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AS VIAGENS DO VENTO
Vento gosta de viajar sem parar.
Sozinho, seguro de si, vigoroso,
assovia, canta, desperta a lua,
convoca as estrelas, acorda o sol.
Até faz visitas sem avisar...
bate nas portas das casas,
ameaça quebrar as vidraças,
entra nas casas falando alto,
faz voar as flores nos vasos,
arranca do jardim os amores-perfeitos.
Ou vai entrando sem bater,
como se fosse dono de tudo.
Até nas igrejas históricas
o vento entra sem a menor cerimônia.
O Vento veleja, navega,
convoca as ondas, desperta
os peixes, os cavalos-marinhos,
chama as sereis pra cantar com ele.
Faz até coro com os golfinhos,
unindo sua voz às suas melodias
de comunicação, inteligentes,
sensíveis, que acompanham
seus movimentos graciosos.
Vento veleja e navega,
sem ter medo das ondas do mar.
Acho até que ele faz
coleção de búzios e conchas,
para não se esquecer do mar.
Não sei se o Vento viaja
com ajuda de mapas.
O certo é que não pára
de viajar, subir e descer
montanhas, escadarias,
vales e colinas, senhor de si.
Viaja até o Polo Norte,
segue depois até o Polo Sul.
Conhece os iglus, sorri dos
pinguins trajados a rigor.
Chega aos escaldantes desertos,
ao oásis hospitaleiro dos berberes.
O Vento atravessa também os lagos,
cruza os desfiladeiros, sem medo;
faz-se presente nos vales,
quando é de sua vontade.
Sim, porque ele me parece
ser um viajante egoísta e mimado.
Malcriado, insolente e voluntarioso.
Quase um ditador ...se a natureza
deixasse o Vento mandar em tudo.
Nas florestas e matas, o Vento
não se faz de rogado: assovia
e canta com as folhas,
os ramos e as copas
de árvores tão altas
que podem estar a desafiá-lo.
Será que o Vento também conhece
canções de ninar, ou
histórias para contar
às crianças como eu?
Se o Vento não sabe,
é porque não aprendeu...
e não aprendeu porque
ele não pára de viajar.
Que vida boa!
Se parasse um pouco
iria aprender a recitar,
com os garotos de Olinda,
a história das igrejas.
Se ao menos por alguns minutos
o Vento aceitasse parar,
nas lindas paisagens de Olinda,
aprenderia com os pequenos guias,
a repetir a história da cidade
e de seus mosteiros serenos.
Mas Vento não pára nem
para aprender, só faz passear...
Vento viaja, voa, veleja
e navega, afoito, ousado.
Viaja e viaja pra todo lugar.
Até sem bússolas, nem mapas.
Vento nem precisa de avião!
Aliás, gosta muito de empurrar
o vôo desses aviões, acompanhar
suas asas, os seus motores,
porque, penso eu, sem ter muita certeza,
que o Vento os considera seus amigos.
Deve ser também admirador
de seu colega viajante Marco Polo,
de Dom Quixote e do meu herói aviador,
o escritor francês Saint-Exupéry.
Vento só faz viajar.
Viajar e passear...
O Vento não cansa de viajar.
Nem de viajar, nem de velejar,
nem de voar, nem de navegar.
Nem de assoviar e cantar.
Nem de entrar sem cumprimentar
e sair sem dizer até logo ou adeus.
O que Vento gosta mesmo é de viajar.
E brincar de esconde-esconde.
Não aceita ordens nem limites.
É indisciplinado e teimoso.
Decide viajar e pronto! Vai!
Sem combinar com ninguém.
Que aventura, a vida do Vento!
Vento viaja, viaja, até cansar.
Acho, porém, que ele não cansa.
Pois ninguém cansa de coisa boa.
Vento vive a brincar,rodopiar e dançar.
Vento veleja, voa, navega e faz um balé
de nuvens e mais nuvens de poeira.
Sem relógio nem roteiro,
é uma aventura atrás da outra.
Nem sei por que, às vezes,
o vento parece estar zangado,
com raiva das pessoas,
que correm dele, depressa.
tentando escapar de sua fúria.
Vento vive a passear.
Sua vida é brincar, brincar.
Que vida boa o Vento leva!
Vou perguntar se posso, um dia,
quem sabe, acompanhá-lo
em suas muitas viagens.
Nem precisará me dizer
qual o destino: vou com ele,
para onde o Vento me quiser levar.
Theresa Catharina de Góes Campos
Olinda-Pernambuco, junho de 1961. |
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