|
UMA VIAGEM AO FUTURO...
Autor: José Araújo
São Paulo, 31 de dezembro de 2008. Já era quase
meia noite. Faltavam
apenas cinco minutos para a virada de ano, e
Edivaldo como sempre,
havia saído tarde de seu trabalho. Dia após dia
ele trabalhava duro
como garçom no restaurante de um conceituado
Hotel da capital
paulista, isto, desde que chegou a São Paulo.
Vindo do nordeste
brasileiro para tentar uma vida melhor na maior
metrópole do país, ele
se esforçava ao máximo que podia para progredir
às custas de seu
trabalho. Era comum ele passar as viradas de ano
na rua, dentro do
metro ou de algum ônibus voltando para casa,
pois seu trabalho exigia
muito dele, ainda mais nas épocas de festas. Ele
ainda tinha uma
vantagem sobre seus outros colegas de profissão.
Sempre foi liberado
para sair mais cedo do trabalho, afinal ele era
bastante esforçado.
Entrava muito cedo e saia tarde todos os dias,
mas mesmo saindo mais
cedo que os outros, nunca ele conseguia chegar
em casa a tempo para
festejar com a família o Natal ou o Ano Novo. O
gerente do
restaurante, desde o inicio gostou do jeito
simples e bem educado de
Edivaldo. Ao contrario dos demais, ele era
sensível, tinha muito bom
gosto e sabia com o se portar em qualquer lugar.
Uma pessoa que veio
de família humilde, sem condições de lhe
proporcionar bons estudos.
Contudo, ele era diferente.
Desde muito novo, quando aprendeu a ler, começou
a estudar com afinco.
Ele se tornou um autodidata. Sabia de tudo um
pouco e em alguns
assuntos, ele se aprofundava mais. Com 28 anos
de idade, ele já havia
aprendido a falar três idiomas que dominava com
fluência. No ramo em
que ele trabalhava, ainda mais na área dos
Jardins, ser poliglota era
indispensável, principalmente em épocas
especiais, quando os turistas
invadiam a cidade. Um rapaz como ele, com boa
aparência, educado,
inteligente e ainda por cima poliglota, foi um
verdadeiro achado para
a empresa em que ele trabalhava. Ele sempre foi
um homem que nunca
reclamou de salários ou horários. Trabalhava
constantemente e com
afinco. Às vezes até sete dias por semana. Nunca
desanimou nem por um
instante. Tudo que ele queria, era poder
garantir o sustento e algum
conforto para sua jovem esposa e seu pequeno
filho. Além de fazer de
tudo para dar o melhor que podia para eles,
ainda mandava algum
dinheiro para seus velhos pais no Nordeste.
Naquela noite em especial
ele estava bem cansado. Com o passar dos anos,
com sua inteligência
aguçada e sensibilidade intensa, prestava muita
atenção no
comportamento das outras pessoas. A psicologia
era uma das coisas que
mais o atraia. Em determinados momentos, quando
chegavam as
festividades de Natal e Ano Novo, o que mais lhe
chamava a atenção,
era a maneira como as pessoas encaravam essa
época. Cada qual agia de
uma forma. Uns poucos eram pessoas de fé e
acreditavam num mundo
melhor, com mais amor, mais respeito, mais
solidariedade para todos
sem exceção.
Estes se cumprimentavam ardorosamente e se
abraçavam trocando votos de
prosperidade, saúde, amor e fé no coração. O que
mais lhe chamava a
atenção, era que a maioria, nem sequer se
cumprimentavam. Elas
evitavam demonstrações de carinho através de
contato físico.
Demonstrar amor para eles, nem pensar! Ano após
ano, aquilo preocupava
seu coração sensível e ele ficava imaginando,
onde a raça humana iria
parar, agindo daquela forma. Como de costume,
ele entrou na estação
Paraíso do metro. Ele sentia como sempre uma
tristeza enorme por não
poder estar com sua família, fosse no Natal ou
Ano Novo, e uma
angustia apertava seu peito naquela noite, como
ele nunca havia
sentido antes em sua vida. A avenida Paulista
estava prestes a
comemorar mais uma virada de ano sensacional com
inúmeros shows e a
grande queimada de fogos à meia noite. Havia
muita gente na plataforma
e tudo que ele queria, era poder se sentar
quando entrasse no metrô.
