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From: Tereza
Lúcia Halliday
Date: 2009/11/9
Subject: Para que o discurso seja um prazer
DISCURSOS DE ACADEMIA
Tereza Halliday – Artesã de Textos
Não se trata das falas pró-saúde e beleza em
academias de ginástica, mas sim, dos discursos
formais em cerimônias de posse nas academias de
letras, artes e ciências. Via de regra, são
bonitos e bem urdidos, porém longos demais.
Discursos que denotam mentes inteligentes,
erudição, cultura, verve, lirismo,
sensibilidade. Bons textos prejudicados pela
elocução extensa a causar cansaço. Com raras
exceções, os oradores nesses rituais de
acolhimento de um escritor, artista ou cientista
à “cadeira número tal”, abusam do tempo e do
conforto dos convidados. A cerimônia torna-se
contraproducente – um sacrifício social em vez
do prazer estético por ouvir um bom discurso.
Esgotado o tempo-limite em que o cérebro humano
consegue focar a atenção completa em qualquer
assunto exposto oralmente, os ouvintes passam a
divagar, coçar-se, mexer-se, querer ir ao
banheiro. E a sentir mais agudamente o excesso
de frio ou calor do recinto. No dizer delongado,
as palavras deixam de ser nutrição para o
espírito e se tornam indigestão. Discurso
dilatado, ouvinte massacrado, agüentando por
respeito e consideração.
Acadêmicos são guardiões das tradições da Casa,
mas também sabem inovar nas Letras, Artes ou
Ciências às quais se dedicam. Por que não inovar
no ritual, criando uma norma segundo a qual
nenhum orador de cerimônia de posse (e outras!)
ultrapasse 20 minutos de fala? Com três oradores
tendo a palavra, isto equivaleria, no limite
máximo, a um total de 60 minutos em estado de
escuta, por parte da platéia. O nível
intelectual e a sensibilidade dos acadêmicos
dá-lhes capacidade suficiente para falar pouco e
bem - para dizer, em 20 minutos ou menos, o que
a ocasião requer. Até mesmo o empossado, que é
obrigado a discorrer sobre o patrono da cadeira
e seus ocupantes anteriores. É só aceitarem o
desafio de dizer muito em pouco tempo.
Dignos de encômios - para usar um termo mais
“acadêmico” do que jornalístico - aqueles
oradores que já praticam a eloqüência em fala
enxuta. Retemos na memória o que ouvimos,
justamente porque conseguimos prestar atenção a
tudo, dentro de um tempo razoável de escuta.
Admiro aqueles presidentes de mesa que são
“curtos e finos” ao exercer seu direito
regulamentar da palavra - entendem que a estrela
da festa é o empossado! Os verbosos talvez não
se dêem conta de que perdem a atenção do
público, ante o desconforto dos discursos
compridos, por mais brilhantes que sejam.
Eu conto o “causo” tal qual ouvi de uma amiga,
em solenidade onde ambas nos remexíamos na
cadeira, de exaustão, pela alta soma de minutos
dos discursos que se sucediam: quando o escritor
Gilberto Freyre foi empossado numa academia de
letras, o colega designado para saudá-lo
delongava-se, sem noção de ponto final. Gilberto
implorou: “Acaba logo, Fulano, que eu já estou
com a bunda doendo”. Se um imortal, com nome em
ponte e em aeroporto, foi atacado por essa dor,
o que dizer dos pobres mortais da platéia?
(Diário de Pernambuco, 09/11/2009, p.A-11)
Tereza Lúcia Halliday, Ph.D.
Artesã de Textos
www.terezahalliday.com |
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