|
|
|
|
|
|
Dia Internacional da Mulher |
10/03/2008 | 19:16 |
Superar clichês para abordar a
mulher na mídia |
|
A passagem do Dia Internacional da
Mulher (8 de março), além das
comemorações alusivas, reforça a
sempre necessária reflexão sobre as
questões de gênero, no sentido de
equalização dos direitos sociais. Do
ponto de vista dos meios de
comunicação, uma das tarefas mais
complexas talvez seja apresentar a
mulher livre dos estigmas de beleza
e sensualidade, dos clichês. Para as
mulheres profissionais do setor, os
desafios são grandes, assim como a
responsabilidade.
A forma como a mulher é tratada nos
meios de comunicação, de maneira
geral, reproduz a imagem que a
sociedade elabora do sexo feminino.
Dessa forma, o compromisso da
própria profissional de comunicação
na "construção" da figura feminina
veiculada é fundamental. "Embora não
seja pauta no dia-a-dia das redações
e algumas colegas até neguem, creio
que cabe às mulheres jornalistas
esse papel, fundamental, de colocar
os elementos que compõem as
preocupações das organizações,
pesquisadoras e teóricas das
questões de gênero na sociedade",
reflete a jornalista Beth Costa,
editora do Jornal Nacional (TV
Globo) e membro da direção da
Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ).
Os desafios ainda são muito grandes,
destaca Beth. O primeiro deles,
aponta, é a sensibilização para que,
cada vez mais, as mulheres nas
redações assumam esse papel –
desgastante, muitas vezes
estereotipado e ironizado pelos
próprios companheiros de trabalho.
"Mas, acredito firmemente que o
olhar feminino sobre as questões de
gênero (como discriminações,
assédios e sexual, salário menor do
que o dos colegas, limitações na
ascensão profissional, direitos da
maternidade, violência contra a
mulher, etc. etc) é fundamental e
imprescindível", reforça Beth.
Mulheres são maioria na audiência
As mulheres brasileiras compõem uma
fatia majoritária das audiências da
televisão (53%), do rádio (53%) e
das revistas (55%), e representam
49% dos leitores de jornais, segundo
dados divulgados pelo Instituto
Patrícia Galvão, que fazem parte de
um relatório preparado por
solicitação do Comitê da
Participação Brasileira na Sessão
Especial da Assembléia das Nações
Unidas (Pequim + 5), no ano de 2000.
Essa incidência coloca as mulheres
como preocupação estratégica na
formulação de conteúdos para esses
meios. Contudo, a imagem que se faz
do feminino, na maioria das vezes,
segue o estereotipo: magra, alta,
bonita, se distanciando da realidade
que é diversa. "A mídia nos
contempla de uma maneira muito
seletiva e sempre focando o aspecto
mercadológico, o emocional, as
questões um pouco mais individuais,
e nunca levando em conta qualquer
consideração enquanto necessidade
social, enquanto movimento", analisa
a psicóloga Rachel Moreno,
presidente do Observatório da Mulher
(entidade feminista que trabalha por
políticas públicas relacionadas às
questões do gênero).
..."Nem toda feiticeira é corcunda,
nem toda brasileira é bunda,
meu peito não é de silicone. Não sou
atriz, modelo, dançarina"...
Os versos são da música Pagu, de
Rita Lee, e servem como exemplo de
um modelo (imagem) não contemplado
pelos grandes meios de comunicação,
numa analogia que corrobora com uma
realidade apontada por Rachel,
quando ela diz que a mídia acaba por
não considerar as diversidades
femininas. "Não são debatidos os
problemas que a vida contemporânea
nos coloca, nem consideram que somos
diversas. Somos brancas, negras,
velhas, jovens, gordas, magras; e
temos opiniões variadas a respeito
da vida", comenta, lamentando o
modelo autoritário que resulta desta
abordagem.