Trabalhando em pé o dia todo, indo de lá para
cá, atendendo a todo
tipo de pessoas e mesmo sendo por vezes
humilhado por alguns, ele
sempre procurava manter seu controle. Ele
acreditava piamente que era
seu dever de pessoa educada e crente em Deus,
que fizessem o que
fizessem para tira-lo do sério, ele tinha que se
manter inalterado. Em
sua mente, um homem inteligente não se deixa
abalar pelo mau
comportamento alheio.
Violência para ele era sinal de espírito fraco.
Não representava de
forma alguma, demonstração de força, ou poder.
Após esperar poucos
minutos, a composição chegou. Havia uma multidão
na estação Paraíso
que se dirigia à Avenida Paulista para as
comemorações da virada de
ano. De alguma forma, quando as portas do metro
se abriram, ninguém
entrou no último vagão. Ele estava completamente
vazio, mas todos se
dirigiram para os outros vagões. Edivaldo meio
atordoado de cansaço,
não pensou duas vezes. Mesmo sem compreender o
motivo pelo qual aquela
multidão não quis embarcar naquele vagão, ele
entrou e se sentou. Seus
pés doíam. Seu corpo todo estava sentindo o peso
do cansaço. Seu
destino era a estação Vila Madalena, e de lá,
teria que pegar um
ônibus que o levaria até seu bairro, que ficava
a quase uma hora de
distancia. Pensando em sua família, no carinho e
amor que eles
compartilhavam juntos, ele pedia a Deus que um
dia ele pudesse passar
uma noite de Ano Novo com eles. Sonhava em
abraça-los com todo amor
quando chegasse a meia noite. Do fundo de seu
coração, ele desejava
que o Ano Novo fosse melhor para todos, que a
vida lhes trouxesse paz,
amor, saúde e prosperidade. Não só para ele e
sua família, mas para a
humanidade em geral. Em seu coração bondoso, ele
gostaria que as
pessoas ficassem mais próximas umas das outras.
Que se doassem um
pouco mais. Que elas compreendessem o valor de
um abraço, de um beijo,
de um carinho. Que seus corações se abrissem
para a fé. Que elas
acreditassem mais na existência de Deus e que se
deixassem inundar
pela crença de que ele existe e que esta
presente em todo lugar.
Lá, sentado naquele vagão, sozinho, sem
absolutamente ninguém além
dele, Edivaldo se encostou ao banco e relaxou as
pernas esticando-as
para frente. Normalmente ele não conseguiria nem
mesmo se movimentar
direito, devido ao volume de passageiros, mas
naquela noite,
misteriosamente, o vagão havia de alguma forma
sido reservado
especialmente para ele. Naquele trajeto diário,
ele conhecia todos os
detalhes dos túneis do metro. Muitas vezes ele
observou as luzes de
sinalização que havia dentro deles. Ele gostava
de olhar pela janela
grande e retangular, as luzes, os monitores que
lá havia. Suas telas
em verdes, colocadas distantes umas das outras
em espaços alternados e
calculados, por vezes lhe pareciam estar
correndo para trás, conforme
o movimento do trem. Sem pensar no que estava
prestes acontecer na
majestosa avenida que estava bem em cima de sua
cabeça, ele encostou a
cabeça no vidro e enquanto o metro seguia em
frente numa velocidade
crescente, ele passou a observar atentamente os
monitores verdes nas
paredes do túnel. Seus os olhos estavam pesados
de sono. Ele mal
conseguia mante-los abertos. As luzes deles
agora passavam por ele
numa velocidade que ele começava a achar que
estava além do normal.
Parecia que aquela visão o estava hipnotizando.
Elas foram passando
cada vez mais rápido, até que em um momento,
suas luzes se fundiram,
transformando-se em um único fio de luz
esverdeada, que não parecia
ter fim. Edivaldo foi sentindo que seu corpo já
não mais respondia à
sua mente, e mesmo sem querer, ele adormeceu.
