Theresa Catharina de Góes Campos

 

“MIAMI VICE”: EMPOLGA PELA DIREÇÃO

“Miami Vice”, de Michael Mann, baseada em série televisiva por ele próprio produzida na década de oitenta, embora esteja bem distante da obra-prima no gênero, “Os Intocáveis”, de Brian de Palma, é um filme de ação que se destaca pelo excelente controle de técnica cinematográfica de seu realizador e também pela beleza das imagens, feitas em vídeo digital de alta definição, que propicia intenso brilho às cores principalmente as de cenas noturnas da Capital da Flórida.

Apesar disso, o roteiro – elaborado por Mann em colaboração com Anthony Yerkovich, autor do seriado – é confuso, omisso e, a meu ver, um tanto destemperado no trato da questão política ocasionada pela forte presença de hispanos na região de Miami e adjacências. Se a trama, em si, não apresenta novidades -  nem muita ação, como era de  se esperar -  a linguagem cênica de Mann, realizador também do excelente “Colateral”, é suficientemente brilhante a fim de criar, para o espectador, tensão, erotismo e imprevisibilidade em várias seqüências, algumas notáveis.

O filme narra a história de dois agentes da Polícia de Miami, especializada no combate ao narcotráfico – James “Sonny” Crockett (Colin Farrell) e Ricardo Tubbs (Jamie Foxx) – que tomam para si a missão de se infiltrarem no mundo dos traficantes de drogas a fim de conseguirem desmantelar um cartel, que tem ramificações por todo o Continente Sul-Americano, inclusive em Cidade do Leste, na fronteira do Brasil com o Paraguai, onde o elogiável trabalho fotográfico de Dion Beebe dá destaque à exuberância das cataratas do rio Iguassu.

Já na seqüência inicial, que ocorre numa boate em Miami, percebe-se   que não há sintonia entre os dois agentes, motivada pelos atores, que parecem estar atuando, cada qual, em filmes diferentes.  Para melhor dizer, não há sentido de parceria, de cumplicidade, entre ambos. Foxx, detentor do Oscar, da Academia, pela interpretação de Ray Charles, está contido demais e, às vezes, hesitante como o detetive Ricardo. E Farrell, querendo tirar proveito da situação, insiste em ocupar espaço, sem ter, contudo, gabarito para isso porque é ator de poucos recursos e, pior, porque o bigode que criou para o personagem Sonny não o ajuda na composição de um detetive por mais que seu objetivo, na missão que tem a cumprir, seja o de disfarce.

De qualquer forma, porém, os dois agentes do filme, além de usarem roupas de estilo,  têm um toque mais humano do que os do seriado. Não se lhes omitem sequer o relacionamento amoroso. O personagem Sonny,  por exemplo, tem certa queda por mulheres de sangue latino, como a portuguesa, Rita (Ana Cristina de Oliveira), da boate em Miami,  que logo o seduz e, mais tarde, a contadora do cartel de traficantes, Isabella, uma sino-cubana, interpretada pela atriz, Gong Li, vista há pouco numa melhor atuação, em “Memórias de uma Gueixa”, de Rob Marshall

É do envolvimento de Sonny com Isabella por sinal que Michael Mann tira proveito para enriquecer seu trabalho, com apropriada dose de sensualidade e erotismo, extraída principalmente da seqüência, tomada de vários ângulos, que tem início na viagem de ambos, de Miami a Havana, numa lancha em alta velocidade e prossegue na dança do casal, marcada pela ritmada música cubana -  salsa -  num cabaré, para concluir, mais tarde, no embalo,  na cama, no apartamento dela...

Se com o filme anterior,  “Colateral”, Michael Mann obteve uma de suas duas indicações ao Oscar com  a  edição de Jim Miller e Paul Rubell – a segunda, foi a de Jamie Foxx como ator coadjuvante - , em ”Miami Vice” ele não conta certamente com essa possibilidade, pois há evidentes erros no trabalho assinado por William Goldenberg e Paul Rubell, principalmente nas seqüências finais. Da mesma forma, a trilha sonora que, se no filme anterior era riquíssima, com música de jazz, sobressaindo composições de Miles Davis, neste de agora  - com música original de John Murphy - nem tanto. Além de ser pobre a trilha sonora de “Miami Vice”, há nela  repetições de músicas usadas no filme anterior.

Os deslizes apontados,  do roteiro, de parte da equipe técnica e do elenco – não se pode destacar nem mesmo a estréia, no cinema americano, do bom ator espanhol, Luis Tosar, no papel do chefe do cartel, Arcángel de Jesus Montoya – não invalidam, contudo, o belo trabalho de direção de Michael Mann, que eleva o tom de uma série de televisão para o de um filme no estilo “noir”, propositalmente sombrio e violento, que prende e empolga o espectador durante seus 134 minutos de exibição. É  um bom espetáculo.

 

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Revista
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FICHA TÉCNICA
MIAMI VICE
MIAMI VICE
EUA/2006
Duração – 134 min.
Direção – Michael Mann
Roteiro – Michael Mann, Anthony Yerkovich
Fotografia – Dion Beebe
Música Original – John Murphy
Edição – William Goldenberg, Paul Rubell
 

Elenco – Colin Farrell (James “Sonny” Crockett), Jamie Foxx (Ricardo Tubbs), Gong Li (Isabella), Naomie Harris (Trudy Joplin), Luis Tosar (Arcángel de Jesus Montoya) e Justin Theroux (Zito)

 

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