Theresa Catharina de Góes Campos

 
HOLLYWOODLAND – BASTIDORES DA FAMA

Acompanhando fielmente o receituário do film noir americano, Hollywoodland – Bastidores da Fama, de Allen Coulter, que trata da misteriosa morte do ator George Reeves, intérprete do Superman numa série de sucesso na televisão nos anos cinqüenta nos EUA, tem também a pretensão de alertar o público para o fato de que a imagem por não ser reflexiva pode afetar a mente de uma criança a ponto de vir a ser a causa, segundo a hipótese implícita aventada, dos atentados que muitos jovens hoje cometem contra a vida de colegas ou de seus grandes ídolos.

Há uma cena em que George Reeves (Ben Affleck), no auge da fama no meio do mundo infantil, se exibe ao vivo para seu público, quando um garoto dele se aproxima, de arma em punho, disposto a lhe atirar à queima-roupa a fim de poder verificar se a bala nele ricocheteia de verdade sem matá-lo. Sem se perturbar, o ator interrompe sua apresentação para dar atenção ao garoto. E tenta forçá-lo a refletir no sentido de que, se ele cumprir o seu intento, a bala poderá no Superman ricochetear, como ele espera, mas, em seguida, atingir a uma das inúmeras crianças que ali também se encontram.

A cena é elucidativa na intenção do roteirista, Paul Bernbaum, de mostrar como a imagem é totalitária e impeditiva da reflexão, podendo, sim, ser atribuída ao seu domínio nos tempos atuais a causa imediata da exacerbação da violência em todos os níveis nas sociedades modernas. Além dessa cena, para completar a idéia que transmite, teve Bernbaum o cuidado de estabelecer paralelo entre o mesmo garoto e um outro que, traumatizado pela separação dos pais, fica tão abalado, ao saber da morte do intérprete do Superman, que começa a mudar o seu comportamento. Chamado, o pai, no percurso que faz de carro com o filho para a escola, pergunta-lhe: Você não sabe que tudo o que acontece na televisão é mentira?...

Esse pai, entretanto, é um detetive particular, Louis Simo (Adrien Brody) - anti-herói típico dos filmes do gênero noir - um fracassado, cínico, irônico, traído pela mulher e pela amante, que se mostra disposto a tomar a qualquer custo dinheiro de Helen Bessolo (Lois Smith), mãe de George Reeves, a qual,  inconformada de haver a polícia encerrado as investigações, dando sua morte como causada por suicídio, deseja reabrir o caso, já que suspeita de que alguém tenha matado o filho, para ela, um grande ator.

Um outro paralelo então se estabelece pelo roteiro entre os espúrios expedientes usados por Simo, no presente, para conduzir a mídia pelo caminho que deseja de criar pelo menos duas versões para o possível assassinato de Reeves com os que também teria usado, no passado,  o ator – verdadeiro canastrão - para impulsionar sua carreira na televisão e no cinema. Até aí vai tudo bem porque existem afinidades entre um e outro. Ocorre, porém, que, não satisfeito com isso, o roteirista ainda quis rechear a história com o caso, sem nada ter a ver, de um cliente de Simo, que movido por ciúme doentio, mata a mulher, o que tira a objetividade do argumento.

Não fosse esse lamentável equívoco do roteiro, Hollywood – Bastidores da Fama, seria uma obra-prima do gênero noir, pois tem tema interessante pelos motivos acima destacados e competente direção de Allen Coulter que, originário da televisão ( Família Soprono) sabe conduzir a narrativa de forma fluente e elegante, contornando o quanto possível as complicações e deficiências do roteiro criado por Bernbaum, um principiante, sem deixar, contudo, que o filme caia no melodrama barato, como ocorreu com Dahlia Negra, de Brian de Palma.