Algum tempo depois ele acordou. Ainda meio
zonzo, sem distinguir
exatamente onde estava. De repente ele não
acreditou no que estava
vendo. O vagão em que ele estava não parecia
mais o mesmo. No lugar
dos bancos duros fixados no chão, havia
almofadas transparentes e
flutuantes, e ele estava sentado em uma delas.
No lugar das janelas
grandes e retangulares, havia painéis digitais.
Em toda a parede do
vagão havia um imenso monitor digital de
altíssima qualidade que
mostrava imagens que ele nunca havia visto em
sua vida. Como nos
pequenos monitores digitais espalhados nos
vagões do metro de que
pegava todos os dias, aquele imenso painel
digital mostrava todos os
tipos de informação. Pasmo e maravilhado com o
que via, ele se pôs a
assistir o que estava passando e aos poucos, ele
foi acreditando que
estavam passando algum filme de ficção. Nas
imagens que ele via, as
pessoas que eram mostradas usavam roupas
estranhas. Elas mais pareciam
seres de outro planeta, do que humanos. Enormes
letreiros de
publicidade faziam propaganda de um lugar que se
chamava Unidade de
Reprodução Humana do Paraíso. Sem ao menos
piscar, ele lia as palavras
e digeria as informações de uma forma tão
rápida, que ele achou que
estava sonhando. Um ser estranho que ele não
soube dizer se era homem,
ou mulher, dizia com uma face sem expressão, que
naquele dia, a
aquisição de um novo filho estava sendo
facilitada em suaves
prestações.
Que o parcelamento poderia ser feito, através
dos chips de crédito,
implantados sobre a pele daqueles seres, que ele
quase conseguia
reconhecer como sendo os humanos como ele
conhecia.
A figura que fazia a propaganda falava com sua
voz metálica e sem
expressão, que agora era possível se
personalizar o filho que fosse
adquirido sem nenhum acrescimo. Que era possível
escolher qualquer
modelo de acessório e montar um filho, do jeito
que quisesse. Imagens
de vários modelos de filhos eram mostradas. Umas
após as outras elas
desfilavam diante de seus olhos e ele estava
horrorizado com as
aparências daqueles pequenos seres. Havia
cabelos, orelhas, narizes,
bocas, ou olhos de todos os formatos. De todas
as cores. A maioria e
ao que parecia, as que mais faziam sucesso, eram
aquelas cuja pele era
prateada e que usavam roupas transparentes, o
bastante para ser ver
que não havia órgãos sexuais. Todos mais
pareciam com manequins de
loja do que seres humanos. O coração de Edivaldo
batia cada vez mais
rápido. Sua mente brilhante aos poucos foi se
ajustando à realidade em
que ele estava vivendo. Ele, de alguma forma
compreendeu que por causa
de algum distúrbio temporal ele havia se movido
entre aquilo que
chamamos de espaço-tempo e foi transportado a
uma outra época no
futuro. Seus pensamentos se desencadeavam em uma
seqüência precisa.
Era como a queda de uma infinidade de peças de
dominós, uma empurrando
a outra, na mesma direção.
Na tela agora ele via as imagens de outra
Unidade de Reprodução
Humana, mas desta vez, com o nome de Trianon.
Esta agora anunciava uma
grande liquidação de peças e sobressalentes para
as unidades humanas
dentro do prazo de validade, valendo até o
ultimo minuto do ano.
Edivaldo ao ouvir a expressão prazo de validade,
concentrou sua
atenção no que dizia a propaganda. Aquele era o
dia da grande venda de
lançamento das novas unidades Alpha PII, elas
vinham com garantia
estendida da fábrica que ficava na base marciana
de Taurus IV. Seu
prazo de validade poderia ser escolhido pelo
comprador, podendo variar
entre 15 e 30 anos, ao contrário das
ultrapassadas unidades humanas
chamadas Luna X, que tinham um único prazo de
validade de 50 anos. O
ser estranho que falava sobre a nova unidade,
argumentava que agora em
menos tempo, era possível trocar a unidade velha
por uma novíssima e
repleta de novos recursos. Estava claro para
ele, seja qual fosse o
ano em que ele se encontrava, o ser humano era
descartável. Não havia
mais amor, não havia mais apego sentimental. As
pessoas eram feitas em
linha de produção e saiam de fábrica com um
prazo de validade. Elas
não mais podiam envelhecer e aprender vivendo.
