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A Cidade Perdida
UMA DECLARAÇÃO DE AMOR A HAVANA
De: "REYNALDO
FERREIRA"
Data: Sat, 19 Aug 2006 06:11:11 -0300
Para: theresa.files@gmail.com
Assunto: A Cidade Perdida
Repasso-lhes, amigos, com modificações, o
meu comentário, enviado ontem, sobre o filme
"A Cidade Perdida", de Andy Garcia, cuja
exibição - restrita a um só cinema no
Aeroporto - vem sendo boicotada, por motivos
óbvios, em Brasilia. RDF
“A Cidade Perdida”, de Andy
Garcia e Guillermo Cabrera Infante, vítimas do
regime castrista, embora não seja um filme
exemplar do ponto de vista técnico, é, antes de
tudo, uma bela e comovente declaração de amor –
pontilhada por trilha sonora excepcional - à
cidade natal de seus realizadores, Havana, a
qual é por eles comparada a uma rosa.
A par disso o filme, ao narrar a vida da família
de um professor universitário, Don Federico
Fellove (Tomas Milian), que, seguidor das idéias
de Sêneca, acredita na democracia, é também um
contundente libelo contra as duas ditaduras em
tudo semelhantes que, desde os anos trinta do
século passado, sufocam o povo de Cuba – a de
Fulgência Batista (Juan Fernandez) e a de Fidel
Castro (Gonzalo Menendez) - tornando a vida na
ilha um sacrifício coletivo.
Para narrar a história da família Fellove, Andy
Garcia – que também interpreta o papel do
primogênito, Fico, proprietário de uma casa
noturna, El Tropico e apaixonado por
Aurora (Inês Sastre), mulher do seu irmão Luis
(Nestor Carbonell), cria uma linguagem estética
calcada em dois clássicos do cinema americano:
“Casablanca”, de Michael Curtiz e “O Poderoso
Chefão”, de Francis Ford Coppola. Há, pelo
menos, duas seqüências que são exatas
reconstituições de outras dos filmes citados.
A primeira, é a do idílio de Fico e Aurora – ao
estilo de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman – na
praia, se beijando ao encontro dos dois chapéus.
A segunda, é uma das mais belas e fortes do
filme, a do suicídio de Ricardo (Enrique
Murciano), arrependido por haver causado a morte
do tio e padrinho Donoso (Richard Bradford),
gourmet, plantador de fumo, por ele deposto da
propriedade a mando do governo revolucionário.
Mas há outras seqüências que credenciam o
trabalho de Garcia como diretor, como a da
despedida de Fico da família – a atuação, no
papel do patriarca, de Tomas Milian, ator de
Visconti e dos westerns italianos, é
simplesmente notável, especialmente neste
momento – e, a da tomada do palácio
presidencial, por estudantes, membros do
Diretório Revolucionário, que reconstitui, na
documentação fotográfica de Emmanuel Kadosh,
fato real, histórico, ocorrido em 1957, quando
perderam a vida 25 jovens cubanos.
É nessa seqüência de planos bem distribuídos -
a da tentativa de deposição, pela força, do
ditador Fulgêncio Batista - que Andy Garcia
restabelece, segundo ele, uma verdade histórica,
muitas vezes esquecida, a de que a revolução foi
inspirada, financiada e realizada por uma faixa
acomodada da classe média composta de advogados,
professores e estudantes. Foi, portanto, uma
revolução de intelectuais, antes de ser de
populares, ele acrescenta em entrevista
concedida à imprensa nos EUA.
Mas Garcia não fica só nisso, pois, ao focalizar
a personalidade de Ernesto Che Guevara –
revivido, no filme, pela atuação exemplar do
ator Jsu Garcia – ele o faz de maneira pouco
comum, mostrando o implacável guerrilheiro,
duro, sarcástico, distante daquela figura de
anjinho barroco do filme “Diários de
Motocicleta”, de cineasta brasileiro, Walter
Moreira Salles Júnior.
O que não suporto
– diz Andy Garcia – é que a história de Cuba
foi reescrita e idealizada. Segundo ele, a
personalidade de Che Guevara pode ter sido
recuperada pelo imaginário popular, mas, como
observa, não se pode esquecer também que o
guerrilheiro fez com que centenas de
prisioneiros, sob sua guarda, fossem executados,
no paredão, ilegalmente.
