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O DESPERTAR DE UM PAIXÃO
Os atores Naomi Watts e Edward Norton investiram
muito dinheiro na produção de O Despertar de Uma
Paixão, de John Curran, terceira versão
cinematográfica do romance Véu Pintado, de W.
Somerseth Maugham, mas lamentavelmente não
conseguiram obter resultado mais avançado ou
satisfatório do que o das duas anteriores, uma
vez que, apesar de suas boas atuações, não
evitaram que o filme descambasse para o
melodrama.
E além disto, não se justifica, a meu ver, tanto
empenho – o filme foi rodado na China em regime
de co-produção – para divulgar a tão prosaica
idéia de que o feitiço vira contra o feiticeiro
ou a de que o ser humano é figura mais complexa
que uma bactéria, que pode errar, reconhecer o
erro e tentar se reabilitar, segundo os dizeres
da fútil, mimada e, pior, preconceituosa
protagonista.
Pois de fato Kitty Fane (Naomi Watts) -
interpretada antes por Greta Garbo (1934) e
Eleonor Parker (1957) - já estava prestes a ser
considerada solteirona encalhada na Inglaterra
vitoriana dos anos vinte, mostrada em flashback,
quando o pai, Mr. Garstin (Alan David), tratou
de apresentar-lhe um pretende, Walter Fane
(Edward Norton), médico, bacteriologista,
tímido, desajeitado, que por ela se apaixonara.
Como Kitty não podia recusar o pedido que lhe
fez Walter – a mãe, Mrs. Garstin (Maggie Steed),
lhe disse abertamente que o pai estava cansado
de sustentá-la -, os dois se casaram e foram
para Shangai, de onde ele havia recebido antes
proposta de trabalho. Naquela cidade, o casal se
tornara amigo do vice-cônsul da Inglaterra,
Charlie Towsend ( Liev Schreiber), por quem
Kitty se apaixonara, ficando na expectativa de
que ele deixasse a esposa, Dorothy Towsend (
Juliet Howland), para casar com ela, disposta
então a divorciar-se do marido.
Como Walter soube que isso não ocorreria, depois
de descobrir o envolvimento amoroso da esposa
com o amigo, ele propôs o divórcio a Kitty que,
decepcionada com o amante e temerosa de um
escândalo, recusou. Atingido no seu orgulho,
para vingar-se dela, Walter se ofereceu como
voluntário para ir trabalhar em Mei-tan-fui, um
distante vilarejo chinês, assolado pela epidemia
de cólera.
O filme tem início, em 1925, com a chegada do
casal a Mei-tan-fui, onde tem de se instalar na
única casa disponível, cujos antigos ocupantes
acabaram de morrer, vitimados pela cólera.
Embora vivam na mesma casa, os dois mantêm
distanciamento um do outro, o que causa
estranheza tanto dos criados, como do único
inglês que habita a região, o comissário
Waddignton (Toby Jones), que também por outro
lado estranha a obsessão suicida de Walter pelo
trabalho.
Para não se sentir completamente inútil, Kitty
se oferece à Madre Superiora (Diana Riggs) do
convento da localidade para ajudá-la na missão
de educar os inúmeros órfãos ali abrigados. Aos
poucos, contudo, há uma evolução no
relacionamento do casal, sem que a direção faça
uso disso para sustentar em cena em demasia as
figuras dos dois intérpretes – Naomi Watts e
Edward Norton – que estão bem, mas que, no caso
dele, poderia estar melhor, pois suas cenas
amorosas não são das mais convincentes.
Impecáveis atuações são as de Toby Jones –
intérprete de Truman Capote em Confidencial, de
Douglas McGrath - como Waddigton, principalmente
na seqüência em que enfrenta o personagem o
desprezo de Kitty por sabê-lo amasiado com uma
chinesa; a de Diana Rigg, como a desiludida
Madre Superior; e a de Anthony Wong Chau Song,
que tem presença forte como o Coronel Yu. A
direção de John Curran, pouco inspirada, faz
narrativa lenta, quase parando e deixando que o
filme descambe de forma inevitável para o
melodrama, apesar de compor bem algumas cenas e
de saber usar a qualidade da fotografia de
Stuart Dryburgh e o magnífico comentário musical
de Alexandre Desplat - com destaque para o solo
de piano - que mereceu certamente o Globo de
Ouro, da Associação de Críticos de Nova Iorque.
