Theresa Catharina de Góes Campos

 
O BOM PASTOR
 

O BOM PATRIOTA

Com uma brilhante atuação de Matt Damon, "O Bom Pastor", de Robert De Niro, narra a verdadeira história da CIA sob a ótica de um personagem que nunca teria existido, mas que, apesar disso, é bastante representativo da tendência conformista que prevaleceu no meio da classe média americana dos anos cinqüenta sob a paranóia da guerra fria, durante o governo de Eisenhower, em que os jovens eram estimulados a ingressar em sociedades secretas de conotação religiosa e de defesa do americanismo.

O agente Edward Wilson (Matt Damon), criador da CIA, recebe, ao início do filme, num misterioso envelope, uma fita e uma gravação, que podem esclarecer quem teria revelado aos russos o plano dos EUA de invadir Cuba pela Baia dos Porcos numa tentativa – insistentemente negada pelo governo norte-americano – de derrubar Fidel Castro do poder. Como poucos sabiam do local exato da operação, Edward, que era um deles, se torna, apesar do seu prestígio no órgão de inteligência americana, o principal suspeito de ser o traidor.

O roteirista Eric Roth reconstitui então de forma talvez exageradamente fragmentada o que foi a vida de Edward – inspirada ao que consta nas de James Jesus Angleton  e Richard M. Bissell Jr. - desde que, aos cinco anos, presenciara  o suicídio do próprio pai (Timothy Hutton), cuja carta de despedida guardou, sem, entretanto, tomar conhecimento de seu conteúdo. Na Universidade de Yale, anos mais tarde, Edward brilha em suas atuações teatrais, travestido de mulher, razão pela qual é convidado a tornar-se membro da sociedade secreta Skull and Bones, onde se envolve com pessoas poderosas, inclusive com  Margareth Clover (Angelina Jolie), irmã de um de seus companheiros, por quem se deixa seduzir. É nesse âmbito também que ele ouve alguém dizer, pela primeira vez, que seu pai se suicidara porque fora um traidor.

Apesar de gostar de Laura (Tammy Blanchard), uma estudante, tímida, católica,  que conhecera numa biblioteca, Edward se casa com Margareth ao saber que a engravidara. É durante os festejos do casamento, entretanto, que ele recebe o convite do General Bill Sullivan (Robert De Niro) para  integrar o Office of Strategic Services e viajar de imediato para Londres a fim de cumprir uma missão. Em Londres, Edward reencontra um ex-professor de literatura, Dr. Fredericks (Michael Gambon), com o qual tivera, nos tempos de  universitário, algum desentendimento, o qual o aconselha a não prosseguir na profissão de agente.

O fim trágico de Fredericks, jogado num canal diante das vistas de Edward por agentes do serviço de inteligência britânico por saber demais não o intimida, entretanto, a dar prosseguimento à sua missão que ele considera de defesa da pátria. Um outro agente, Philip Allen (William Hurt), ao perceber que está sendo investigado por ele, observa: Esta é uma profissão que paga mal e na qual somos constantemente investigados pelos colegas.  Mas o embate maior de Edward será sem dúvida, quando o seu ofício de agente da CIA tem de interferir nos problemas de sua própria família. Ele, porém, não titubeia. Faz o que tem de ser feito. Ou o que lhe exige a profissão. E chega ao topo da carreira.

A linha da mise en scene de Robert De Niro, nesse seu segundo filme, tem as mesmas características das de Francis Ford Coppola – que é também um dos produtores da película - sob a direção de quem atuou em "O Poderoso Chefão". É extremamente detalhista. Algumas composições de cena exigem do espectador atenção redobrada para perceber pela profusão dos detalhes o que estão dizendo as imagens. E como são belas essas imagens!...A seqüência da morte do professor Fredericks, por exemplo, apesar de trágica, é de belo efeito como composição cinematográfica, valorizada pelo tom pastel da fotografia de Robert Richardson. E uma outra, em tom mais rico de cores na fotografia, que acontece em frente à igreja, no Congo, quando Edward abraço o filho, Edward Jr. (Eddye Rednayne), desesperado, obedece ao mesmo estilo operístico de várias outras dos filmes de Coppola.

Apesar de ter um elenco de atores notáveis, "O Bom Pastor" é, na verdade, um filme de Matt Damon. O ator está perfeito na sua composição do agente frio, inflexível, que se evidencia principalmente na maneira dura de caminhar que o enquadramento preciso de De Niro explora com extrema maestria. O ator toma conta de todos os espaços. Mas pode-se dizer que Damon tem seu melhor momento, quando contracena com Joe Pesci – o extraordinário ator de "Os Bons Companheiros", de Scorsese – e troca com ele um diálogo que pode ser reconstituído mais ou menos assim.

Joseph Palmi (Joe Pesci) – Nós, italianos, temos a nossa família e a nossa Igreja. Os judeus têm a sua tradição. Os irlandeses têm a sua terra. E os americanos, Sr. Edward, o que têm?...

Edward (Matt Damon) – Nós temos os Estados Unidos da América.

Além de Damon, não pode deixar de ser lembrada – é evidente – a beleza de Angelina Jolie, que, apesar de ser colocada num segundo plano pelo marido, sabe ter charme e forte presença em todas as cenas em que aparece. Mas a atriz Tammy Blanchard tem também o seu encanto e, pelo menos, um momento de boa atuação, que é o do seu reencontro com  Edward Wilson num teatro em que ambos assistem, em separado, a uma apresentação de "O Jardim das Cerejeiras", de Theckov. As cenas que se seguem – que estão sendo fotografadas para serem levadas ao conhecimento de Margareth - são de muito lirismo principalmente por parte de Blanchard, meiga e suave durante todo o tempo.

Em síntese, "O Bom Pastor", de Robert De Niro, que tem comentário musical adequado, de Bruce Fowler e Marcelo Parvos, composto de muitas peças sacras, é um filme que não só credencia o seu realizador – já suficientemente consagrado como ator – como também expõe uma atuação perfeita, soberba, de Matt Damon e que por isso merece e precisa ser visto. É, sem dúvida,  um belo filme.

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, BRASILIA, Revista
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FICHA TÉCNICA
O BOM PASTOR
THE GOOD SHEPHERD
EUA/2006
Duração – 167 minutos
Direção – Robert De Niro
Roteiro – Eric Roth
Produção – Chris Brigham, Francis Ford Coppola, Robert De Niro
Musica Original – Bruce Fowler e Marcelo Parvos
Fotografia – Robert Richardson
Edição – Terik Anwar

Elenco – Edward Wilson (Matt Damon), Angelina Jolie (Margareth Clover), Alec Baldwin (Sam Murach), Tammy Blanchard (Laura), Billy Crudup (Archa Cummings), Robert De Niro ( General Bill Sullivan) Keir Dullea (Sanator John Russel), William Hurt (Philip Allen), Michael Gambon (Dr. Fredericks), Joe Pesci (Joseph Palmi), Eddye Rednayne (Edvard Jr.), John Torturro (Ray Brocco)

 

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