Theresa Catharina de Góes Campos

  On Wed, 06 Sep 2006 06:03:40 -0300, "REYNALDO FERREIRA" escreveu:
De: "REYNALDO FERREIRA"
Data: Wed, 06 Sep 2006 06:03:40 -0300
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Assunto: A lei eleitoral posta em questão

A LEI ELEITORAL POSTA EM QUESTÃO - Reynaldo Domingos Ferreira

Amigos, Segue meu comentário sobre o livro de Renato Ventura Ribeiro, "A Lei Eleitoral, Comentada", lançado na semana passada no TSE. RDF


A LEI ELEITORAL POSTA EM QUESTÃO


Além da aberração do voto obrigatório, a nossa legislação eleitoral, a ser posta à prova uma vez mais em outubro próximo, dá abrigo também a algumas outras idéias retrógradas – rechaçadas até mesmo por Portugal - como a de proibir que haja candidaturas avulsas, sem vinculação partidária, como enfatiza Renato Ventura Ribeiro, em seu livro “Lei Eleitoral, Comentada”, lançado no Tribunal Superior Eleitoral, na semana passada, em Brasília.

O autor, que colaborou na elaboração do projeto de lei,  do qual se  originou a Lei das Eleições ( Lei 9.504, de 1997), se insurge contra o chamado “monopólio partidário das candidaturas” ao afirmar que, embora proibida no direito brasileiro, a possibilidade de candidaturas avulsas lhe parece ser mais democrática. A seu ver, não se deve obrigar ninguém a se filiar a partido político para candidatar-se a cargo eletivo. Em Portugal, por exemplo, segundo informa, existe a possibilidade de candidaturas de cidadãos não filiados a partidos, desde que estes as patrocinem.

O mundo moderno – afirma Renato Ventura em defesa da candidatura avulsa –
compreende uma crescente pluralidade de idéias, podendo ser bastante comum um cidadão não simpatizar com nenhum dos muitos partidos existentes. Aliás, o elevado índice de votos em branco nas eleições passadas demonstra a não identificação de cidadãos com as propostas dos partidos existentes. Muitas tendências ideológicas podem surgir, sem que seus simpatizantes sejam em número suficiente ou possuam organização para constituir partido político, nos termos das exigências da Lei dos Partidos Políticos.

Embora Ventura cite o elevado índice de votos em branco nas últimas eleições como elemento indicador de que os cidadãos não estariam satisfeitos com as propostas dos partidos – que estas, na verdade, nem existem – eu tenho minhas dúvidas de que a sociedade brasileira queira também o surgimento de idéias novas. A pluralidade de idéias pode ser boa para o mundo moderno lá  fora, como constata Ventura, mas, o cidadão brasileiro é por natureza avesso a isso. Seja no campo político, no econômico e principalmente no das artes – que não se engane o autor – a sociedade brasileira não se arrisca em investir em idéias novas. A legislação eleitoral reflete isso muito bem. Pois, na essência, ela também não muda nunca. Ou se muda, é para regredir no tempo, como o próprio autor deixa evidente em várias oportunidades.

Apesar disso, os argumentos de Renato Ventura são válidos, quando diz – em tese naturalmente – que quem deve decidir é o eleitor e, portanto, a seu ver, o cidadão não deve ter cerceado o direito de ser candidato. E quando ele sugere que, para conferir maior legitimidade às candidaturas avulsas, poder-se-ia exigir do candidato, em substituição à filiação partidária, requerimento contendo um número mínimo de assinaturas de eleitores, a exemplo do que é previsto nos Códigos Eleitorais de 1932 e 1935, regredindo, portanto, no tempo. E no que diz respeito ao horário eleitoral gratuito, o autor sugere que esse espaço seja exclusivo de candidatos filiados a partidos, enquanto os avulsos realizariam propaganda paga nos meios de comunicação, devidamente regulamentada. Isso, segundo ele, para evitar abusos em casos de candidaturas avulsas majoritárias.

O autor esclarece que, no tocante ao voto em branco, a nova legislação inovou em relação ao que estava estabelecido no Código Eleitoral de 1935, que determinava a contagem dos mesmos para determinação do quociente eleitoral, o que, como observa, prejudicava os partidos com poucos votos. Pela nova regra, para fins da eleição proporcional, os votos em branco têm os mesmos efeitos que os votos nulos. Isto, de acordo com Ventura, criou outro problema, pois,  os votos em branco são considerados válidos, ao contrário dos nulos.

