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										O MUNDO EM 
										DUAS VOLTAS
 Depois de conquistar os 
										mares durante anos, a Família Schürmann 
										faz agora uma incursão pelo mundo do 
										cinema com um belo documentário, “O 
										Mundo em Duas Voltas”, no qual mostra a 
										sua própria saga de reeditar a expedição 
										do navegador português Fernão de 
										Magalhães que, em 1519, completou a 
										primeira volta ao mundo, contrariando as 
										tradicionais rotas de navegação e assim 
										provando que a Terra é redonda, além de 
										descobrir o novo caminho para as Índias, 
										paraíso das especiarias e fonte de 
										riquezas para o comércio da época.
 
 O filme, dirigido e 
										fotografado por David Schürmann, mostra 
										o cotidiano da família de navegadores a 
										bordo do veleiro Aysso –   
										“formoso” em tupi-guarani –  que desde a 
										partida de Porto Belo, Santa Catarina, 
										em dezembro de 1977, segue a rota de 
										Magalhães, cuja expedição é 
										reconstituída, de forma paralela, por 
										meio de animações, assinadas pelo 
										francês Laurent Cardon, além de 
										sugestivo comentário musical, de Marcus 
										Viana, responsável pela trilha sonora.O 
										roteiro é de Luiz Bolognesi, a quem 
										coube – contando com a ajuda da montagem 
										de Manga Campton -  a admirável façanha 
										de condensar num documentário de 92 
										minutos, uma viagem que durou anos ou 
										mais precisamente 891 dias.
 
 Com base no roteiro de 
										Bolognesi, o cotidiano da Família Schürmann a bordo do veleiro é narrado, 
										de forma alternada, pelo casal - 
										Vilfredo e Heloisa -  que viaja 
										acompanhado de seus filhos Pierre, 
										Wilhelm (ambos integraram a expedição 
										apenas na viagem de retorno ao Brasil) e David (diretor do filme), e da 
										filha adotiva Kat, então com sete anos 
										de idade, a quem o filme é dedicado, 
										além de uma equipe de técnicos, que 
										sofre algumas alterações durante o 
										percurso, o qual, acompanhando a rota de 
										Magalhães, é de 60.481 km navegados.
 
 O filme mostra imagens 
										belíssimas, captadas por meio de 
										competente trabalho com câmara Super 16 
										mm, de trinta países, quatro continentes 
										e três oceanos. A primeira tormenta que 
										o veleiro dos Schürmann enfrenta é em 
										Puerto Deseado, no sul da Argentina, que 
										coincide com um motim a bordo dos 
										veleiros sob o comando de Fernão de 
										Magalhães então pressionado por seus 
										homens, os quais já não acreditam mais 
										em sua promessa de encontrar uma saída 
										para o Oceano Pacífico.
 
 Passada a tormenta, o 
										veleiro dos Schürmann vence, em 43 dias, 
										o esperado percurso do Estreito de 
										Magalhães, encontrando, logo em seguida, 
										a paisagem magnífica das águas do Oceano 
										Pacífico congeladas sobre as quais 
										torna-se possível a caminhada dos 
										navegadores diante de poderosas 
										montanhas de gelo. Dali a família decide 
										visitar amigos chilenos que trocaram as 
										aventuras no mar, nas quais se 
										conheceram nove anos atrás, pelas de uma 
										fazenda, dedicada ao que parece à 
										criação de gado bovino e ovino. Além da 
										acolhida calorosa do amigo Gorronho, os 
										navegadores catarinenses se encantam com 
										a paisagem do sul do Chile, mas se 
										mostram, por outro lado, ansiosos para 
										deixar o continente e enfrentar o mar 
										aberto.
 
 Sempre seguindo a rota de 
										Magalhães, o primeiro ponto em mar 
										aberto encontrado pelos navegantes é o 
										da famosa Ilha de Páscoa, que fica a 
										3.700 km de distância da costa oeste do 
										Chile. É famosa principalmente pelas 
										enormes estátuas de pedra que não se 
										sabe como os antigos habitantes da ilha 
										conseguiram transportar para a grande 
										murada onde se encontram em frente ao 
										mar.  Enquanto nas animações Magalhães 
										enfrenta novos problemas e sofre novas 
										baixas, tendo de afundar um veleiro por 
										falta de marinheiros para conduzi-lo, os Schürmann renovam o prazer de chegar a 
										uma das paisagens mais dionisíacas do 
										mundo, a da Polinésia Ocidental, onde a 
										água do mar é transparente e os costumes 
										são pra lá de liberais. É numa das ilhas 
										da Polinésia que a família reencontra 
										Nite, uma nativa, casada com um 
										brasileiro, a qual mostra ao casal a 
										beleza de sua terra.
 
