Theresa Catharina de Góes Campos

 
De: Tereza Halliday
Data: 19 de julho de 2010 08:41
Assunto: "Não importa quanto tempo teremos..."


 

Compartilhando meu artigo quinzenal, desta segunda-feira 19/7/2010. T.

   

AMPARO AOS CAMINHANTES

 

Tereza Halliday – Artesã de Textos

 

Quis o Destino que seu nome completo tivesse quatro palavras fortes: Maria do Amparo Rocha Caridade. E que sua apresentação do eu na vida quotidiana – Amparo Caridade - significasse “esteio, amor”. Quis o Destino que seu caminho de ação e ajuda por este mundo fosse encurtado por um câncer. “Caminhos haverá sempre”, escreveu ela. “E, por eles, caminhantes incansáveis cuidarão da Vida”. Amparo cuidou da vida incansavelmente.

 

 No início deste século, nem nos conhecíamos. Apenas nos líamos mutuamente no Diário de Pernambuco. Seus artigos quinzenais nesta página eram tão apreciados lá em casa, que meu marido costumava perguntar: “Já leu Amparo hoje?” Quando os textos passaram a ser menos frequentes, o refrão mudou: “Hoje tem Amparo!”, eu anunciava, animada pela aparição benfazeja.

 

 Um dia, resolvemos nos encontrar face a face, depois de tantos encontros de alma em nossos escritos no jornal. Marcamos um almoço. Ela veio com pontualidade britânica, o que já me cativou. Salada pra cá, sobremesa pra lá, foi bem-querer à primeira vista. Passamos a almoçar juntas, ritualisticamente, duas vezes por ano - privilégio ter um cantinho em sua agenda. Certa vez, perguntei: “Você é religiosa?”. Respondeu: “Sou. Não sou é igrejosa”. Mais uma afinidade entre nós. No último encontro (a gente nunca sabe que vai ser o último), presenteou-me com uma caixa multicor, pintada a mão, semelhante às cores que ela espargia por onde passava.

 

  Publicou Sexualidade, Corpo e Metáfora (Iglu Editora) e Construindo o Bem Estar (pesquisa, Ed.Unicap). Em todos os seus escritos, a marca de uma pessoa profundamente engajada com o cuidado humano – como filha, esposa-companheira, mãe, sogra, amiga, psicóloga, professora, psicoterapeuta, cidadã e avó. Este mais recente status, ela abraçou como a maior curtição da maturidade. Mulher madura que não perdeu a alma de menina.

 

Convidou-me para fazer a apresentação oral do seu último livro - Caminhos e Caminhantes (Ed. Bagaço) -  em duas noites de lançamento. Nos textos curtos, diretos dessa coletânea, ela nos convoca a cumprir o dever de melhorar a nós mesmos e tornar mais digna a convivência humana. Eis algumas ponderações de Amparo a todos nós, caminhantes: “Existimos na dor e na alegria e só crescemos sem negá-las...Alegrar-se com a alegria do outro requer muita generosidade...Nos fragmentos do cotidiano podem estar contidos preciosos retalhos de vida que não temos o direito de desperdiçar... Cada um negocia como pode sua angústia e seu prazer... Cada um procure a felicidade que carrega em si. Esta é verdadeira...O essencial tem uma fundura própria que só se alcança numa proximidade muito especial com o próprio eu. Isso se consegue na solidão. Na bendita solidão... É hora de perguntar-nos o que estamos fazendo com a vida que temos nas mãos... Não importa quanto tempo teremos, importa torná-lo precioso”. O.K., menina.

(Publicado no Diário de Pernambuco,

           19/07/2010, p.A-11)


Tereza Lúcia Halliday, Ph.D.
Artesã de Textos
 

Jornalismo com ética e solidariedade.