No todo, porém, o filme decepciona muito.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
O DESPERTAR DE UMA PAIXÃO
THE PAINTED VEIL
EUA- China /2006
Duração – 125 minutos
Direção – John Curran
Roteiro – Ron Nuswaner, baseado no romance Véu
Pintado, de H. Sommerset Maugham
Produção – Edward Norton, Naomi Watts e Anthony
Bernard
Música – Alexandre Desplat
Fotografia – Stuart Dryburgh
Editor –Alexandre de Franceschi
Elenco – Naomi Watts (Kitty Fane), Edward Norton
(Walter Fane), Liev Schreiber ( Charlie
Towsend), Toby Jones (Waddington),Diana Rigg
(Madre Superiora), Bin Li ( Te Ming), Anthony
Wong Chau Sang (Coronel Yu), Alan david (Mr.
Garstin), Juliet Howland (Dorothy Towsend) e
Luky Voller (Mrs. Garstin).
NOTAS DA EDITORA
História comovente de paixão, infidelidade e
amor, contada em ambientes contrastantes (festas
da alta sociedade, em Londres e Shanghai, em
oposição às aldeias chinesas atingidas por
epidemia de cólera), ao som de belíssima trilha
sonora e algumas cenas de fotografia
deslumbrante. Gostei muito de "O despertar de
uma paixão", apesar do final não ser o que o meu
coração pedia.
Destaco, também, a produção, direção e
interpretação; a reconstituição de época, a
direção de arte, cenografia; adereços, figurinos
e maquiagem. E ainda: os temas e os diálogos.
Julguei ser o filme uma narrativa realista,
dramática, sem deixar de, por outro lado, tratar
do amor, em suas facetas (seus estágios?) de
paixão e romance.
Encontrei no roteiro outros elementos atraentes
para o público: ação, clima de perigo e suspense
emocional; choque de culturas; paisagens e
situações incomuns.
Finalmente, concluí que eu gostei muito de "O
despertar de uma paixão", inclusive porque
analisei o filme, também, por critérios e
valores de meu coração, comovida, sensibilizada
pelo drama do casal protagonista.
Sem julgar unicamente pelos critérios exigentes,
utilizados pelo colega jornalista e escritor
Reynaldo Domingos Ferreira, fundamentado em seus
conhecimentos e na sua experiência pessoal de
dramaturgo, diretor e crítico, literário e de
artes cênicas.
Emocionei-me, portanto, com a humanidade dos
personagens, frágeis e fortes ao mesmo tempo,
aperfeiçoados pelo sofrimento, amadurecidos no
encontro com o próximo.
Gravei em minha mente aquele diálogo que
responde à pergunta de Kitty, bastante ofensiva
ao anfitrião:
- O que ela vê em você?
- Por que não pergunta a ela? (retruca,
sorrindo, o inglês amigo do casal)
E a resposta procurada vai ser enunciada com um
sorriso:
- Porque ele é um homem bom.
Fiquei convencida de que o reencontro, a
aproximação sentimental e física dos personagens
principais revelou o crescimento dos dois, como
casal e como seres humanos de personalidades
distintas, com diferentes experiências de vida:
a mudança de comportamento, não apenas da esposa
fútil que se transforma pelo amor, após ter sido
obrigada a refletir sobre as suas atitudes
indefensáveis e reconhecer a sua quase
inutilidade. O marido ultrapassou seu orgulho
ferido, a mágoa pela infidelidade, que o
motivou, ultrajado e magoado, a dizer à mulher
que se envergonhava de tê-la amado um dia.
Na verdade, penso que foi somente quando ele
perdoou, que sentiu um sentimento novo - passou
daquela paixão inicial (insensata, porque sabia
não ser correspondido e casou assim mesmo), ao
amor consciente, adulto e realista.
Aos que acusam o filme porque seria
melodramático, rebato afirmando que até um
melodrama pode ser uma excelente história.
Principalmente porque, para muitas pessoas,
entre as quais me incluo, a vida é
melodramática.
As palavras de Kitty, já assumindo uma nova
postura como ser humano, encerram "O despertar
de uma paixão", demonstrando, com firmeza, não
mais acreditar nas mentiras de um conquistador
irresponsável.
Inesquecíveis, porém, foram as observações da
Madre Superiora:
- Quando o dever está unido à paixão, a pessoa é
realmente "abençoada".
Theresa Catharina de Góes Campos
São Paulo, 26 de julho de 2007 |
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