A
transgressora protagonista
de Alice no País das
Maravilhas, de Tim
Burton, já crescida, aos
dezenove anos, antes de
aceitar, em Oxford, na
Inglaterra da época
vitoriana, repentino pedido
de casamento, faz novo
mergulho, na Toca do Coelho,
onde estivera treze anos
atrás. Dessa vez, ela vai
extrair das profundezas do
mundo subterrâneo,
Underland, a certeza de
que o caminho que pretende
seguir na vida não é aquele
que seus pais lhe acenam.
Com base no
livro clássico da literatura
inglesa Alice in
Wonderland, de Lewis
Carrol, Linda Woolverton,
também coprodutora do filme,
criou um roteiro de
concepção teatral. Nele, o
diálogo, embora sumário,
para evitar a verbosidade
cênica, ganha realce para
facilitar não só a
compreensão da história –
que, originalmente, não tem
essa característica -, como
também a psicologia das
personagens, algumas de
traços demasiadamente
caricatos. Além disso, a
expressão visual, concebida
por Burton, talvez até por
pressão dos produtores,
remete o espectador
inevitavelmente a algumas
obras famosas de Walt
Disney, como Branca de
Neve e os Sete Anões, o
que lhe dá, como se há de
convir, tom de déjà-vu.
Mas
esses elementos contribuem,
de qualquer forma, para que
o argumento - amenizado
também nas referências aos
temas propriamente
literários, como metáforas -
flua de maneira centrada e
objetiva na busca de Alice
Kingsleigh (Mia Wasikowska)
por sua identidade. Ela é
filha de um nobre, Charles
Kingsleigh (Marton Csokas),
que, desde criança, se
entregava ao mundo da
fantasia. Quando, na cena
introdutória, ela narra ao
pai suas mirabolantes
aventuras em Underland
( onde estivera em sonho),
ele a chama de maluquinha,
observando, porém, que, como
tal, muita gente boa lhe
fazia companhia.
Ao
se iniciar a ação, Alice se
encontra numa festa,
realizada num majestoso
jardim, durante a qual, pelo
que fica sabendo, para sua
surpresa, será pedida em
casamento por Hamish (Leo
Bill), filho de um dos
sócios de seu pai. Ocorre,
porém, que, enquanto o
pedido é formalizado, Alice
se distrai ante a presença,
no local, de um enfarpelado
Coelhinho e decide
acompanhá-lo, deixando toda
a gente à sua volta
estupefata por não dar ao
seu pretendente a resposta
aguardada. Ela embarafusta
por uma abertura que existe
no tronco de uma velha e
poderosa árvore e cai num
buraco de grande
profundidade.
O
buraco vai dar num amplo e
estranho salão, onde Alice
encontra uma chave, uma
bebida para encolhê-la,
contida num pequeno frasco,
e um bolo para fazê-la
crescer novamente. Depois de
ingerir a bebida, ela
diminui de tamanho e, usando
a chave, consegue abrir e
transpor uma diminuta porta,
dando logo numa enorme área
ajardinada. Come o bolo e
volta a crescer mais do que
o necessário. E assim, ela
cruza com antigos
conhecidos: Coelho Branco
(Michael Sheen); Domouse
(Barbara Windsor); pássaro
Dordo (Michael Gough); e
Tweedles – Tweedledee e
Tweedledum - (Matt Lucas).
Mas a confusão entre eles se
estabelece, pois muitos
crêem não ser ela a “Alice”
verdadeira: - Sou eu
mesma!... O meu nome é Alice
e este sonho é meu! –
ela afirma.
Após
muitas tentativas de
esclarecer a dúvida para
provar sua identidade, Alice
vai parar na corte da tirana
Rainha Vermelha (Helena
Bonham Carter), onde os
Tweedles estão presos e, lá,
ela conhece outras figuras,
como o Chapeleiro Louco
(John Depp), afastado de
suas funções e relegado ao
ostracismo. Logo Alice irá
dar também no castelo em que
se encontra a meiga Rainha
Branca (Anne Hathaway) –
alusão a Mary Stuart -, que
ali está presa por
determinação de sua irmã,
Rainha Vermelha –
representação da Rainha
Elisabeth -, temerosa de que
ela lhe arrebate o trono: -
Eu prefiro ser temida a
ser amada! – declara. E
não vai demorar muito para
Alice se convencer também de
que ela deve assumir, como
nova Donzela de Orleans, uma
posição diante do momento
político por que passa
Underland...
Como
aconteceu no surgimento do
cinemascope, o espaço
dramático em 3D, de
profundidade no campo
visual, precisa, penso eu,
ser ainda delimitado. Em
filmes de narrativa mais
dinâmica, como esse de
Burton, os espaços vazios
são dissimulados pela
sucessão de planos
panorâmicos e pela intensa
movimentação das
personagens. Em narração,
porém, de ordem intimista,
mais lenta, de planos
fechados, a profundidade do
campo visual poderá levar
vários realizadores, ao que
suponho, ao malogro total,
como aconteceu, por sinal,
na década de cinqüenta,
quando o 3D não prosperou. É
esperar para ver!...
Burton parece
consciente disso. Tanto
assim que já lançou
advertência, pelos meios de
comunicação, de que nem todo
filme em 3D pode ter
qualidade. Nesse seu
trabalho, convertido, contra
sua vontade, para 3D depois
de rodado, problemas que, em
consequência, surgiram em
algumas cenas, se tornam
visíveis. E afetam
principalmente a
movimentação dos atores em
cena, que já atuam, nesse
tipo de película de
animação, como autômatos.
Mas alguns deles, mesmo
assim, se destacam como John
Depp, Mia Wasikowska e Anne
Hathaway. Além disso, é
excelente a trilha sonora
concebida por Danny Elfman,
responsável também pela
música original. E a
fotografia de Dariusz Wolski
ajuda, sem dúvida, a
concretizar, apesar das
restrições apontadas, a
beleza do espetáculo.
REYNALDO
DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA TÉCNICA
ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS
ALICE IN WONDERLAND
EUA / 2010
Duração – 108 minutos
Direção – Tim Burton
Roteiro – Linda Woolverton
com base no livro Alice
in Wonderland, de Lewis
Carrol.
Produção – Richard D. Zanuck,
Jennifer Todd, Chris
Lebenson, Linda Woolverton
Fotografia – Dariusz Wolski
Trilha Sonora – Danny Elfman
Edição – Chris Lebenson
Elenco –
Mia Wasikowska (Alice), John
Depp (Chapeleiro Louco),
Helena Bonham Carter (Rainha
Vermelha), Anne Hathaway
(Rainha Branca), Crispin
Glover (Stayne), Matt Lucas
(Tweedledee/ Tweedledum),
Stephen Fry (Gato Ceshire –
voz), Michael Sheen (Coelho
Branco), Barbara Windsor (Dormouse
– voz).