O
VIGARISTA DO ANO
Em O Vigarista do Ano, o cineasta
sueco Lasse Hallström, indicado uma vez
ao Oscar, mostra como uma fraude
literária, perpetrada nos anos setenta
contra o empresário da aviação
americana, Howard Hughes, acabou por
contribuir não só para a sua absolvição
num processo que poderia arruiná-lo em
definitivo, como também para a queda de
Richard Nixon da presidência dos EUA.
O autor da fraude foi o escritor
Clifford Irving, que colaborou com
William Wheeler na elaboração do roteiro
do filme, baseado na obra de sua
autoria, The Hoax, em que narra
os acontecimentos, desencadeados,
segundo sua justificativa, como vingança
contra uma pequena e nova editora, a
qual se recusara a lançar a segunda
edição de seu livro sobre Elmyr de
Hory´s, um grande falsificador, diante
de algumas críticas negativas que
recebera da imprensa.
Todos esses fatos, entretanto, são
bastante controversos, tendo servido de
inspiração para Orson Welles realizar o
seu último filme, o documentário
Verdades e Mentiras (1974), no qual
fala de Clifford Irving e de Elmyr de
Hory´s. É desse sentido controverso dos
fatos que o filme de Hallström também se
ressente porque deixa algumas situações
em aberto, imprecisas ou apenas
esboçadas.
Da mesma forma, a linha da direção de
Hallström não se define, entre drama e
comédia, o que se reflete na atuação dos
atores, os quais se vêem soltos à
própria sorte sem ter como aprimorar
suas composições. Em termos de direção,
o melhor acontece nos momentos finais,
quando Hallström, optando pela linha
dramática, imprime tom sombrio na
narrativa para mostrar como o mentiroso
compulsivo, como Clifford Irving
(Richard Gere), um bipolar, oscila de
humor, deixando o estado de euforia em
que quase sempre se encontra para cair
de imediato em forte depressão.
A história tem início num momento de
euforia de Clifford, quando ele
providencia a encenação da chegada de
Howard Hughes em helicóptero ao
edifício, no qual se instala a sua
editora em pleno centro de Manhattan.
Antes, porém que o helicóptero pouse, a
narrativa retroage alguns meses, quando
Clifford, também eufórico ante a
possibilidade do lançamento da segunda
edição de seu livro, não é sequer
recebido pela diretora executiva, Andréa
Tate (Hope Davis). Sentindo-se
humilhado, ele força o encontro com ela,
obtendo a informação de que seu livro
não seria relançado e, em seguida, é
posto para fora por um truculento guarda
de segurança.
Sem esmorecer, Clifford planeja, com o
amigo Dick Susskind (Alfred Molina), um
golpe contra a editora, dizendo que
recebera autorização por escrito de
Howard Hughes – recentemente retratado
no filme O Aviador de Martin
Scorsese – para escrever sua biografia
com informações exclusivas. Para tanto,
ele falsificara a assinatura de Hughes,
que vivia recluso e, na ocasião, ocupava
manchetes de jornais por um processo que
poderia levá-lo à condenação de ter de
pagar aos cofres públicos um montante
aproximado de 240 milhões de dólares.
Como a documentação apresentada à
editora fora considerada autêntica pelos
peritos, a mentira de Clifford ganha
proporções inimagináveis, o que o obriga
a forjar, num trabalho exaustivo com
Susskind, um livro sobre a vida de
Hughes, no qual revelava até mesmo uma
tentativa do empresário de subornar o
presidente Nixon por intermédio de uma
propina dada a um seu irmão residente na
Flórida. A par disso, a vida sentimental
de Clifford também se deteriora em
conseqüência das mentiras contadas por
ele à mulher Edith Irving ( Márcia Gray
Harden) - presa depois de descontar um
cheque de um milhão de dólares em nome
de Howard Hughes num banco da Suíça - e
à ex-amante, a atriz Nina Van Pallandt (
Julie Delpy), que por sinal contracenou
com Richard Gere no filme O Gigolô
Americano, de 1980.
Então o que se tem, em O Vigarista do
Ano, é um tema bastante interessante
– uma das justificativas de Clifford
para o seu procedimento, por exemplo, é
a de que arte é ato eminentemente
subversivo -, que estaria a merecer, a
meu ver, tratamento cinematográfico mais
ousado do que o que lhe dá Hallström,
que ganhou indicação ao Oscar pelo
meloso Regras da Vida, conquistou
bilheteria com o adocicado Chocolate
e, mais recentemente, fracassou com
inconseqüente Casanova. Também a
escolha de Richard Gere para o papel de
Clifford, como se há de convir, não foi
das mais apropriadas. As boas
interpretações são as de Alfred Molina,
no papel de Dick Susskind e a de Márcia
Gray Harden, como Edith Irving. Além
disso, a fotografia de Oliver Stapleton
é de excelente qualidade. E só.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA
TÉCNICA
O VIGARISTA DO ANO
THE HOAX
EUA/2006
Duração – 116 minutos
Direção – Lasse Hallström
Roteiro – William Wheeler e Clifford
Irving
Produção – Betsy Beers, Mark Gordon e
Bob Yari
Música – Carter Burwell
Fotografia – Oliver Stapleton
Edição – Andrew Mondshein
Elenco
– Richard Gere (Clifford Irving), Alfred
Molina (Dick Susskind), Hope Davis
(Andréa Tate), Márcia Gray Harden (Edith
Irving), Stanley Tucci (Shelton
Fischer), Julie Delpy (Nina Van Pallandt),
Eli Wallach ( Noah Dietrich), Howard
Hughes (imagens de arquivo), Richard
Nixon (imagens de arquivo)