Quando eram montadas
nas Unidades de Reprodução Humana, já saiam de
lá com uma memória
pré-instalada. Eram entregues aos felizes
compradores com o conteúdo e
a capacidade intelectual que escolhessem. O
pânico foi tomando conta
de Edivaldo. Então era naquilo que o ser humano
havia se tornado.
As pessoas, agora simplesmente chamadas de
unidades, adquiriam outras
unidades com as características e os prazos de
validade que
escolhessem. Se não estivessem contentes com o
produto, bastava trocar
por um novo, enviando o indesejável para lugares
chamados de Unidades
de Desativação, que agora estavam sendo
mostradas nas imagens da tela
na parede daquele vagão do futuro. Enquanto ele
pensava no quanto a
humanidade havia perdido ao longo dos séculos,
numa das imagens
mostradas das unidades em oferta, ele pode ver
num cartaz digital ano,
data de fabricação e data de validade. Em baixo
relevo, na nuca de um
deles estava escrito:
Data de fabricação: 31/12/3008
Data de validade: 31/12/3038
Edivaldo suava gelado e um arrepio subiu pela
sua nunca fazendo-o estremecer.
Sua respiração estava cada vez mais difícil. Era
terrível tudo aquilo
que ele estava vendo, e pior era imaginar como
um homem inteligente o
faria, as terríveis conseqüências de tudo aquilo
que ele estava
presenciando.
As pessoas, as unidades, não nasciam, elas eram
fabricadas, montadas
de acordo com o desejo de outras unidades. Elas
não morriam, era
desativadas. Tudo ficou pior quando ele viu
outro ser estranho, desta
vez de pele de cor dourada, anunciando a grande
cerimônia de
desativação que iria acontecer naquela noite.
Exatamente às 0:00h do
dia 01 de janeiro de 3009, quando as unidades
fabricadas há 50 anos
seriam desativadas, tendo vencido naquele dia
seu prazo de validade,
dando lugar a outras mais modernas e mais
funcionais.
Na tela, ele pode ver as imagens da grande
desativação que ocorreu na
virada do ano anterior. Edivaldo, agora ele
sabia, boquiaberto, que
ser desativado, significava literalmente ser
desintegrado por raios
laser. A que ponto chegou a raça humana! Não
havia mais contato
físico. Ninguém mais se apegava a ninguém. Não
havia mais amor, os
sentimentos desapareceram da face da terra. A
frieza e insensibilidade
gradativamente se instalaram nas mentes e nos
corações dos homens,
desde a época de onde ele havia vindo, até
chegar àquelas aberrações,
imitações de seres humanos, chamadas de
unidades, como se fossem
simples objetos, sem alma e sem coração. Em
determinado momento ele
sentiu que o que quer que fosse aquilo em que
ele estava viajando
estava parando. O vagão do futuro parou como uma
pluma. Aquilo em que
ele estava sentado, simplesmente se deslocou em
direção a um dos
cantos que se abriu de uma forma espetacular
para Edivaldo. A parede
desapareceu em frente aos seus olhos e o assento
flutuante o levou
para fora, rumo a uma plataforma toda feita de
vidros espelhados. Ele
não conseguia enxergar nada do outro lado deles,
muito menos, uma
saída daquele lugar. O assento onde ele estava,
ao chegar em frente a
uma coluna arredondada, apenas estacionou ao
lado dela e começou a
subir, levando-o numa velocidade alucinante rumo
ao alto.