Mudar o imaginário
Comemorar o Dia Internacional da
Mulher é um paradoxo, na opinião da
jornalista Christiane Finger,
editora regional do SBT no Rio
Grande do Sul, âncora de um
telejornal regional na emissora e
coordenadora do curso de Jornalismo
da PUC-RS. "Ao mesmo tempo em que a
gente tem que reforçar direitos,
abrir alguns espaços, parece que
essa comemoração, por si só, é meio
machista. Tenho sempre dúvidas de
como pautar esse tema", revela,
destacando que, às vezes, as lutas
se confundem. "Além de uma luta de
classes, também é uma luta de
gênero", afirma Christiane. Ela
destaca o perigo de o profissional
embarcar em clichês como o papel da
mulher, o papel da mãe, "coisas que
ficam no imaginário e que acabamos
reproduzindo se não estivermos
atentos", relata, lembrando do
necessário cuidado para não cair
para o outro lado, da "discriminação
ao contrário". Christiane revela que
em sua redação, na emissora, só tem
mulheres. "Eu sempre digo que é
porque as mulheres conseguem cuidar
de várias coisas ao mesmo tempo",
lembra.
Beth Costa reflete ainda que as
profissionais da comunicação parecem
desconhecer as mudanças em andamento
e as conquistas das mulheres nos
dias de hoje. Segundo ela, se
fizermos uma pesquisa nos assuntos
que são tratados diariamente pela
televisão, não veremos nada do que
as pesquisas já indicam: que as
mulheres são maioria nas
universidades, que as mulheres
assumiram o papel de chefe de
família em 74% dos lares, que as
mulheres inclusive são maioria nas
redações.
O impacto disso na construção de uma
imagem diferenciada, de um olhar
compreensivo e acolhedor em direção
às mudanças concretas por que passam
e já passaram as mulheres? "Como eu
disse antes, muitas de nós temos
medo ainda de sermos chamadas de
feministas, quando defendemos essa
visão mais apurada. Eu, por exemplo,
adoro ser chamada de feminista. Isso
pra mim é um elogio muito grande",
revela Beth.
É possível intervir na mudança de
uma concepção de gênero
estereotipada tipo: mulher magra,
mulher bonita, mulher meiga, mulher
alta, mulher jovem, mulher esposa,
mulher gostosa... retratada na
maioria das vezes pela mídia?
Para a jornalista Beth Costa, não se
trata de uma tarefa fácil. Ela
argumenta que mudanças de cultura
levam anos para acontecer, e que,
por isso, depende de cada mulher na
redação estar consciente desse
papel. "Podem crer, essa é uma
tarefa diária e incessante, pois a
todo momento a discriminação contra
a mulher aparece. De uma forma mais
amena ou mais violenta, sempre
aparece. E cabe a nós, mulheres
jornalistas, termos o olhar atento e
os argumentos na ponta da língua,
para disputar as mentes e os
corações, primeiro dos nossos chefes
e colegas, depois da sociedade",
justifica.
Uma TV comercial deve ter um
comprometimento diferenciado de uma
TV pública com essa questão da
imagem da mulher? Beth garante que
essa é uma tarefa de todas as
emissoras de TV. "Quanto a isso, sou
radical. A TV pública talvez tenha
mais independência e tempo pra
tratar dessas questões, mas, as
comerciais, por terem uma fatia
maior da audiência, têm a obrigação
de tratar desses assuntos, com um
olhar diferenciado, feminino, sem
dúvida alguma".
Na TV Brasil, recém inaugurada, a
mulher terá mais espaço, por meio da
divulgação de suas produções, de
suas obras, como cineastas,
escritoras, diretoras de cinema,
cientistas, produtoras, artistas.
Fará parte da programação trabalhar
a imagem da mulher valorizando-a em
seus papéis múltiplos na sociedade,
como profissional, como mãe. A
afirmação é da presidente da nova
emissora de TV pública brasileira,
Tereza Cruvinel, que, garante, irá
"sair um tanto dessa coisa da
aparência, da valorização estética
feminina, e voltar para sua
produção, seu trabalho, sua
energia". Uma programação especial
da TV Brasil, no mês de março,
apresenta a obra de diversas
mulheres brasileiras (confira
a programação).
Ana Rita Marini com a colaboração
de Fabiana Reinholz
Matéria publicada no site do FNDC em
08/03/2008
|
|
|
|
|