|
A PRÁTICA DA RESSURREIÇÃO
From: Tereza Lúcia Halliday
Date: 2008/3/20
Amigos Seletos:
Quer alguns de vocês comemorem a Páscoa
liturgicamente, como cristãos
praticantes, quer outros curtam
simplesmente um feriadão, aproveito para
desejar-lhes muitas ressurreições, no
espírito do artigo em anexo [abaixo].
Endereçá-lo também aos amigos de
religião judaica e budista não se
constitúi numa gafe, mas num ato de
carinho. Leiam e verão.
Um abraço,
Tereza
A PRÁTICA DA RESSURREIÇÃO
M. Maureen Killoran
Ressurreição. Renovação, retorno à Vida
– eis uma experiência possível para
gente comum, como eu e você.
Quando minha mãe morreu, foi uma espécie
de morte para meu pai também. Morando
numa cidadezinha da qual ele jamais
gostara, viúvo depois de 49 anos de
casamento, ficou atarantado. Acabou
cometendo todos os erros predizíveis:
vendeu a casa, mudou-se para uma cidade
maior, caiu em depressão e começou a
beber. Mas, lá um dia, aos 70 anos, ele
fez uma coisa que sempre tivera vontade
de fazer, desde menino: matriculou-se
num curso para aprender a pilotar avião.
O curso testou seus reflexos,
resistência e paciência. As aulas
forçaram os limites de sua mente.
Continuou firme, até que só faltava um
exame médico para obter o brevet de
piloto desacompanhado. Foi aprovado em
tudo, mas teve suas esperanças
destruídas quando lhe disseram:
“Lamentamos, mas não podemos permitir
que o senhor pilote um avião sozinho. O
senhor tem 70 anos”.
Meu pai insistiu, recorreu a vários
níveis hierárquicos e submeteu-se outra
vez a novos exames físicos, cada vez
mais rigorosos. Todos concordavam que
ele estava fisicamente apto, mas
tornavam a insistir que não podiam
dar-lhe permissão para pilotar
desacompanhado, naquela idade.
Finalmente, ele conseguiu que um alto
funcionário atestasse que não havia
regra nem lei alguma impedindo um piloto
qualificado de voar aos 70 anos. Foi
desafiado a submeter-se aos exames
médicos mais uma vez e, mais uma vez,
saiu-se muito bem. Por fim, o médico
deu-lhe o Certificado de Qualificação
para voar sozinho e perguntou: “Quando é
que o senhor vai fazer a sua estréia
como piloto desacompanhado?” Apertando
efusivamente a mão do médico, papai
respondeu: “Pensa que eu sou louco? Não
vou pilotar um avião sozinho. Eu tenho
70 anos”.
Para meu pai, a ressurreição aconteceu
quando a coragem tocou seu coração e a
esperança alcançou a sua alma. Quando
ele tomou o mundo como um desafio,
quando foi realista sobre o que podia e
o que não podia fazer, quando deixou que
o humor determinasse onde traçar a linha
divisória.
Suas Ressurreições
Pense: quando aconteceram ressurreições
em sua vida? Ou melhor, onde e quando
você esteve com a alma morta? Que
decepções o levaram a insular-se do peso
do mundo? Que perda o deixou abandonado?
Que recordações passaram os dedos
fantasmagóricos pelas bordas de sua
mente? Quem estava com você quando essas
ressurreições aconteceram? Quem o
encorajou e apoiou no seu processo de
mudança? Que dimensão mais profunda
alimentou-o nessa caminhada?
Por mais confortável que seja o túmulo
onde nossa alma se enterra, não existe
vida dentro dele. Chega um tempo em que
somos chamados a enfrentar o medo e
prosseguir. Literalmente, Ressurreição
significa “levantar-se de novo”, voltar
à vida, depois das mortes grandes e
pequenas que experimentamos...
A prática da ressurreição é para os que
protestam em terras de terror,
transcendendo-o através da força da
comunidade; os pais que não se tornam
amargurados quando as vidas de seus
filhos tomam rumos que lhes causam
desgosto; a mulher que encontra coragem
para viver, em vez de morrer, no
intervalo que se segue ao diagnóstico de
uma doença grave; o homem que opta por
confiar no mundo outra vez, depois de
atravessar um divórcio devastador; a
criança dentro de nós, que se deixa
abraçar quando esfolou o joelho... e
deixa seus olhos serem enxugados por
mãos gentis - que podem até ser suas
próprias mãos. E então, volta para o
jogo da vida, o jogo para o qual fomos
feitos.
Trata-se das ressurreições do seu
coração em meio à dor. Ressurreições do
seu espírito no convívio com a escuridão
e os enganos. Ressurreições de sua alma,
no meio da falta de sentido e do
desespero. Refiro-me aos milagres
quotidianos, sem os quais não
viveríamos, apenas sobreviveríamos.
Pratiquem a Ressurreição, amigos!
-------------------------------------------------------------------------------------
(Versão condensada e tradução do texto
“Practice Ressurrection”, in QUEST,
vol.54,n.7 Boston, CLF, Março 1997,
p.1-3). |
|