Theresa Catharina de Góes Campos

  From: Tereza Lúcia Halliday
Date: 2009/11/23
Subject: Artigo Quinzenal

SILÊNCIO QUE DÁ MANCHETE

Tereza Halliday – Artesã de Textos

A Primeira Dama, D. Marisa Letícia, veio ao Recife prestigiar solenidade de formatura dos alunos do Projeto Vira Vida, patrocinado pela Serviço Social da Indústria - SESI. Porque não fez discurso nem declaração, ganhou esta chamada na primeira página do DP (edição de 11/11/2009): “EM SILENCIO – Primeira Dama passa pelo Recife”.

Dizem que ela é tímida e reservada. Omitem que ela é prudente, bem mais do que o marido, que fala demais, não raro, inapropriadamente. Não sendo versada em assuntos de governo, administração pública, fato social ou político, não tendo uma formação diferenciada como D. Ruth Cardoso - que superou todas as primeiras damas em nível cultural, Marisa Letícia faz a escolha sensata de não se pronunciar. Silêncio que incomoda a mídia porque a mercadoria chamada “notícia” colhe seu tempero nas besteiras ditas por pessoas de destaque na sociedade.

Costuma-se gracejar que a esposa do atual Presidente da República não faz nada e não diz nada. A mídia adora falastrões. Caça e cata declarações que resultem numa afirmativa desastrada, ridícula, comprometedora. Escorrego de língua de político, parente de político, esportista ou celebridade do show business é vitamina para o anedotário nacional. Falas de políticos produzem excelentes cartuns. E eles acreditam no bônus “falem mal, mas falem de mim”. Escusado dizer que, numa democracia, governantes e opositores devem se pronunciar para explicar, prestar contas. E, em caso de discurso empulhador, cedo ou tarde aprendemos com quem estamos lidando.

Madrinha dos formandos dos cursos de capacitação do Projeto Vira Vida, D. Marisa presente teve o peso de um discurso não verbal. Os articuladores políticos da Presidência não metem prego sem estopa, esteja no governo que partido estiver, ou cartel de partidos. A Primeira Dama também é carta no jogo da próxima eleição presidencial. E sua presença silenciosa em cerimônia que dá visibilidade a um projeto educacional apoiado por Lula, beneficiando notadamente brasileiros pobres, é argumento implícito em prol da continuidade de seu governo.

A sabedoria popular consagrou os ditados “Falar é prata, calar é ouro” e “Em boca fechada não entra mosquito”. Segundo o humorista Millor Fernandes, se cada um de nós falasse apenas sobre assuntos que conhece bem, reinaria no mundo um grande e salutar silêncio. Em vez de fazer gozação porque D. Marisa Letícia entra calada e sai muda nas ocasiões em que aparece oficialmente em eventos, eu a vejo praticando uma forma salutar de “silêncio obsequioso” – não nascido de imposição papal, mas sim, gerado pelo bom senso. Um obséquio prestado a nós, brasileiros, quase náufragos num mar de verbosidade.
P.S. Gostaria de ver um outro silêncio dar manchete: “Acaba poluição sonora das carrocinhas de CD pirata e pregões de gás de cozinha”.
(Diário de Pernambuco, 23/11/09, p.A-9).
 

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