Theresa Catharina de Góes Campos

  CORRESPONDÊNCIA DE SÃO PAULO

From: Jose Araujo
Date: 2009/5/2
To: Theresa Catharina de Goes Campos


Querida amiga Theresa,

Após longo período sem dar notícias por absoluta falta de tempo pelo
fato de ter estado trabalhando sete dias por semana, envolto com as
obrigações em minha atividade principal e a escrita, preparando os
próximos lançamentos que se darão em São Paulo, Belém do Pará e na
Bienal do Rio de Janeiro, cá estou para lhe dizer que tenho sentido
muita falta de encontrá-la como antes e saber noticias suas, minha
amiga.
Saiba que jamais vou esquecer de seu apoio no lançamento do livro
Universo Paulistano e não me canso de dizer aos amigos e pessoas que
conheço que tive o prazer de conhecer você pessoalmente enquanto
trabalhávamos lado a lado em São Paulo. Digo tambem a eles, que o
mundo em geral, precisaria ter muito mais pessoas como você, minha
amiga, pois honestidade, profissionalismo e solidariedade são as suas
marcas registradas.
Hoje, minha amiga, sábado dia 02/05/2009, estou no escritório
trabalhando, e aproveitei alguns momentos mais tranquilos para ler
seus e-mails, e agradeço muito por nunca se esquecer de mim.

Como sempre, sua sensibilidade, seu talento e a sua arte de escrever
me encantam e peço a Deus que um dia eu consiga ao menos ser 10% da
escritora maravilhosa que você é.

Nosso Criador sabe o que faz e quando Ele lhe deu este dom da
escrita, não foi sem motivos, pois na minha humilde opinião, você é um
instrumento que Ele usa para nos trazer a cada dia mais esperanças de
que um dia este mundo possa mesmo ser um pouco melhor para todos nós.

Aproveito para enviar-lhe um conto que escrevi - O QUE VOCÊ QUER
SER QUANDO CRESCER ? - para o dia das mães e que também é destinado
a todos aqueles que têm a felicidade de ter a sua pessoa ao seu lado,
para que reflitam sobre alguns aspectos muito importantes, aos quais a
maioria das pessoas não dá a devida importância.

Obs.: (...) se achar que vale a pena, pode publicar e enviar a quem
você desejar, pois foi algo que escrevi com o coração aberto, após
anos de observação das vidas de muitas mães que conheço e de pessoas
que, como a minha personagem Luísa, a certa altura da vida, acabaram
por esquecer ou abdicar de seus própríos sonhos, anseios e desejos,
apenas se dedicando a atender às necessidades dos filhos e de outras
pessoas, achando que têm de se conformar com a vida que levam e que
não lhes resta mais nada, até o fim de seus dias, o que na minha
opinião, jamais deve acontecer.

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O QUE VOCÊ QUER SER QUANDO CRESCER?

Um conto para o Dia das Mães

"Não se pode deixar de sonhar. Se não tivermos sonhos, como vamos
torná-los realidade?"

José Araújo


Luísa era casada há muitos anos, tinha dois filhos, Marisa de 20 anos
e Joãozinho de apenas quatro anos de idade, que eram a alegria do
casal. Antes de se casar, ela trabalhava fora e estudava. Quando ela
se casou não foi diferente até a chegada de sua primeira filha, mas
quando ela completou seis anos de idade, Luísa resolveu parar de
trabalhar e se dedicar ao lar, ao marido e sua filha. O tempo passou,
sua vida era cuidar dos afazeres domésticos que tomavam seu dia
inteiro e ela dividia seu tempo entre eles e cuidar de Marisa enquanto
ainda era pequena. Seu marido trabalhava muito. O serviço dele exigia
um período maior de sua ausência em casa e Luísa sentia-se por vezes,
mesmo sem perceber, um tanto só e desmotivada, sentindo um vazio
enorme dentro de si, coisa que por mais que ela tentasse, não
conseguia descobrir exatamente o que causava aquela desagradável
sensação. A rotina e monotonia em que vivia, mesmo sem que ela
percebesse, a estava deixando transtornada ao longo dos anos sem ter
noção disso. Apesar de cansada, física e emocionalmente, ela jamais se
deixou esmorecer, nem transparecer o que a incomodava tão
profundamente ao ponto de não conseguir ter uma boa noite de sono.

