Theresa Catharina de Góes Campos

  AMANTES

Contando com a brilhante atuação de Joaquin Phoenix, Amantes, de
James Gray, concorrente à Palma de Ouro do Festival de Cannes deste
ano, é uma crônica de amor, ambientada em Nova York, aparentemente
banal, mas de natureza autobiográfica, que mostra o despreparo do
jovem americano para lidar com questões de ordem afetiva.

É verdade que o protagonista, Leonard Kraditor (Joaquin Phoenix), é sofredor de depressão bipolar com tendência suicida. Mas
Michelle (Gwyneth Paltrow), por quem ele se apaixona, é uma criatura
apenas imatura, que apela para a droga, porque, amante do advogado
Ronald Blatt (Elias Koteas), sócio do escritório em que trabalha,
casado, não sabe qual o rumo que ela poderá dar à sua vida.

Ao início do filme, Leonard se atira de uma ponte, em Brighton
Beach, no Brooklyn, tentando se afogar porque a noiva (Anne Joyce) o
deixou ao se certificar da condicionante incompatibilidade sanguínea
de ambos, para a realização do casamento, a fim de se evitar o
nascimento de crianças retardadas.

Como filho único do casal Ruth (Isabella Rossellini) e Reuben
Kraditor (Moni Moshonov), Leonard é aspirante à arte fotográfica, que
trabalha, em meio período, na lavanderia do pai, estabelecido numa das
movimentadas ruas do Brooklyn. Certo dia, ao chegar a casa, ele
conhece, no corredor do edifício, Michelle, uma nova moradora, cujo
apartamento dá de fundos para o seu.

Enquanto isso, o velho Kraditor trata com os Cohen – Michael
(Bob Ari) e Carol (Julie Budd) - de promover, como é do costume entre
famílias judaicas, uma aproximação da filha deles, Sandra (Vinessa
Shaw), com Leonard, que recebe bem a ideia e acaba gostando da moça.

Mas Michelle insiste em ter Leonard como amigo, confidente e
companheiro de festas e de boates. Leva-o até mesmo a jantar, num
restaurante famoso do centro de Manhattan, com Ronald, que, num
momento de ausência dela, lhe pede que o ajude a afastá-la das más
companhias e das drogas.

Recebido pelos Cohen como namorado oficial de Sandra, o coração
de Leonard pulsa mais forte ao receber, pelo celular, mensagem de
Michelle, que o chama, pois está desesperada ante a incerteza de que
Ronald cumprirá sua promessa de deixar a mulher e os filhos para ir
morar com ela. Entre uma, que gosta de filmes musicais, e a outra, que
vai à ópera com o amante, Leonard se vê numa situação embaraçosa.

A linguagem de Gray - premiado em Veneza por Fuga Para Odessa -
é simples, direta, mas sombria e densa, como a dos filmes europeus,
razão por que é muito admirada na França. Como contraponto, ele, que
preserva os laços familiares e sabe explorar os eventos da noite de
Nova York, usa trilha sonora de excepcional qualidade, de Libby
Umstead, rica em músicas internacionais, como as composições de Tom
Jobim, Jorge Benjor, Donizette, Verdi e até mesmo um fado, na
interpretação de Amália Rodrigues.

Como aconteceu em Caminhos Sem Volta e em Os Donos da Noite,
Gray apoia esse seu trabalho – também indicado ao César de Melhor
Filme Estrangeiro - na fotografia bem cuidada de Joaquin Baça-Asay e
na interpretação de Joaquin Phoenix, que, dessa feita, não sai de
cena. Embora a narrativa não seja de ordem subjetiva, é sob a ótica de
Leonard que os fatos são mostrados.

E Leonard lembra o Tom, de À Margem da Vida, de Tennessee
Williams, não só pela ingenuidade com que enfrenta as incertezas da
vida, o que dá sustentação ao argumento, como por sua ligação com a
mãe, Ruth. Assim, a cena em que ele se despede dela, para acompanhar
Michelle a São Francisco, é a mais bela do filme. Apenas por uma
simples troca de olhar entre Joaquin Phoenix e Isabella Rossellini,
tem-se a nítida evidência da ascendência da mãe sobre o filho. Algo
semelhante acontecia entre os dois irmãos, Bobby e Joseph, quando o
primeiro visitava o segundo, ferido, no hospital, em Os Donos da
Noite.

Vale frisar que Phoenix tem, no papel de Leonard, uma atuação,
como já ficou dito, memorável, que pode ser a última, se o ator
persistir em sua intenção de abandonar a carreira, o que é lamentável,
conforme o que ele anunciou ao concluir o filme. A fragilidade doentia
que o ator transfere para o protagonista é digna de nota. Isabella
Rossellini está igualmente irrepreensível. E Gwyneth Paltrow, Elias
Koteas, Vinessa Shaw e Moni Moshonov criam personagens também
perfeitamente ajustadas à linha imposta por Gray à sua direção.

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA

ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
AMANTES
TWO LOVERS

EUA/2008
Duração – 110 minutos
Direção – James Gray
Roteiro – James Gray e Ric Minello
Produção – James Gray, Anthony Katagas e Donna Gigliotti
Fotografia – Joaquin Baca-Asay
Música – Libby Umstead
Edição – John Axelrad

Elenco – Joaquin Phoenix (Leonard Kraditor), Gwyneth Paltrow (Michelle), Isabella Rossellini (Ruth Kraditor), Vinessa Shaw (Sandra), Moni Moshonov (Reuben Kraditor), Elias Koteas (Ronald Blatt), Bob Ari (Michael Cohen), Julie Budd (Carol Cohen)
 

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