Quando ele pensou que ia ser esmagado contra o
teto de vidro que via
lá em cima, o teto abriu-se como uma escotilha,
e Edivaldo se viu em
meio a uma imensa avenida. Um cartaz digital
dizia "Estação
Consolação". Petrificado, ele compreendeu que
ele estava na Avenida
Paulista, 1000 anos à frente de seu tempo. Nada
a não ser o nome no
cartaz o lembrava das estações do Metro que ele
conhecia. Sem tocar o
chão, o assento se inclinou para a frente e o
despejou num objeto
arredondado que lembrou a Edivaldo o escudo do
Capitão América, o
super herói de quem ele tanto gostava quando
pequeno. Ao descer em
cima daquilo, ele procurou se equilibrar para
não cair para fora dele,
pois lá embaixo, não havia calçadas, não havia
asfalto. Aquela imensa
avenida tinha o chão feito de um material
brilhante e, pelo que podia
perceber, nele passava uma corrente de energia
imensa que circulava em
ambas as direções. Atônito, ele viu varias
"unidades" circulando de um
lado para o outro, em filas tão perfeitas e em
tão perfeita ordem, que
ele sem querer lembrou-se da velha pata que
tinha no quintal de sua
casa... quando saia para passear, levava uma
fila perfeita de patinhos
atrás dela. Olhando para cima, ele viu veículos
enormes que
sobrevoavam aquela avenida nas duas direções e o
incrível, era que
eles não emitiam o menor barulho. Eles podiam se
deslocar em qualquer
direção, para o lado, para cima ou para baixo
sem o perigo de se
chocarem como acontecia com os ônibus, carros e
caminhões de seu
tempo.
O objeto em cima do qual ele estava não se moveu
do lugar. Ele pôde
apreciar tudo à sua volta e não havia edifícios
como os que ele
conhecia. Eram torres imensas e pontiagudas que
em alguns casos
tocavam o teto de uma gigantesca cúpula que
protegia aquele lugar. Não
havia plantas, nem flores, muito menos animais. A
natureza já não mais
existia em todo o seu esplendor. Não havia nem
mesmo vento. Ele não
sentia sequer uma brisa. Em nenhum momento ele
viu qualquer uma
daquelas coisas chamadas de unidades se olharem
ou se tocarem. Cada um
parecia estar programado para ir e vir, para
executar isto ou aquilo,
e nada mais. Num piscar de olhos, o objeto
projetou-se para frente
subindo vertiginosamente rumo ao alto de uma das
torres de vidro
espelhado. Edivaldo imaginou que ele iria morrer
pois tudo levava a
crer que ele iria cair de cima daquele "escudo"
do Capitão América e a
altura agora, já era aterrorizante. Eles estavam
subindo em direção à
mais alta torre daquele lugar. Contudo, por
algum outro mistério
tecnológico, ele se manteve em pé e em cima
daquilo, e quando ele
percebeu, estava pousando numa plataforma de aço
inoxidável, tão
polida que parecia de uma liga feita com algum
material
extra-terrestre. Lá naquele lugar, bem na
entrada de um enorme
compartimento mal iluminado, havia uma inscrição
feita com letras
muito parecidas com as que eram usadas pelos
romanos, onde ele pode
ler: MASP. Edivaldo quase desmaiou. Seu corpo
tremia de uma forma que
ele não pôde controlar. Ele estava no mais
famoso museu da Avenida
Paulista.
Há centenas de metros acima do solo, no ultimo
andar, quase tocando o
teto da imensa cúpula que envolvia o lugar.
Pelas paredes de vidro
totalmente transparentes, ele pôde ver uma série
de urnas também de
vidro e, dentro delas, havia corpos de seres
humanos mortos séculos
atrás. Escrita em uma placa de identificação, ao
lado de cada urna
havia a descrição da raça, da época e da cultura
a que eles haviam
pertencido. Mas uma coisa o chocou mais do que
tudo que já tinha
visto. Pairando sobre a exposição de urnas,
havia um painel digital
que dizia:
Raças extintas pelas primeiras unidades
construídas.
Causa da extinção: rebeldia e sentimentalismo.
As lágrimas rolaram livremente pela face de
Edivaldo. Ele, naquele
momento, se lembrava mais do que nunca, de sua
mulher e de seu pequeno
filho de apenas 3 anos de idade. O amor que ele
sentia pela sua
família era imenso. Era algo tão maravilhoso que
ele nunca encontrou
as palavras certas para descrever o quanto a
presença deles em sua
vida lhe fazia bem. Um desespero incontrolável
tomou conta de seu ser.
Num movimento rápido e brusco , ele pulou para
fora do "escudo" do
Capitão América e saiu correndo na direção à
beira da plataforma onde
haviam pousado. Ele não sabia como voltar no
tempo. Não podia voltar
para sua época, para o seu lar, para sua
família. Sua vida não tinha
mais valor.
