Theresa Catharina de Góes Campos

 

O ASSASSINATO DE JESSE JAMES PELO COVARDE ROBERT FORD

Com memoráveis atuações principalmente de Brad Pitt e Casey Affleck, além de uma fotografia primorosa e de uma música, de timbre grave e sombrio, que se ajusta perfeitamente ao sentido épico da narrativa, O Assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford, de Andrew Dominik, é filme de natureza reflexiva sobre a fantasia que se cria em torno de figuras de bandidos, os quais, romantizados pela opinião pública por qualquer motivo, até mesmo pela beleza física, se tornam ídolos...

Baseado no livro homônimo de Ron Ransen, editado em 1983, de textura densa ao que consta, o filme narra os últimos tempos de vida de Jesse James, que apesar de ser bandido frio e cruel assaltante de trens e de bancos, era objeto de adoração dos americanos ao final do século XIX, os quais o identificavam com a figura legendária de Robin Hood. Aos 34 anos, em setembro de 1881, ele estava no auge da fama, quando planejou, em companhia do irmão Frank James, o seu último assalto a trem.

Para realizar o assalto de Blue Cut no dia 7 de setembro de 1881, entretanto, Jesse James (Brad Pitt) e Frank James (Sam Shepard) convidaram bandidos neófitos da região, entre os quais, os irmãos Ford; Charley (Sam Rockwell) e Robert ( Casey Affleck). O último, de 19 anos, desde criança, embarcara na admiração que toda a nação tinha pelos anti-heróis, mas, na convivência diária com eles, perdia aos poucos o encantamento.

De Frank, já agastado com o irmão, ansioso pela separação, que se daria após o assalto de Blue Cut, Robert (ou Bobby) não conseguia sequer se aproximar. Mas de Jesse, explorando o lado dócil e sua aparência de ingênuo meio aparvalhado, ele obtivera algumas graças, se bem que, pelo olhar, o bandido o mantinha sempre sob desconfiança a ponto de perguntar-lhe: Você quer ser como eu, ou quer ser eu?...

Isso não impediria, entretanto, que, depois do assalto, Bobby fora o único, entre os bandidos participantes, convidado a permanecer por alguns dias na residência de Jesse James, como acólito dele, da mulher, Zee James (Mary-Louise Parker) e dos dois filhos. Bajulador e subserviente, ele se sentava na cadeira de balanço ao lado da de Jesse para longas conversações sobre sua admiração pelo bandido, enquanto fumava; - Se o charuto lhe causa enjôo no estômago, Bobby, jogue-o fora!... – dizia-lhe Jesse James. E ele, mais do que depressa, obedecia.

Mas chegou o dia em que Bobby, a mando de Jesse James, teve de partir para se juntar ao irmão, Charley, e aos demais companheiros de banditismo, como Dick Liddil (Paul Schneider), que se homiziaram na casa de uma parenta, Martha Bolton (Alison Elliot), situada numa região distante, de difícil acesso. Apesar disso, uma noite, chegou lá, de surpresa, um primo dos James, Wood Hite (Jeremy Renner), para eliminá-los... É quando Bobby, mais arguto que os demais, não só acaba com a festa de Wood Hite, como começa a arquitetar seu plano de matar Jesse James.

A partir daí, embora o título do filme antecipe para o espectador quem vai morrer, a narrativa de Andrew Dominik, cineasta que veio da Austrália para realizar o seu primeiro trabalho em Hollywood, é de firmeza absoluta. Mas ao contrário do chinês Ang Lee, em O Segredo de Brokeback Mountain, ele não se inspira nos clássicos do western, como Howard Hawks ou John Ford, de, por exemplo, O Homem que Matou o Facínora, para narrar uma história típica do gênero. O seu intento parece ter sido o de descaracterizar o filme como sendo um western. Ou, melhor, como Clint Eastwood, em Os Imperdoáveis, Dominik quis insuflar elementos novos no gênero, absorvidos de épicos chineses e principalmente dos trabalhos reflexivos do cineasta americano Terence Malik.

Assim, a fotografia de Roger Deaknis, na linguagem de Dominik, se torna uma personagem que, além de captar cenas pelas vidraças de rústicas construções, expressa uma gama de intenções por meio de distorções, cores e sombras. É soberbo o efeito plástico, por exemplo, que a câmara de Deaknis extrai da chegada do trem no meio da noite antes de começar o assalto perpetrado pelos irmãos James e seus asseclas. A composição de planos de Dominik é riquíssima e variada, criando, para toda a seqüência, uma tensão permanente. E para subsidiar o papel desempenhado pela fotografia, a música composta pelo cantor Nick Cave – que tem pequena participação ao final do filme –, em colaboração com Warren Ellis, é de fundamental importância.

O elenco, liderado por Brad Pitt e Casey Affleck, em igualdade de condições, é magnífico. A interpretação de Brad Pitt - também produtor do filme, tendo como associado Ridley Scott e outros - é madura, rica em detalhes, baseada na fixação do olhar, no sorriso maneiroso e no sestro de lábios de fumante de charuto. Também pela postura e por uma correta expressão corporal, Pitt sabe tirar proveito, como nenhum outro do elenco, do excelente figurino idealizado por Patrick Norris. Mereceu, portanto, a meu ver, o prêmio de Melhor Ator do Festival de Veneza, o qual poderia ter sido oferecido também a Casey Affleck, cuja interpretação em nada fica a lhe dever. Affleck – melhor ator que o irmão famoso – opta, contudo, por interiorizar mais o seu personagem, não se preocupando com elementos exteriores de sua composição. De mesma forma apresentam excelentes atuações Sam Shepard, Sam Rockwell e Paul Schneider.

Mas é uma pena que o discurso político tenha sido feito pelo narrador ao final e não ao início do filme. Para não deixar cair o ritmo, como se verifica, Dominik, autor também do roteiro, deveria ter feito do epílogo o prólogo do filme, por meio de flashback, para que prevalecesse a resposta dada por Bobby à sua mulher, que lhe pergunta sobre os motivos que o levaram a assassinar Jesse James: Por medo de morrer e pela recompensa em dinheiro que eu receberia. Mas nunca pensei que iria sofrer tanto por isso!... Pois de fato, como ainda comenta o narrador, ninguém dá o nome de Robert Ford aos filhos, não visita a casa onde ele nasceu, nem veste camisetas T-shirt com a sua figura. Ninguém. O mundo continua sendo assim!... De qualquer forma, porém, com O Assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford, o cineasta australiano Andrew Dominik faz uma bela estréia em Hollywood, digna de elogios.

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
O ASSASSINATO DE JESSE JAMES PELO COVARDE ROBERT FORD
THE ASSSSINATION OF JESSE JAMES FOR THE COWARD ROBERT FORD
EUA/2007

Duração – 160 minutos
Direção e Roteiro – Andrew Dominik
Produção – Brad Pitt, Jules Day, Dede Gardner, Ridley Scott e David Valdes
Fotografia – Roger Deaknis
Música – Nick Cave e Warren Ellis
Figurino – Patrick Norris
Edição – Curtiss Clayton e Dylan Tichenor
Elenco – Brad Pitt (Jesse James), Sam Shepard (Frank James), Casey Affleck (Robert Ford), Mary Louise Parker (Zee James), Sam Rockwell (Charley Ford), Paul Schneider (Dick Liddil), Alison Elliott (Martha Bolton), Jeremy Renner (Wood Hite).

 

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