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QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO?
O irregular cineasta britânico Danny Boyle dá
foro cinematográfico – de brilhante trato visual
e musical - a um argumento pífio de programa
televisivo, em Quem Quer Ser Um Milionário,
ambientado nas miseráveis favelas da Índia.
Tornou-se por isso merecedor de inúmeros prêmios
internacionais, além de oito Oscar da Academia
de Hollywood, mas que, de forma geral, vem sendo
mal recebido, com razão, pelos críticos
indianos.
Boyle (Trainspotting) nega que sua motivação
pelo argumento de
Vikas Swarup – extraído de sua novela Q & A -
tenha sido o programa de
televisão que, no Brasil, é apresentado sob o
título Show do Milhão,
já um tanto desgastado. Prefere sustentar que
foi o romantismo da
história que o comoveu a ponto de arredá-lo de
Londres para ir a
Mumbai a fim de realizar o filme, faturado sob a
chancela de cinema
independente, isto é, de baixo orçamento – US$
10 milhões –, com a
assistência da cineasta indiana Loveleen Tandan.
Mas é evidente que a estrutura do roteiro de
Simon Beaufoy se
baseia no aludido programa, cujo apresentador (Raj
Zutshi) se mostra,
como tantas figuras da televisão, alegre,
sorridente, amigo e virtuoso
diante das câmaras. Mas que, fora do domínio
delas, não passa de
brutamontes, pois que, quase ao final do
programa, ameaçado de ter de
premiar o concorrente Jamal (Dav Patel), sob a
alegação de fraude, lhe
manda aplicar, por um inspetor de polícia (Irffan
Khan), sessões de
torturas que lembram as usadas por agentes da
CIA contra terroristas,
no filme O Suspeito, de Gavin Hood.
Como se trata, entretanto, de fábula romântica -
que se
distancia muito da novela de Swarup -, na qual
tudo tem de dar certo
para agradar a Hollywood, Jamal continua, apesar
de tudo, firme no
programa, sem sinais das torturas sofridas e,
pior, sem levantar
qualquer acusação contra o seu apresentador.
Isso porque ele sabe que
as perguntas restantes a lhe serem feitas terão
respostas, como as
anteriores, sacadas de seu dia a dia de menino
de rua, morador de uma
favela que, em miséria, leva nítida vantagem
sobre a da Cidade de
Deus, explorada por Fernando Meirelles.
Por sinal, a linguagem de Boyle se assemelha à
de Meirelles, uma
vez que ambos, egressos do universo da
publicidade, são peritos no
manejo do videoclipe, cuja estética preservam em
seus trabalhos, num
tom, porém, mais chegado ao documental para
atingir um realismo de
fachada. Assim, em grande parte, o filme de
Boyle foi rodado por
câmara digital, agitada e nervosa, sob o comando
de Anthony Dod
Mantle, experiente documentarista e um dos
fotógrafos preferidos dos
cineastas dinamarqueses do Dogma 95.
É preciso destacar, entretanto, que, não há no
importante filme
de Meirelles sequências apelativas como as que
existem em profusão no
de Boyle nem tão ridículas como a que mostra os
dois garotos Jamal
(Ayushi Nahesh Kediekar) e Salim (Ashutosh Lobo
Gajiwala) a narrar, em
inglês, para complacente casal americano, uma
improvável história
sobre a construção do ponto turístico mais
famoso da Índia, o
monumento funerário Taj Mahal.
Para Boyle, um ex-seminarista sequioso por
exotismo, cenas como
essas, apelativas e ridículas, fazem parte, sim,
do cotidiano da vida
das pessoas numa cidade grande igual a Mumbai –
ou a São Paulo, Rio de
Janeiro, Nova York, Londres - , sendo
justificável, a seu ver, a
fixação delas numa narrativa cinematográfica,
como a que fez e,
afinal, funcionou, já que foram inúmeros os
prêmios por ele recebidos.
O importante é faturar!...Até mesmo oito Oscar.
Mas é evidente que
essa questão fica posta para o espectador melhor
decidir.
A ação começa com as sessões de tortura que o
inspetor de
polícia aplica em Jamal, posto sob suspeita, de
estar trapaceando para
ganhar o prêmio de 20 milhões de rúpias ao final
da versão indiana do
programa Show do Milhão. As indagações que se
formulam em relação ao
concorrente, ex-garoto de rua e morador na
favela de Dharavi, em
Mumbai, são as seguintes: 1. ele é um impostor?
2. é um gênio? 3. é
um homem de sorte? 4. ou é um predestinado?
A resposta a essas indagações será dada só ao
final da película,
pois, durante as sessões de tortura, Jamal vai
explicando ao policial
episódios de sua vida reconstituídos em
flashbacks que lhe indicam as
respostas certas para as perguntas feitas pelo
apresentador do
programa. Ao espectador atento não vai escapar,
a propósito, a rapidez
com que as personagens Jamal, sua namorada
Latika (Freida Pinto) e seu
irmão Salim (Madlun Mittal) – na novela em que
se baseia o filme Jamal
é órfão criado por um sacerdote, e não tem irmão
algum - deixam de ser
crianças e se tornam adultos, assumindo cada um
seus caminhos na vida.
O que é bom no filme é a trilha sonora de A.R.Rahman,
de
excelente trato orquestral que, muito bem usada
por Boyle, pontua sua
narrativa de forma que as incongruências do
argumento são minimizadas.
Colaboram nesse sentido também as edições de
imagem e de som de Chris
Dickens que dinamizam a linguagem do cineasta, o
qual, com sua
experiência teatral, consegue também extrair
bons desempenhos dos
atores neófitos selecionados em Mumbai. O melhor
deles, entretanto, é
Dav Patel, vindo da televisão britânica – várias
vezes premiado como
ator revelação -, que se destaca mais na cena de
dança na estação de
Mumbai, preparada para os créditos finais.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO?
SLUMDOG MILIONAIRE
Reino Unido/Índia/2008
Duração – 120 minutos
Direção – Danny Boyle
Roteiro – Simon Beaufoy com base na novela Q&A
de Vikas Swarup
Produção – Christian Colson
Fotografia – Anthony Dod Mantle
Trilha Sonora – A. R. Rahman
Edição – Chris Dickens
Elenco – Dav Patel (Jamal), Freida Pinto (Latika),
Madlun Mittal
(Salim), Irffan Khan (Inspetor de Polícia),
Ankur Vidal (Maman), Raj
Zutshi (Apresentador do Programa), Ayushi
Naheshi Kediakar (Jamal
criança), Ashutosh Lobo Gajiwala (Salim
criança), Rubiana Ali (Latika
criança). |
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