UM
LUGAR NA PLATÉIA
Sem maiores compromissos com o esboço
psicológico dos personagens ou com o
verossímil em relação aos fatos
apresentados, Danièle Thompson, em Um
Lugar na Platéia , tece uma história
de amor, ambientada nos tempos atuais,
numa das regiões mais elegantes de
Paris, para criar, com certo requinte de
imagem, uma sofisticada comédia de
costumes muito agradável de se ver.
Pelo padrão da linguagem, o filme revela
também forte influência do cinema
americano, não tendo sido por isso
gratuita ou aleatória a inclusão, no
elenco de atores, de Sydney Pollack para
interpretar um cineasta dos EUA, Brian
Sobinski, que se encontra em Paris,
interessado em rodar uma película sobre
a vida amorosa dos escritores Jean-Paul
Sartre e Simone de Beauvoir.
A história que Danièle Thompson, filha
do diretor Gérard Oury ( falecido em
2005), tece - com a ajuda do filho,
Christopher Tompson, na elaboração do
roteiro e como ator porque na França
tudo é tradição de família - é a de uma
jovem interiorana, Jéssica (Cécile De
France), muito viva, culta e ambiciosa
que, seguindo os conselhos da avó,
Madame Roux (Suzanne Flon), chega a
Paris, vinda de Mácon, para tentar
conseguir um emprego.
Só que o emprego que Jéssica quer -
também orientada pela avó, obcecada por
luxo – é no Hotel Ritz, onde poderia
estar próxima de pessoas de muito
dinheiro. Ocorre, porém, que sem
conseguir o que deseja, Jéssica, de
cabelo cortado à moda de Jean Seberg, em
Acossado, de Godard, se contenta
com uma vaga que arranja de garçonete
num café, localizado na Avenida
Montaigne, perto de um teatro, de uma
sala de concertos e de uma casa de
leilões de artes.
Assim, Jéssica se vê no meio de gente
destemperada da classe artística, cada
qual deixando evidentes suas doenças,
anseios e frustrações. Há uma atriz,
Valérie Lemercier (Catherine Versen),
que sofre de depressão, enfarada de
atuar em novelas de televisão, a qual
prepara sua estréia num vaudeville
de Feydeau. Há um pianista,
Jean-François Léfort (Albert Dupontel),
esquizofrênico, em crise com a
profissão, que pensa em abandoná-la a
fim de ir para o campo, embora isso
possa afetar sua vida com a mulher,
Valentine Léfort (Laura Morante). E há
um colecionador de arte, paciente de
câncer, Jacques Grumberg (Claude
Brasseur), que se vê forçado a vender
seus quadros favoritos, entre os de
Braque, Picasso, Modligliani, Léger e
Brancusi.
É nesse contexto que Jéssica - como não
poderia deixar de ser – encontra o seu
príncipe encantado, Frédéric Grumberg
(Christopher Thompson), um ex-professor
da Sorbonne, rico, hipocondríaco, em
vias de se separar da mulher e que já
tivera um caso com Valérie (Annelise
Hesme), a também ambiciosa amante de seu
pai. Jessica, porém, está disposta a
tudo, pois como lhe ensinara a avó,
nesta vida, é preciso arriscar. Mas ela
se convence também que, arriscando,
poderá escolher o seu lugar na platéia
de um teatro, que tanto poderá ser muito
perto ou distante do palco... Eis a
questão.
É preciso ressaltar, em primeiro lugar,
a habilidade com que Danièle Thompson –
que foi roteirista do excelente A
Rainha Margot, de Patrice Chéreau –
consegue criar ambientação para narrar
sua história de amor, restringindo-a, no
que fez muito bem, a um ponto
determinado de Paris, a Avenue
Montaigne, que fica na região dos
Champs-Elysées. Pois acredito que, se
ampliasse o círculo de ação dos
personagens, abrangendo outros pontos da
cidade, ela perderia muito dos efeitos
obtidos de vaudeville que, sem
dúvida, apuraram sua narrativa e lhe
deram um charme especial como se fora o
de um musical americano, de Minnelli,
por exemplo, rodado em estúdio.