Quando Marisa tinha 16 anos, chegou Joãozinho. Ele veio para a alegria
de todos na família. Depois que ele nasceu, Luísa teve carga dobrada
de responsabilidades e deveres a cumprir. Ela sempre foi uma mãe e uma
esposa exemplar, uma pessoa que não era capaz de colocar nenhum de
seus interesses pessoais em primeiro lugar. Tudo que ela fazia era em
prol unicamente de sua família. Assim, atendendo às necessidades de
todos, menos as dela mesma, como não poderia deixar de acontecer, com
o passar dos anos, sua desmotivação chegou a um ponto em que ela
acabou por achar, que viver aquela vida era seu destino, que ser uma
boa mãe, esposa e dona de casa era só o que ela podia fazer na vida e
nada mais. Em seus pensamentos, para ela não havia outro futuro, a não
ser terminar seus dias assim. Como ela, há milhões de pessoas neste
mundo, homens e mulheres, que acham que, a certa altura, têm que se
conformar com a vida que se leva e deixar de lado os seus sonhos, seus
anseios e suas aspirações. Perdem a noção do verdadeiro significado da
palavra sonho e vão definhando por dentro, e muitas vezes, quem está
ao lado dessas pessoas, mesmo notando diferenças de comportamentos
nelas, não têm sensibilidade para compreender o que acontece com elas.

Contudo, a vida é uma escola e muitas vezes nos surpreendemos com os
professores que ela usa para nos ensinar a viver. Numa manhã no Dia
das Mães, Luísa tinha acabado de dar banho em Joãozinho, que na época
estava com apenas quatro anos de idade. Enquanto ela o enxugava, ele
não parava de falar, enquanto fazia caretas por ela estar secando seus
cabelos. Como todas as crianças na idade dele, de vez em quando ele a
bombardeava com perguntas e muitas vezes ela era pega de surpresa pela
questão e demorava um pouco a responder. Naquele dia muito especial
ele lhe fez uma pergunta que iria mudar totalmente a sua vida. Em dado
momento, ele segurou a mão dela para que parasse de esfregar a toalha
em seus cabelos e olhando seriamente em seus olhos, ele perguntou o
que ela queria ser quando crescesse. Meio que sem prestar a devida
atenção à pergunta que ele tinha feito, Luísa imaginou que ele poderia
estar querendo brincar de algum jogo de palavras e respondeu sem
pensar, que gostaria que quando ela crescesse, pudesse ser uma mãe.
Com um olhar reprovador, Joãozinho balançou a cabeça com um ar sério e
disse que ela não podia.
Quando ela perguntou por que não poderia, ele respondeu que era porque
ela já era uma e refez a mesma pergunta de novo. Mãe, o que você quer
ser quando crescer? Pela segunda vez ela respondeu a ele, dizendo que
talvez ela pudesse ser uma esposa e uma boa dona de casa. De novo ele
disse que ela não podia ser porque já era uma. Um tanto desconcertada,
ela disse a seu pequeno filho que, sendo assim, ela não tinha a menor
idéia do que mais poderia ser. Foi então que ele colocou suas duas
mãozinhas em seus ombros, e olhando bem dentro dos olhos dela, de uma
maneira que nunca tinha feito antes, lhe disse que era simples
responder. Que a mãe deveria apenas dizer sinceramente, o que ela
queria ser quando crescesse, porque poderia ser qualquer coisa que ela
quisesse ser. Com lágrimas nos olhos, emocionada pela experiência
vivida naqueles poucos momentos, ela não conseguiu responder.
Joãozinho já estava seco e vestido quando a conversa chegou a esse
ponto e, quando viu que a mãe estava demorando muito a responder, saiu
do banheiro sem olhar para trás, dizendo que ia ver TV.

Foi uma experiência que durou no máximo 5 minutos, mas tocou no mais
fundo de seu ser e isso aconteceu por causa da maneira como ele lhe
fez a pergunta. Pela esperança que viu claramente em seu olhar de que
ela respondesse o que ele tanto queria ouvir. Parada, ainda com a
toalha úmida em suas mãos, ela refletiu sobre sua vida, sobre a
maneira como ela vivia, dedicando-se unicamente ao marido, aos filhos,
à sua casa. Aquela pergunta feita de uma maneira tão simples e tão
natural a fez enxergar que, apesar da idade, a qualquer tempo,
qualquer um de nós pode ser o que quiser. Naqueles momentos de
reflexão, causada pela pergunta feita por um garotinho de quatro anos
de idade, ela soube, do fundo de seu coração, que apesar de até então
ela ter se considerado uma mulher feliz pela vida que levava, com um
marido honesto, que a amava do jeito dele, tendo filhos lindos, com
saúde e que a amavam muito, ela tinha se esquecido dela mesma. Que,
com a dificuldade da vida, com a luta para manter a casa em ordem, os
filhos bem tratados e educados, ainda fazendo o que podia para que,
quando seu marido chegasse cansado do trabalho pudesse descansar em
paz, ela se esqueceu de sonhar, de fazer planos para o futuro.

