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From: REYNALDO
FERREIRA
Date: 2009/7/5
Subject: FW: Golpe em Honduras? Que golpe?
To: Theresa Catharina Campos
ESTADÃO, INTERNACIONAL, PG.A14, 090704, Sábado.
Golpe em Honduras? Que golpe?
CHRISTIAN SCIENCE MONITOR
Octavio Sánchez*
Às vezes, o mundo todo prefere uma mentira à
verdade. A Casa Branca, a
ONU, a Organização dos Estados Americanos (OEA),
e grande parte da
mídia condenaram a deposição do presidente
hondurenho Manuel Zelaya,
no domingo, como um golpe de Estado.
Isso é um absurdo. Na realidade, o que aconteceu
aqui é simplesmente o
triunfo da lei.
Para compreender os acontecimentos recentes, é
preciso conhecer um
pouco a história constitucional de Honduras. Em
1982, meu país adotou
uma nova Constituição que permitiu nosso retorno
à democracia após
anos de governo militar. Depois de mais de uma
dezena de Constituições
anteriores, a atual, em vigor há 27 anos, é a
que mais está
resistindo.
E resiste porque responde e se adapta à mudança
das condições
políticas. Dos seus 379 artigos originais, 7
foram completa ou
parcialmente revogados, 18 foram interpretados e
121 modificados.
Ela inclui também sete artigos que não podem ser
revogados ou
emendados, pois tratam de questões cruciais para
nós. Os artigos que
não podem ser alterados incluem a forma de
governo, a extensão de
nossas fronteiras, a duração do mandato
presidencial, duas proibições
- uma com relação à reeleição dos presidentes, a
outra referente à
elegibilidade para a função presidencial -, e um
artigo que pune a
tentativa de alterar a Constituição.
Nestes 27 anos, Honduras resolveu seus problemas
ao amparo da lei.
Todos os países democráticos bem-sucedidos
viveram períodos
semelhantes de tentativa e erro até elaborar
arcabouços jurídicos que
se adaptassem à sua realidade. A França redigiu
mais de dez
constituições entre 1789 e a adoção da atual, em
1958. A Constituição
americana foi emendada 27 vezes, desde 1789.
Segundo nossa Constituição, o que aconteceu em
Honduras no domingo? Os
soldados prenderam e mandaram para fora do país
um cidadão hondurenho
que, no dia anterior, por seus próprios atos
perdera a presidência.
Estes são os fatos: no dia 26, o presidente
Zelaya emitiu um decreto
ordenando que todos os funcionários públicos
participassem da
"pesquisa de opinião sobre a convocação de uma
Assembleia Nacional
Constituinte".
Ao fazer isto, Zelaya desencadeou um dispositivo
constitucional que
automaticamente o tirou do cargo.
As assembleias constitucionais são convocadas
para a redação de novas
constituições. Quando Zelaya publicou o decreto
para dar início a uma
pesquisa de opinião sobre a possibilidade de
convocar uma assembleia
nacional, infringiu os artigos da Constituição
que não são passíveis
de alteração, relativos à proibição da reeleição
de um presidente e à
prorrogação de seu mandato. Seus atos mostraram
o seu intento.
Nossa Constituição leva a sério este intento.
Segundo o Artigo 239:
"Nenhum cidadão que já tenha ocupado o cargo de
chefe do Executivo
poderá ser presidente ou vice-presidente. Quem
violar esta lei ou
propuser sua reforma, bem como quem apoiar
direta ou indiretamente tal
violação, cessará imediatamente de desempenhar
suas funções e estará
impossibilitado de ocupar qualquer cargo público
por um período de dez
anos."
Observe-se que o artigo fala em intento e também
diz "imediatamente" -
ou "no mesmo instante", ou "sem necessidade de
abertura de processo",
ou de "impeachment".
Continuísmo - a tendência dos chefes de Estado
de estenderem seu
governo indefinidamente - tem sido a
característica fundamental da
tradição autoritária latino-americana. O
dispositivo da Constituição
que prevê uma sanção instantânea pode parecer
draconiano, mas todo
democrata latino-americano sabe a ameaça para
nossas frágeis
democracias que o continuísmo representa.
Na América Latina, os chefes de Estado
mostraram-se frequentemente
acima da lei. A sanção instantânea da lei
suprema impediu com sucesso
a possibilidade de um novo continuísmo
hondurenho. A Suprema Corte e o
ministro da Justiça ordenaram a prisão de Zelaya,
pois ele desobedeceu
a várias ordens do tribunal, obrigando-o a
obedecer à Constituição.
Foi preso e levado para a Costa Rica. Por quê? O
Congresso precisava
de tempo para reunir-se e tirá-lo da
presidência.
Com ele no país, isto teria sido impossível. A
decisão foi tomada por
123 (dos 128) membros do Congresso presentes
naquele dia.
Não acreditem no mito do golpe. Os militares
hondurenhos agiram
inteiramente dentro da Constituição. Eles nada
ganharam, senão o
respeito da nação por seus atos.
Estou extremamente orgulhoso de meus
compatriotas. Finalmente,
decidimos nos levantar e nos tornar um país de
leis, e não de homens.
A partir deste momento, aqui em Honduras,
ninguém estará acima da lei.
*Octavio Sánchez é advogado e ex-assessor do
governo hondurenho |
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