 Mas nem tudo são flores 
										nessa visita à Polinésia porque o choque 
										cultural acaba por importunar Heloisa, 
										que se queixa de uma nativa, a qual lhe 
										pede de empréstimo o marido, Valfredo, 
										por onze dias, pois quer ter um filho 
										claro, igual aos do casal. Como no 
										Brasil se permite tudo, tudo, menos 
										empréstimo de marido, ainda mais 
										por quatro ou cinco dias, Heloisa diz 
										para a nativa: “Não, não e não. Ora 
										essa!” A nativa, convidada de Nite, sai 
										da festa aos prantos. Preocupado, 
										Valfredo quer saber o motivo pelo qual a 
										nativa, que o acariciara, saíra da festa 
										tão chorosa. Mas ele só vai saber da 
										proposta dela bem distante da aprazível 
										Polinésia, em alto mar, onde Heloisa se 
										diz mais segura e gosta de mais tempo 
										ficar. Não é pra menos!...
 
 Mas o choque cultural também 
										causa certo amargor a Valfredo ao ver, 
										nas Filipinas, único país católico da 
										região, nas comemorações da Semana 
										Santa, um indivíduo ser sacrificado, 
										como o Cristo, tendo  pés e mãos 
										cravados com longos pregos na cruz. A 
										cena é realmente brutal. Ao ser 
										retirado, o crucificado tem de ser 
										levado às pressas em maca para o 
										hospital. É também nas Filipinas que, 
										pelas animações, se observam os maiores 
										reveses sofridos por  Magalhães, que 
										acaba sendo ali  assassinado. Não há no 
										lugar nenhuma homenagem a ele. Só existe 
										uma grande estátua do chefe da tribo que 
										o matou.
 
 Os 
										marinheiros que restam da  expedição do 
										grande navegador português - em número 
										apenas de dezoito dos duzentos e 
										sessenta que partiram - retornam então à 
										Espanha e, ao chegarem a Sevilha, pedem 
										velas para serem acesas nas igrejas em 
										homenagem ao seu Comandante e aos 
										bravos, heróicos companheiros. Da mesma 
										forma, a chegada dos Schürmann a 
										Sevilha, num dia magnífico, depois de 
										passarem pela Austrália, circundarem a 
										costa sul da África e dobrarem o Cabo da 
										Boa Esperança, é apoteótica.
 
 Em suma, “O Mundo em Duas 
										Voltas”, de David Schürmann, que narra 
										as duas voltas feitas ao mundo pelo 
										navegador português Fernão de Magalhães 
										e por sua meritória família a bordo do 
										veleiro Aysso é um documentário 
										que se vê com encanto e prazer. É 
										possível que ao vir Valfredo, na cabine 
										de comando de seu veleiro, enfrentando 
										tempestades e, ao mesmo tempo preocupado 
										com a família que traz a bordo, o 
										público brasileiro reflita um pouco mais 
										sobre a falta que faz um timoneiro 
										sério, responsável como ele, para 
										conduzir os destinos deste nosso país. É 
										possível!... Um bravo para a Família 
										Schürmann nessa sua incursão ao mundo do 
										cinema.
 
 REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
 ROTEIRO, Brasília, Revista
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 FICHA TÉCNICA
 
										O 
										MUNDO EM DUAS VOLTAS 
										
										Brasil/2007 
										
										Duração – 92 minutos 
										
										Direção e fotografia – David Schürmann 
										
										Roteiro – Luiz Bolognesi 
										
										Produção – David Schürmann, Caio 
										Gullane, Fabiano Gullane, Débora Ivanov, 
										Paulo Ribeiro e Vilfredo Schürmann. 
										