E, como são válidos os votos em branco, deveriam integrar o quociente eleitoral, tal como estava na legislação de 1935, segundo observa o autor, regredindo, portanto, novamente no tempo. Então, a nova lei não inova em coisa nenhuma sob esse aspecto. É aquela mesma dúvida que surge, se o eleitorado, não satisfeito com tudo o que está aí, decidir apresentar, em outubro, um resultado surpreendente, revolucionário – pois eu disse acima que os brasileiros não gostam de idéias novas -  de 51% dos votos nulos?... Nesse caso, a eleição seria anulada, como está previsto na Lei 4.737, que instituiu o Código Eleitoral? Ficaríamos livres, desde agora, da reeleição do presidente?

Lamentavelmente, o autor não entra nesta questão. Mas se essa hipótese se concretizasse -  existem muitos defensores da idéia - ela daria, como creio, muito pano para a manga nas discussões judiciais. Há quem alegue que prevaleceria o preceito constitucional, o qual estabelece que votos em branco e nulos não devem ser contabilizados nas eleições para cargos majoritários. Mas há também os que asseguram que a eleição seria anulada, nos termos do Código Eleitoral. Os candidatos da nova eleição, porém, seriam esses mesmos que estão aí. E enquanto a questão não fosse resolvida nos tribunais, haveria naturalmente barricadas pelas ruas, como as que acontecem atualmente no México. Não tenham dúvida. Pois os nossos destinos são iguais.

Outra questão palpitante suscitada nos comentários de Renato Ventura sobre Lei Eleitoral,  - em seu livro, editado pela Quartier Latin, de SP - é referente às pesquisas de opinião, que aí estão como um rolo compressor a dar como certa a vitória, já em primeiro turno, do presidente da República. A divulgação de pesquisa fraudulenta constitui crime, com pena de detenção de seis meses a um ano e multa de cinqüenta mil a cem mil UFIRs. Tratando-se de crime, o procedimento a ser seguido é o rito processual penal eleitoral, conforme esclarece.
 

O Código Eleitoral, como lembra ainda o autor, tipifica como crime divulgar, na propaganda, fatos que sabe inverídicos em relação a partidos ou candidatos capazes de exercerem influência perante o eleitorado, com pena de detenção de dois meses a um ano ou pagamento de 120 a 150 dias-multa. Por pesquisa fraudulenta, pode-se entender, segundo esclarece, aquela com resultado modificado, não realizada ou atribuída a empresa, entidade ou instituto que não a realizou, sem prejuízo de eventuais outros tipos de fraude perante a coleta ou compilação dos dados. A simples manipulação de dados ou a fraude na pesquisa não se enquadra no presente tipo penal, conforme destaca, por não haver divulgação pública.
 

Então, se os resultados de pesquisas forem muitos discrepantes de outras, indicando possível manipulação, o divulgador, mesmo não tendo certeza ou intenção de fraude, segundo Ventura, pode incorrer em dolo eventual, se assumir o risco da divulgação de possível pesquisa fraudulenta. Por isso, ele adverte:

Podem ser responsáveis pelo crime os realizadores da pesquisa, os meios de comunicação, partidos ou candidatos ou até terceiros, desde que divulguem a público pesquisa que saibam ou tenham condições de saber ser fraudulenta. A lei eleitoral prevê expressamente a possibilidade de responsabilização penal dos representantes legais da entidade ou empresa realizadora da pesquisa (no caso da fraude ser cometida por prepostos dela) e do órgão veiculador”.  Pelo prejuízo que pode ser causado, ele observa, contudo, que as penas de detenção e de multa deveriam ser bem maiores do que as previstas em lei.

Talvez isso explique, a meu ver, a questão do rolo compressor das pesquisas divulgadas atualmente, que geram dúvidas no eleitorado. As pessoas, ao que se percebe pelas conversas, se dizem atônitas com os resultados das pesquisas. Mesmo porque o chefe do governo não demonstra estar assim tão tranqüilo com os resultados delas, pois, além de fazer, a cada dia, novas e duvidosas promessas, apela para intelectuais de beira de estrada – em evidente sinal de desespero –,  que o aconselham a se chafurdar mais na m... Mas, se as pesquisas estiverem realmente “certas”, como aquelas do referendo sobre o desarmamento -  que não se aproximaram do resultado final -  mesmo  se levadas posteriormente à justiça, nos termos da lei, jamais os seus responsáveis serão penalizados. É assim a nossa justiça eleitoral.

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA

 

Jornalismo com ética e solidariedade.