Theresa Catharina de Góes Campos

   OS DESAFINADOS

O premiado cineasta Walter Lima Jr. realiza, em Os Desafinados, uma fantasia romântica, quase sempre poética e bem humorada, mas também de cunho político, sobre a trajetória de cinco músicos brasileiros, calcados em figuras da realidade. Eles, no embalo do surgimento da Bossa Nova, nos anos sessenta, sonharam criar uma carreira de sucesso, malograda, contudo, ao longo do tempo, pela realidade dura imposta pelos regimes militares na América Latina.

Autor também do argumento e do roteiro do filme, Walter Lima Jr. quis, na verdade, dar destaque, sem nostalgia, a uma brilhante fase da música popular brasileira, que alcançou sucesso internacional. A música, uma das nossas riquezas, é assim a personagem principal do filme. Por isso, é digno de elogio o trabalho de Wagner Tiso, que compôs, para a trilha sonora, temas até mesmo sob a influência dos anos cinqüenta – da pré-Bossa Nova –, que se tornam elemento de importância para a análise da evolução da narrativa.

É a partir de um fato histórico por sinal – o mal-sucedido concerto promovido pelo Itamaraty no Carnegie Hall com figuras eminentes da Bossa Nova, como Tom Jobim, Oscar Castro Neves, Carlos Lyra, Sérgio Ricardo, Luiz Bonfá e outros - que tem início o filme. Pois os cinco músicos, que constituem o conjunto Rio Bossa Cinco – Joaquim (Rodrigo Santoro), Dico (Selton Mello), Paulo César ( André Moraes), Geraldo (Jair Oliveira) e Davi (Ângelo Paes Leme) -, se não conseguem ser incluídos, como pretendiam, na programação do Carnegie Hall, acabam por vender, ao preço de mil dólares, a partitura de uma música a um empresário americano, que deseja gravá-la nos EUA.

Animados com o feito, os músicos juntam suas economias para viajar a Nova York a fim de assistir ao concerto do Carnegie Hall e de tratar da gravação de Quero Você, adaptação de um tema inédito de Newton Mendonça feita para o filme por Wagner Tiso. Ao chegarem a Manhattan, os músicos se decepcionam, primeiro, pelo fato de não conseguirem comprar ingressos para a apresentação do Carnegie Hall, segundo, pelas dificuldades que encontram - alojados num quarto de apenas duas camas - para se manterem na cidade.

Nos tempos atuais, alguns desses músicos, já idosos – Davi (Genésio Barros), Dico (Arthur Kohl), Paulo César (Antonio Pedro) e Geraldo (Bené Silva) – se encontram num bar tradicional no Rio e, aparentemente sem motivo, começam a rememorar os tempos de Os Desafinados, conjunto que criaram em Nova York nos anos sessenta, bem como o surgimento, em suas vidas, de Glória (Claudia Abreu), filha de brasileiro com uma americana, que Joaquim conhecera, no Central Park, tocando Copacabana, de João de Barro e Alberto Ribeiro, em solo de flauta.

Avançada para o tempo em que vive, Glória não só leva os músicos - em número de quatro, pois Dico regressara ao Brasil - para o pequeno apartamento em que vive, como se torna crooner de Os Desafinados. A carreira do conjunto é, contudo, de breve duração, pois, denunciados ao Departamento de Imigração dos EUA, os músicos se vêm forçados a retornar ao país. Mas Glória vem no encalço deles, melhor dizendo no de Joaquim - casado com Luiza (Alessandra Negrini) -, por quem se apaixonara. Assim é principalmente da vida dos três que trata o filme.

A narrativa de Walter Lima Jr. baseada num roteiro bem estruturado, mas nem sempre bom nos diálogos, flui naturalmente. Deve-se observar que algumas cenas se inspiram nas músicas da trilha sonora, como a do retorno de Joaquim ao Rio, quando ele ouve, no táxi, Copacabana num belo arranjo orquestral, com solo de flauta de Dirceu Leite, fazendo-o lembrar-se, de imediato, de Glória, que ficara nos EUA.

Outra cena vibrante, em termos musicais, é a que tem lugar em um pequeno bar, Village Vanguard, onde os músicos brasileiros se juntam a um conjunto americano para tocar Bossa Nova – Só Danço o Samba, de Tom Jobim - em ritmo de Jazz. Além disso, o realizador de Menino de Engenho explora bem a bela fotografia de Pedro Farkas tanto nas panorâmicas do Rio (a partir da Urca) e de Manhattan, como nas expressivas composições de planos das cenas de interiores.

Se os atores não abrilhantam o filme, também não o comprometem. Mas há cenas que seriam bem mais verossímeis, se eles fossem mais convincentes. Ou menos desafinados. Cláudia Abreu exibe sua beleza ao natural na cena em que se banha à vista de todos os músicos que abrigara em casa, mas se atrapalha quando canta, dublada pela voz de Branca Lima, filha de Walter Lima Jr. Artificial como Joaquim, Rodrigo Santoro naufraga feio mesmo é no segundo papel que lhe foi confiado...

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
www.theresacatharinacampos.com
www.arteculturanews.com
www.noticiasculturais.com
www.politicaparapoliticos.com.br
cafenapolitica.blog.br

FICHA TÉCNICA
OS DESAFINADOS
Brasil/2006
Duração 128 minutos
Direção – Walter Lima Jr.
Roteiro – Walter Lima Jr., Suzana Macedo e Elena Soarez
Produção - Flávio R. Tambellini
Fotografia – Pedro Farkas
Direção Musical – Wagner Tiso

Elenco – Rodrigo Santoro (Joaquim), Selton Mello e Arthur Kohl (Dico), Claudia Abreu (Glória), André Moraes e Antonio Pedro (Paulo César), Jair Oliveira e Bené Silva (Geraldo), Ângelo Paes Leme e Genésio de Barros (Davi), Alessandra Negrini (Luiza).
 

Jornalismo com ética e solidariedade.