O grande defeito do filme reside, a meu ver, no
roteiro, de Cabrera Infante, que, apesar de ter
diálogos bem elaborados, com tiradas
espirituosas e irônicas, próprias do escritor,
falecido em fevereiro do ano passado, não
consegue conciliar a diversidade de temas
tratados – drama familiar, amor impossível e
fervor intelectual - e a variedade de
personagens, como ditadores, mafiosos,
revolucionários, guerrilheiros, artistas e
outros.
Vale observar, por exemplo, que o escritor (Bill
Murray), um expatriado americano, que acompanha
todas as situações enfrentadas por Fico, tendo
no filme o papel desempenhado pelo coro na
tragédia grega ou pelos bufões em algumas peças
shakespeareanas, é personagem, a meu ver,
absolutamente descartável, apesar da boa
interpretação do ator. Também tem boa atuação,
como sempre, Dustin Hoffman, nas duas aparições
que faz na pele do mafioso Meyer Lansky.
O mesmo não se pode dizer, entretanto, em
relação à interpretação de Andy Garcia, que, sob
o peso de tantas atribuições – as de produtor,
diretor e autor da música original do filme de
muita qualidade – está longe de repetir a
atuação que teve, por exemplo, além de tantas
outras, personificando o famoso trompetista
cubano, Arturo Sandoval, também exilado, vítima
do regime de Fidel Castro, em “A história de
Arturo Sandoval”, de Joseph Sargent, realizado
no ano de 2000.
Mas pior ainda, a meu ver, é a atuação de Inês
Sastre, como Aurora, modelo muito bonita, rosto
perfeito, mas sem qualquer qualificação para ser
atriz. A sua presença compromete as cenas em
que aparece no filme, mesmo as inspiradas em
“Casablanca” que poderiam, como acredito, fazer
com que ela apresentasse alguma coisa de mais
terno e sensível em termos de interpretação. Mas
não. Sastre é um desastre. O que deixa evidente
que há um longo caminho a percorrer para que
artistas da passarela, a exemplo dela, se tornem
atrizes. De qualquer forma, porém, “A Cidade
Perdida” - filme que por motivos óbvios, vem
sendo boicotado em Brasília, com exibição em
apenas um cinema no aeroporto - vale a pena ser
visto porque é um belo, comovente e nostálgico
hino de amor a Cuba, executado por dois de seus
mais brilhantes filhos exilados.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Revista
www.arteculturanews.com
www.noticiasculturais.com
www.theresacatharinacampos.com
FICHA TECNICA
A CIDADE PERDIDA
The Lost City
EUA (2005)
Duração – 143 min.
Direção – Andy Garcia
Roteiro – Guillermo Cabrera Infante
Produção – Andy Garcia e Frank Mancuso Jr.
Fotografia – Emmanuel Koodosh
Música Original – Andy Garcia
Edição – Christopher Cibelli
Elenco - Andy Garcia (Fico), Tomas Milian (Don
Federico), Inês Sastre (Aurora), Bill Murray
(escritor), Nestor Carbonell (Luis), Enrique
Murciano ( Ricardo) , Jsu Garcia (Che Guevara),
Juan Fernandez (Fulgêncio Batista), Richard
Bradford (Donoso), Gonzalo Menendez (Fidel
Castro), Dustin Hoffman (Meyer Lansky)
Data: Mon, 21 Aug
2006 12:21:46 -0300
De: "Theresa Catharina de Góes Campos"
Para: "REYNALDO FERREIRA"
Assunto: seu artigo está impecável, na forma e
no conteúdo. (A Cidade Perdida)
Prezado Reynaldo:
Só posso repetir o que eu já disse inúmeras
vezes, com razão e justiça, sobre outros textos
de sua autoria - o seu artigo sobre o filme " A
cidade perdida" está impecável, na forma e no
conteúdo, concordando eu com todas as
informações e os seus comentários, bem
objetivos.
Aproveito para lhe dizer que me dirigi aos
cinemas do aeroporto,para assistir, logo no
segundo dia de exibição, a essa obra pungente e
corajosa, que me agradou mais do que eu
esperava, antes de apreciá-la na tela. E logo
percebi que, de fato, havia um "boicote"
ideológico e político-partidário bastante
previsível!
Com PRIORIDADE UM, na próxima atualização,
começarei a divulgar o seu artigo, em várias
seções de meus sites, inclusive no Espaço do Rey.
Registro, ainda, que a matéria de divulgação de
A cidade perdida já está nesses sites, em
diversos locais, o que documenta a minha
recomendação do filme.
Muito obrigada por sua inestimável e regular
colaboração.
Abraços cordiais de
Theresa Catharina |
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