Além disso, Allen Coulter, auxiliado por eficiente direção de arte, de Patrick Banister, faz primorosa reconstituição de época, tendo nisso também como suportes valiosos a fotografia, de planos quase sempre fechados, de Jonathan Freeman, e a trilha sonora do compositor brasileiro, Marcelo Zarvos. Outra força com que a direção conta é o elenco, muito bom, liderado por Adrien Brody, intérprete de O Pianista, de Polanski, que embora defendendo o papel de Simo, tipo de clichê do gênero noir, tem momentos notáveis, assim como Diane Lane, que com a categoria de sempre, faz o papel de Toni Mannix, mulher fatal dos anos cinqüenta, a qual mantém a seus pés, sempre apaixonado, o marido, Eddie Mannix (Bob Hoskins), poderoso executivo do estúdio da MGM, além de se tornar amante e protetora de George Reeves.

A questão que se coloca em relação aos intérpretes, contudo, é se Ben Affleck mereceria, por sua atuação como Reeves, o prêmio de Veneza e a indicação ao Globo de Ouro, o que me  parece exagero. É verdade que, depois de ser muito canastrão, ele vem dando outro sentido à sua carreira desde Um Cara Quase Perfeito, de Mike Binder. Mas sua atuação, embora pautada pela direção, nada tem de excepcional. Tem, sim, bons momentos, tais como: primeiro, quando interrompe sua apresentação ao vivo como Superman para ter a conversa com o garoto sobre o perigo do uso da arma de fogo; segundo, quando, ao filmar no estúdio o vôo do Superman, em seqüência bem urdida, se estatela no chão; e terceiro, quando, na residência da segunda amante, Leonora Lemmon (Robin Tunnay), uma ricaça de Nova Iorque, antes de subir ao quarto, onde encontraria a morte, dá indicação de que haveria alguém mais em sua vida, de origem mexicana, pois ao se acompanhar ao violão, canta para alguns amigos ali reunidos com amargura: Aquellos ojos negros!...

Enfim, tendo um alerta importante sobre o uso da imagem, que por dificultar a reflexão – e até facilitar a transmissão de mensagens subliminares – poderia ser a causa imediata da exacerbação da violência nas sociedades modernas, Hollywoodland – Bastidores da Fama, de Allen Coulter, é filme que se recomenda, pois tem ainda como atributos uma direção competente, primorosa reconstituição de época, ótima fotografia, boa trilha sonora de compositor brasileiro, Marcelo Zarvos, além de valorosas interpretações de um elenco liderado por Adrien Brody, Diane Lane e Ben Affleck. Mas no gênero de film noir ainda perde para Los Angeles: Cidade Proibida, de Curtis Hanson, o melhor dos últimos tempos.

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO,BRASILIA, Revista
www.arteculturanews.com
www.noticiasculturais.com
www.theresacatharinacampos.com
www.politicaparapoliticos.com.br
cafenapolitica.blog.br

FICHA TÉCNICA
HOLLYWOODLAND – BASTIDORES DA FAMA
HOLLYWOODLAND
EUA/2006

Duração – 126 minutos
Direção – Allen Coulter
Roteiro – Paul Bernbaum
Produção – Glenn Williamson
Fotografia – Jonathan Freeman
Direção de Arte – Patrick Benister
Trilha Sonora – Marcelo Zarvos
Edição – Micahael Berenbaum 

Elenco – Adrien Brody (Louis Simo), Ben Affleck (George Reeves), Diane Lane (Toni Mannix), Bob Hoskins (Eddie Mannix), Dash Mihok (Sargento Jack Paterson), Brad William Henke (Russ Taylor)


NOTA DA EDITORA
Date: Mon, 30 Apr 2007 21:23:07 -0300
From: theresa.files@gmail.com
To: reydferreiraSubject: Seu artigo está perfeito! Re: HOLLYWOODLAND - BASTIDORES DA FAMA


Estimado amigo Reynaldo:

Na forma e no conteúdo, seu artigo está perfeito, com excelentes comentários e muitas informações.

Digo isso porque as suas palavras valem por si mesmas. (...)

Suas considerações sobre a imagem (os perigos e as ilusões, as imperfeições ... e os erros trágicos que pode causar ao indivíduo e à sociedade) resumem o que seria uma conferência filosófica. (Não estou exagerando, porém reconhecendo a verdade de sua análise.)

Abraços cordiais de
Theresa Catharina

 

Jornalismo com ética e solidariedade.