
Produção – Gregory Jacobs
Roteiro – Coleman Hough
Fotografia - Peter Andrews
Edição – Mary Ann Bernard
Elenco – Debbie Doebereiner (Martha), Dustin
James Ashley ( Kyle), Misty Dawn Wilkins (Rose),
Omar Cowen (pai de Martha), Laura Lee (mãe de
Kyle), David Hubbard (Pastor), Kyle Smith (Jake),
Decker Moody (Detetive).
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