Ele teria que ficar naquele lugar, onde ele e
seu povo eram
considerados seres inferiores e por causa de uns
poucos que ainda
existiam, por insistirem em ser sentimentais,
tornando-se rebeldes
contra o sistema, foram exterminados pelas
primeiras "unidades", que
por uma ironia, eles mesmos construíram. Se ele
não podia mais ver,
tocar, abraçar e beijar sua esposa e seu filho,
só lhe restava uma
saida. Procurar a morte, acabar com aquele
sofrimento de uma vez por
todas, saltando de centenas de metros de altura,
na direção daquela
imensa avenida energizada, onde quando caísse
seria desintegrado tão
rápida e instantaneamente que nem mesmo iria
sentir dor. Viver sem
amor, sem o contato humano, sem sentimentos, sem
poder dar
continuidade à raça humana através do ato de
fazer amor para perpetuar
a espécie humana, era uma idéia inconcebível
para ele. Determinado a
acabar com tudo aquilo, como uma flecha ele se
atirou no ar. Durante
sua queda livre naquele lugar, ele olhou para
cima. Ele ainda estava
tão alto, que pôde ver que apesar de estar
envolvido por uma estranha
luz parecida com a do Sol, do lado de fora da
imensa redoma de vidro,
era noite. Não havia a luz da lua. Não havia
estrelas brilhando no
firmamento. Apenas uma imensa escuridão,
quebrada vez ou outra, por
meteoros que entravam na atmosfera. Caindo,
caindo, Edivaldo só
pensava que logo tudo estaria acabado, que de
alguma forma, depois de
morrer, mais cedo ou mais tarde, ele iria se
reencontrar com as
pessoas que ele mais amava na vida. Ele fechou
os olhos e se deixou
afundar no imenso vazio. Parecia que a queda
nunca iria acabar.
Durante sua queda longa, que parecia sem fim,
ele foi sentindo seus
olhos pesados. Edivaldo tentou mante-los
abertos, mas foi em vão.
Cansado, com medo, arrasado com tudo que ele viu
naquele mundo do
futuro, ele adormeceu. Em 2008, eram 23:00. Um
ônibus sai do terminal
do metro de Vila Madalena, rumo a um bairro de
periferia. Quase todos
os lugares estão tomados por pessoas que estão
indo para casa. Apenas
um estava vazio ao sair do terminal. O ultimo
banco permaneceu vazio
pela maior parte da viagem. Quando o ônibus se
aproximava do ponto
final, o cobrador olhou para o banco que até
então estava vazio, e
achou estranho ver um homem sentado nele. Ele
estava adormecido com a
cabeça encostada no vidro e só acordou, quando o
ônibus parou e o
motorista gritou que era o ponto final. Lá fora,
do outro lado da
rua, uma mulher estava no portão de sua casa,
segurando um menininho
nos braços. Quando o homem, ainda meio zonzo de
sono, levantou-se do
banco onde estava para descer do ônibus, ele
olhou pela janela e um
sorriso imenso tomou conta de sua expressão
cansada. Ele desceu as
escadas do coletivo, meio cambaleando e quando o
menino o viu, ele
gritou: Papai!
A jovem sorrindo e com lágrimas nos olhos, disse
a ele com voz emocionada:
Edivaldo! É você mesmo, querido? Eu nem acredito
que você chegou ,meu
amor! Vai ser a primeira vez em muitos anos que
vamos poder comemorar
o Ano Novo juntos! Como uma verdadeira família!
Era tudo que eu mais
queria na vida! Nunca se esqueça, meu amor, você
é mais importante
para nós do que o seu trabalho, do que tudo que
você possa comprar com
o dinheiro que você ganhar com ele. Sua
presença, ao nosso lado,
alimenta nossa alma, nosso coração. Nos enche de
alegria e satisfação!
De que nos valeria ter de tudo, ter luxo e
conforto, sem você ao nosso
lado para nos dar amor?