Mas depois do que aconteceu, ela verdadeiramente passou a acreditar
que ainda era tempo para ela ser o que quisesse ser na sua vida. Nos
pequeninos olhos de seu filho ela pode ver que seu futuro não estava
resumido no que ela fazia, mesmo sendo com muito amor e carinho. Lá,
naquele brilho de olhar, enquanto ele lhe fez aquela pergunta, ela
pode ver que ainda podia sonhar e até mesmo tocar as estrelas do céu
se assim fosse o seu desejo. Luísa sentiu dentro de seu coração, que
se ela quisesse, ela poderia mesmo ser ainda, qualquer coisa que
desejasse. Uma cantora, uma atriz, uma expert em medicina nuclear, uma
trapezista de circo. Qualquer coisa que ela quisesse de verdade. Era
só querer e correr atrás da realização de seus sonhos. Finalmente,
graças a Joãozinho e sua inocência, ela descobriu que por detrás de
seu olhar carinhoso de mãe e esposa, ainda havia muitos sonhos e muita
coisa para ser na vida, além de ser a mãe, esposa e dona de casa
impecável que sempre foi.

A beleza real daqueles momentos mágicos vividos ao lado de seu filho,
seu pequeno professor, foi quando ela percebeu que ele, em toda a sua
inocência e honestidade infantil, poderia ter feito a aquela mesma
pergunta, a qualquer outra pessoa que estivesse com ele. Envolvida
pelo encantamento da descoberta de que mesmo "crescida" ela ainda
podia ser o que quisesse na vida, enquanto lágrimas da mais pura
emoção corriam livres de seus olhos, ela disse a si mesma, que a velha
mulher que um dia no futuro ela ainda ia ser, iria ser muito diferente
da mulher que ela tinha sido até então. A outra mulher, a verdadeira
Luísa, que estava apenas escondida por trás do olhar meigo e carinhoso
de uma mãe, esposa e dona de casa, que acima de tudo era um ser humano
que tinha sonhos e anseios de realização pessoal, estava apenas
começando a sair de seu esconderijo naquele momento.
Ela pegou a toalha, pendurou no suporte ao lado da pia do banheiro,
parou em frente ao espelho, sorriu e perguntou a si mesma:

E então, Luísa? O que você quer ser quando crescer?

Naquele dia das mães, apesar de ter recebido como sempre os presentes,
beijos e abraços dos filhos, do marido e dos amigos, o maior presente
que ela pode receber em toda a sua vida, foi aquela pergunta que
Joãozinho lhe fez.

Quando crescemos, muitas vezes nos deixamos levar pelas circunstâncias
da vida, de tudo que nos rodeia, sejam responsabilidades ou obrigações
e acabamos por esquecer que, quando éramos pequenos, sempre havia
alguém para nos fazer a mesma pergunta que Joãozinho fez à sua mãe. A
grosso modo, ela até nos parece uma pergunta banal, tão comum, mas na
verdade, mesmo esquecida em nossas mentes, ela está presente em nosso
subconsciente por toda a vida, à espera de que, em algum momento como
aquele em que ela viveu com seu filho, a gente acorde para a realidade
de que sempre é tempo de sonhar, de correr atrás da realização de
nossos sonhos, para que possamos alcançar nossa realização pessoal.

Ser mãe é uma coisa mais do que especial, é uma dádiva de Deus, mas
não se pode esquecer de que a qualquer tempo na vida, não importa qual
seja a nossa idade, ou quais sejam as nossas responsabilidades,
deveres ou obrigações e até mesmo sob certas circunstâncias não muito
favoráveis, ainda podemos ser, na vida, tudo aquilo que quisermos ser.

É só querer.

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Espero que sua semana seja cheia de muita luz e repleta de
realiazações em todas as àreas de sua vida.

Um grande abraço, minha amiga querida e que nossa amizade seja
eterna, pois são pessoas como você que fazem a gente crer que a
humanidade ainda não está ao todo perdida.

Obrigado pelo carinho, respeito e apoio de sempre ao meu humilde
trabalho de escritor.

Do amigo sincero de sempre,

José Araújo
Autor e escritor paulista
 

Jornalismo com ética e solidariedade.