										Trilha Sonora – Marcus Viana 
										
										Edição – Manga Campton. 
 NOTA DA EDITORA: a) No início e no fim do 
								filme, há um erro de português - lê-se na tela 
								"esse filme", quando o correto, na língua 
								portuguesa, seria o uso do adjetivo 
								demonstrativo "este".
 b) Encerrando a sua narrativa, Heloísa Schürmann 
								completa a emoção da imagem final - cena 
								congelada na tela de cinema - do documentário "O 
								mundo em duas voltas" com as palavras:
 "Abracei minha mãe e me senti em casa."
 
 c) "O mundo em duas voltas" termina com a 
								frase:
 "Bons ventos, minha irmã."
 (a vírgula foi colocada por mim)
 
 Theresa Catharina
 SP, 24 de abril de 2007
 
 SITES:Família  Schürmann
 www.schurmann.com.br
 
 O mundo em duas voltas
 www.omundoemduasvoltas.com.br
 
 
								http://leialivro.sp.gov.br
 Na mão, um veleiro
 01/06/2006
 
 Lembro-me da primeira vez que vi a família dos 
								Schürmann. Apareceu no Fantástico tripulando um 
								veleiro imerso no oceano, singrando sem medo as 
								águas mais distantes.
 
 Começo esta crônica em 31/05/2006 e a última vez 
								que soube da família Schürmann foi há pouco. Foi 
								a última vez até hoje, e, por coincidência, 
								exatamente hoje. Com certeza não será a última 
								vez nos meios de comunicação. Saibam. Estou 
								seguro. Dificilmente outra aparição dos 
								Schürmann me impressionará mais intensamente.
 
 A afirmação recém lançada deve ter deixado meus 
								amigos de queixo caído. Encaixando a mandíbula, 
								lerão novamente o parágrafo. Para mim, de forma 
								alguma a aparição de hoje dos Schürmann poderia 
								sobrepor-se àquela num barco ao vento no meio do 
								mar.
 
 Tenho paixão por veleiros. Sabendo de alguém em 
								viagem, solicito um daqueles que encantam 
								crianças em artesanatos de praia. Buscar o fio 
								desse estranho sentimento tem sido em vão. Fui 
								um menino do oeste; nascido, portanto, afastado 
								da costa. Só lembro daquela música do Jessé, 
								ressaca invadindo os ouvidos: “Se um veleiro 
								repousasse na palma da minha mão...” Esse verso 
								parece ser parte de cada música que toco. Até na 
								missa preciso vigiar-me para não imiscui-lo no 
								“Glória” ou no “Santo”.
 
 Ficar dizendo que a primeira vez dos Schürmann 
								não foi a mais marcante da memória, de mim, soa 
								inautêntico. Possibilita em meus amigos a 
								hipótese de um texto apócrifo, ou traço de 
								alguma demência.
 
 Conheci no Fantástico o barco dos Schürmann, 
								havia visto suas velas oceânicas, nunca soubera 
								da Kat. Só soube da existência da Kat hoje e, 
								infelizmente, quando Kat deixou de existir no 
								barco dos Schürmann. Kat, 13 anos, filha adotiva 
								do casal Vilfredo e Heloísa, foi vítima de 
								pneumonia e morreu ontem em São Paulo. A família 
								divulgou uma nota, publicada hoje nos jornais: 
								“Muitos não sabem, mas Kat era soropositiva 
								desde que nasceu. A adotamos ainda pequena, na 
								Nova Zelândia, sabendo de sua condição. Sua mãe 
								já havia partido, e o pai viria a nos deixar 
								anos depois. Sabíamos que seria muito difícil. 
								[...] Mas não poderíamos deixar de dar uma 
								chance àquele anjinho de lutar pela vida”.
 
 Minha esposa e eu já pensamos em adoção. Nos 
								consideramos de bom coração e razoável 
								espiritualidade. Sou um homem com preocupações 
								éticas, canto na missa. Nunca jamais imaginamos 
								adotar uma criança aidética. Não somos os 
								únicos. A maioria dos adotantes anseia por 
								crianças de colo, brancas e, em qualquer caso, 
								física e psicologicamente perfeitas. Adotar um 
								bebê cuja probabilidade de morte é muito alta, 
								embora a desconcertante exceção, não soa 
								razoável.
 
 Amigos, entendam! Achar a notícia de hoje mais 
								relevante que todas as passadas ou vindouras não 
								demonstra traição com meu amor declarado a 
								veleiros. Sempre vi ou verei os Schürmann 
								distantes no oceano, em lugares onde nunca 
								estive e, possivelmente, nunca estarei. Hoje, 
								contudo, como naquela canção do Jessé, vi o 
								veleiro dos Schürmann repousando na palma da 
								minha mão. E apenas hoje entendi por que 
								chegaram e ainda chegarão mais longe. Muito mais 
								longe e sem medo.
 Pablo Morenno
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