Também não foi sem propósito a escolha
de uma peça de Georges Feydeau para a
próxima estréia da atriz Valérie
Lemercier que, durante os ensaios, faz
uma série de considerações sobre o
descaso do autor pelo aprofundamento dos
traços psicológicos dos personagens de
suas comédias – que arrancam aplausos
constantes do público -, bem como de
aspectos relacionados com o conceito do
que é em arte antigo e moderno, como se
Thompson quisesse explicar por meio
disso nuanças de sua linguagem
cinematográfica, como o emprego de
alguns recursos que podem parecer a
alguns ultrapassados.
É dentro desse quadro de transcendência
ainda que Thompson utiliza a personagem
da concierge da sala de
concertos, Claude (Dani), prestes a se
aposentar - a que mais tem afinidade
com Jéssica - para usar como pontuação
de sua narrativa a canção francesa,
sucesso de outrora, como as de Gilbert
Bécaud: Je reviens te chercher;
La solitude ça n´existe pas e
L´important c´est la rose e, a de
Charles Aznavour, Les Comédiens,
além de Si tu imagines, de Joseph
Kosmas na interpretação da musa dos
existencialistas, Juliette Greco. E
ainda a lembrança de Sacha Distel num
pôster afixado na porta do quarto de
Claude, que, numa seqüência, chega a
fazer conexão da canção francesa, que
escuta pelo walkmen, com a peça
de Liszt que Jean-François Lefort
executa ao piano em seu último concerto.
Thompson sabe também conduzir bem o
elenco de atores, os quais atuam de
forma bastante homogênea, destacando-se,
porém, como sempre, as interpretações
dos veteranos Claude Brasseur e Suzanne
Flon - que morreu pouco depois de
terminadas as filmagens -, a quem o
filme é carinhosamente dedicado. Também
vale destacar a atuação de Catherine
Versen - ganhadora do prêmio do cinema
francês, César, como a melhor atriz
coadjuvante do ano passado – que tem
pelo menos dois bons momentos,
contracenando em ambos com o cineasta
americano Sydney Pollack, num dos quais,
já devidamente maquiada, se mostra
bastante parecida com Simone de
Beauvoir, que sua personagem, Valérie
Lemercier deveria interpretar no cinema.
Enfim, Um Lugar na Platéia, de
Danièle Thompson, filme que representou
a França na última seleção do Oscar de
Melhor Filme Estrangeiro, é uma comédia
de costumes sofisticada - muito bem
fotografada por Jean-Marc Fabre - que
embora moldada em parâmetros
convencionais, diverte bastante o
espectador e ainda lhe traz uma gama de
informações sobre a cultura francesa,
merecendo por isto ser visto por todas
as pessoas sem restrição de idade. Um
belo programa.
REYNALDO DOMINGOS
FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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UM LUGAR NA PLATÉIA
FAUTEILS D´ORCHESTRE
França/2006
Duração – 106 minutos
Direção – Danièle Thompson
Roteiro – Danièle e Christopher Thompson
Produção – Alain Sarde e Christine
Gozlan
Música – Nicoli Piovani
Fotografia – Jean-Marc Fabre
Edição – Sylvie Landra
Elenco – Cécile De France ( Jéssica ),
Valérie Lemercier (Catherine Versen),
Albert Dupontel ( Jean-François Lefort),
Laura Morante ( Valentine Lefort),
Claude Brasseur ( Jacques Grumberg
),Christopher Thompson ( Fréderic
Grumberg), Dani (Claude), Annelise Hesme
(Valérie), François Rollin (Marcel),
Sydney Pollack ( Brian Subinski) e
Suzanne Flon (Mme. Roux)