Theresa Catharina de Góes Campos

  O BELO, MISTERIOSO ENIGMA DOS DESENCONTROS


O encontro acontece,
não se explica, é.
Desencontros se revelam
enigmas e mistérios,
às vezes ilógicos,contraditórios.


Na busca do que não procurei,
misteriosamente me realizei.


De tudo que me levaram
restou-me o nada essencial,
a fartura seminal
do despojamento quase total.


Na busca do que não procurei,
esse desencontro sofrido me realizou.


As palavras que sonhava ouvir
não me foram presenteadas.
Nesse desencontro em silêncio
as palavras não pronunciadas
me devolveram um silêncio criador.
A força do carinho que não recebi
revigorou-me interiormente.
Do tesouro que me arrancaram das mãos
ficou um mapa das minas de diamantes
ainda não conhecidas,
nem mapeadas.


Em todas as ausências
encontrei presenças
já decodificadas
para inserção em mim
como ausências
que se tornaram
presentes.
A companhia das ausências
que foram vivências
e companhia tão queridas.


Quando chegaram as doenças,
entre elas a epilepsia
que não me abandonará
até o momento final,
comecei a construir minha saúde.
A partir da imobilidade
nos períodos de permanência na UTI,
nas incertezas das sessões de quimioterapia,
nos repetidos e difíceis exames ,
surgiu a decisão para aprender mais
com os desencontros.
Determinada, aceitei a realidade
de que o encontro jamais poderia ser
um posicionamento individual,
nunca dependeria apenas de mim.
Dos desencontros, porém,
com seus belos enigmas e mistérios,
deveria eu cuidar.


Do peso certo durante cinco décadas,
passei a conviver com a obesidade
a exigir atividades físicas
e restrições na alimentação,
cuidados antes desnecessários.


Mesmo quando não havia sol,
lua, estrelas visíveis no firmamento,
destacou-se nos meus sonhos
a luz dos olhos
de alguém especial,
a luminosidade das águas
sem imobilidade.
Sobretudo encontrei a luz
sem face nem brilho
que pressentia meu coração
até na insondável escuridão
que tentava negar a esperança de luz.


Do branco e do negro fiz arco-íris.
Do verde eu teci matizes,
do azul bordei nuanças.


Da força de vontade do corpo,
chamando a mente e o coração,
em convocação para trabalharem juntos,
saíram versos e sons silenciosos,
músicas jamais executadas,
canções escondidas, inéditas.


Minha vida colori
usando a pena como se fosse
alaúde, flauta e sanfona.


Com a pena transformada,
em condutora de sonhos
atuando magicamente,
consegui criar cores e formas.
Como se a pena fosse
esmeril e pincel.


O orvalho se fez na minha face
todos os dias, nascido das lágrimas
que permaneceram nas sombras.


Nas pessoas iguais, percebi diferenças.
Nos diferentes, também enxerguei semelhanças.
Fui capaz de amar essas igualdades e diversidades.


Seguem pulsando, os enigmas anunciados
pelos perturbadores mistérios dos desencontros.


Do amor rejeitado
fiz uma receita para viver.
Ignorada, aprendi a ver,
a observar e reconhecer,
reflexiva e ciente,
o visível e o invisível,
no ontem e no hoje pressentidos,
consciente dos enigmas e mistérios.
Dos golpes nasceram harpas,
flautas e cítaras.
Dos sonhos desfeitos,
ficou uma partitura de aleluias,
canções de louvores nos sinos a badalar,
testemunhando sem jamais cansar:
foi Deus, foi Jesus, Menino e Redentor.


Com voz de defesa inaudível,
figura quase invisível
a males e dores maiores,
superiores às minhas poucas forças,
já muito abaladas,
eis que sou resgatada pelos anjos.
Junto-me aos pastores de Belém
e aos sábios Reis Magos
desde o Oriente guiados
também por sonhos, estudos
e pela estrela única do Natal,
esplendorosa e deslumbrante
com seu manto a desfilar
no firmamento todo iluminado.


Vê-los posicionados, contritos,
em adoração diante da Criança,
foi a Epifania que me uniu
ao universo do Criador,
em Sua plenitude do Bem e do Amor,
em suas dimensões mais incompreensíveis
por nossa pequenez,
em nossa vida seguindo
caminho de dor, esplendor.


Os desencontros se desfizeram
no encontro maior do presépio.


Descobri, para minha satisfação,
que mesmo golpeada...
sou resistente e resiliente,
além de multifacetada,
em metamorfoses bastante experiente.
Lembrei do comentário de amigo,
na faculdade, afirmando ser eu
uma violeta que se demorava
a notar, mas a partir do momento
em que era percebida,
passava a ser apreciada.


Gerada no amor de meus pais,
muitos séculos antes eu fui
Pensamento e Palavra de nosso Criador,
argila nas mãos amorosas de Deus.
No Plano maior da Divina Providência,
ouso pensar que sou poema incompleto
do Senhor do Tempo, cujos versos
têm mil formas e rimas.
Eternos, incontáveis versos...
nascidos do poder da Palavra,
criadora da Luz e de tudo que existe.


Na imobilidade, dancei a vida.
Nos movimentos, encontrei o pensar filosófico.
Na transparência me escondi,
nas sombras me vesti de luz.