Sem conseguir dizer uma única palavra, tomado
por uma emoção intensa,
Edivaldo os abraçou e beijou muito por um longo
tempo. Aquela foi a
travessia de ano mais feliz de sua vida, porque
ele voltou no tempo e
no espaço, uma hora antes do que quando partiu
rumo ao futuro. Ele foi
trazido de volta por um poder que para ele só
poderia ser divino. A
mensagem que ele recebeu naquela noite, só veio
confirmar suas ideias,
de muitos anos atrás sobre nós e nosso
comportamento para com os
nossos semelhantes. Ali, ajoelhado em frente à
sua esposa e seu
pequeno filho, ele agradeceu Àquele que tudo
pode e tudo vê, por mais
uma vez ter mostrado a ele, mais uma vez, que
não estava sozinho nos
momentos mais desesperadores de sua vida. De
cabeça baixa,
humildemente, ele rogou ao todo poderoso que
fizesse com que a
humanidade compreendesse que a vida não pode
existir sem sentimentos,
muito menos, sem o amor, pois corre o risco de
um dia, num futuro
talvez até não muito distante, se transformar em
seres vazios, sem a
menor razão de existir.
Faltava agora apenas um minuto para a chegada do
ano novo. Os fogos de artifício começaram a iluminar os céus da
cidade. As pessoas saiam de
suas casas para abraçar e cumprimentar os
vizinhos e amigos. Edivaldo,
sua esposa e seu filhinho observam emocionados o
espetáculo, quando o
garotinho passa os braços em volta do pescoço
dos dois, dá um beijo no
rosto de cada um, dizendo com um sorriso enorme,
com um brilho nos
olhos de felicidade e com sua voz de anjo...
Feliz Ano Novo, papai!, Feliz Ano Novo, mamãe!
Eu amo vocês dois!
E os três juntinhos, num coro uníssono, disseram
sorrindo e ao mesmo tempo...
FELIZ 2009!
2009/1/3
Querida amiga Theresa,
Nestes primeiros dias do ano, como sempre,
procuro escrever algo relativo à passagem de
ano, de forma que meu texto leve o leitor a
refletir sobre como seria bom para todos nós, se
fizéssemos deste planeta, um mundo melhor para
se viver.
Criei o conto anexo (UMA VIAGEM AO FUTURO ...),
que ainda não levei a público e estou
enviando-lhe como prova de carinho, amizade,
respeito e admiração pelo ser humano que você é,
sabendo que compartilhamos o mesmo ideal com
relação à fé, ao amor, ao respeito mutuo entre
nós, seres humanos.
Um grande abraço!
Do amigo sincero,
José Araújo
Autor e escritor paulista
From: Jose
Araujo
Date: 2009/1/4
Subject: achei ótimo o seu conto, além de
bastante atual.
To: Theresa Catharina de Goes Campos
Querida amiga Theresa,
(...) uma pessoa tão especial como você.
Esta sua atitude, vai ser lembrada por mim, como
um momento muito especial em minha vida.
Agradeço do fundo de meu coração a atenção, o
carinho e a gentileza de sua parte ao ler e
opinar sobre meu humilde trabalho com as
palavras.
Como já lhe disse antes, (...) ainda estou
cursando a escola da vida e espero continuar a
aprender até o fim de meus dias.
É por causa de pessoas como você minha amiga
Theresa, que este mundo em que vivemos ainda
vale a pena, afinal, uma palavra, um gesto, uma
demonstração de que se é considerado pelo nosso
semelhante, vale mais do que todas as fortunas
acumuladas pelos homens.
Ter um conto meu publicado em seus sites é mais
do que especial para mim, é ter certeza de que o
que faço da forma simples e humilde que conheço,
tem valor positivo, a ponto de merecer sua
atenção e seu carinho, como tem demonstrado
sempre, minha amiga.
Um abraço do amigo sincero, que a estima, admira
e respeita de todo o coração.
Mais uma vez, obrigado!
Desejo a você uma semana repleta de luz, fé,
amor e muitas realizações
positivas, em todas as áreas de sua vida.
Fique com Deus, sempre!
José Araújo
Autor e escritor paulista
--------------------------------------------------------------------------------------
2009/1/3 Theresa
Catharina de Goes Campos
Amigo José Araújo:
Pelos e-mails anteriores, você poderá constatar
que eu achei ótimo o seu conto, além de bastante
atual.
(...)
Muito obrigada.
Feliz 2009!
Abraços cordiais de
Theresa Catharina |
|