No vazio, com o nada que me deixaram,
realizei a alquimia do quase tudo.
O que me tiraram não me pertencia,
descobri, afinal conformada.
O que Deus me deu, ninguém me tirou.
Recebi o melhor, não o mais fácil,
nem o mais previsível:
o belo, misterioso enigma
dos desencontros.


Reconheci uma visão dos mistérios
nos ecos e brilhos matizados da luz.
Apreciei a luminosidade na vibração dos sons.
Percebi os movimentos do firmamento imóvel.
Ouvi o silêncio e as sombras.
Escutei os lamentos inaudíveis.
Senti a proximidade das estrelas.
Na ausência das distâncias
para o espírito e os sentimentos,
sem obstáculos interiores,
muito íntimos e pessoais,
seguindo parâmetros incomuns,
paradigmas impopulares, minoritários,
me considerei realizada...
e a caminho de novas realizações.


Até do amor rejeitado...
aquela recusa que seria
uma rejeição inaceitável
por envolver os laços de sangue
mais profundos,
o amor forçado a não existir,
de toda essa recusa,
transmutada e transfigurada
de forma seminal,
construí um amor difuso,
às recusas acostumado,
enfim, uma existência plena
apesar das imperfeições,
malgrado as carências mais dolorosas.
Uma realidade que não se vê,
mas existe. Talvez na forma de avesso.
Talvez nos muitos desencontros.


Uma energia escondida,
mas que de fato existe,
vai se renovando no percurso da vida,
uma energia assim inesgotável,
presente, embora invisível!
Uma energia de libertação
das prisões interiores,
concomitantes e sucessivas,
invisíveis, contemporâneas.


Uma energia pesquisada,
evoluindo para que o fim seja encontrado
somente quando, no desfecho inexorável,
no minuto final inevitável,
caminhos a percorrer não mais houver...


Nos momentos de maior lucidez,
poderia ser considerada louca.
Logo percebi, no entanto,
do meu viver não desejar
esse estado de lucidez diferente apagar.


Nas ondas do oceano,
busquei imobilidade.
Nas estrelas procurei
a escuridão da noite.
No sol, quis encontrar a lua.
Na lua esperei encontrar
o calor germinador do sol.


Consegui realizar,
no encontro dos desencontros,
no âmago de mim mesma,
na força indômita do espírito,
todos aqueles mais antigos ideais
que aos outros pareciam impossíveis.


Lúcida e determinada,
eu compreendia ser
uma loucura consciente,
uma percepção de vida não-alienada,
embora à primeira vista surreal.


Ficando surda aos ruídos
insensatos do mundo,
passei a ouvir os sons inaudíveis,
silenciosos...mas tão reais!


Reunindo essa matéria insólita,
invisível, escondida nos mistérios
de enigmas jamais solucionados,
caminhei, resoluta, para Ser, Agir e Viver Melhor.


Porque nossa escala de notas musicais
tem mais que notas...
são sinos a badalar, convictos,
melodias de louvores,
partituras de sonatas abençoadas,
gritos de Aleluia.


Theresa Catharina de Góes Campos
Brasília-DF, 21 de dezembro de 2008

From: Hercilia Lopes Lopes
Date: 2008/12/21
Subject: Olá
To: Theresa Catharina de Goes Campos


Oi, Theresa,

Belíssimos os teus versos. Parabéns.
Mais uma vez te desejo um ano de 2009 cheio de encontros felizes com teus amigos e familiares.
Hercília


From: Jose Araujo
Date: 2008/12/21
Subject: Re: O BELO, MISTERIOSO ENIGMA DOS DESENCONTROS
To: Theresa Catharina de Goes Campos


Cara amiga Theresa, mais uma vez você me emociona profundamente com um texto seu.
Absorvi cada palavra e viajei em meus pensamentos!
Você tem o dom da palavra ,minha amiga!
Obrigado pelo carinho de sempre e aproveito para desejar-lhe um Feliz Natal e também um ano novo cheio de realizações, em todas as áreas de sua vida!

Do amigo sincero e seu leitor assíduo,
José Araújo
Autor e escritor paulista


From: adfalcao
Date: 2008/12/22
Subject: Re: O BELO, MISTERIOSO ENIGMA DOS DESENCONTROS
To: "theresa.files"


Theresa, tão espontânea quanto belíssima, sua mais recente confissão.
Só poderia ser sua. Beijos, Ana


From: Luci Tiho Ikari
Date: 2008/12/26
Subject: Re: O BELO, MISTERIOSO ENIGMA DOS DESENCONTROS
To: Theresa Catharina de Goes Campos


Theresa Catharina:

Você consegue transformar o sofrimento em realizações felizes.
Encaminha-as, para distribuir coragem, determinação e compreensão a todos que necessitam. Luci


From: Diana Farias Campos
Date: 2008/12/22
Subject: Re: O BELO, MISTERIOSO ENIGMA DOS DESENCONTROS
To: Theresa Catharina de Goes Campos


"...Na busca do que não procurei,
misteriosamente me realizei..."

Lindo demais o seu poema, tia!
Ao mesmo tempo pesado por falar de dores de todas as naturezas, de uma delicadeza, sutileza e leveza ímpares.
Admiro muita sua sensibilidade, mais ainda sua capacidade de expô-la, exprimì-la em palavras de forma tão bela!

Sempre que vejo um e-mail com o assunto "CD-poesias..." chegando, encaro como um presente entrando em minha casa!

Um enorme Beijo!
Diana

 

Jornalismo com ética e solidariedade.