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De: Tereza Lúcia Halliday
Data: 16 de agosto de 2010 07:32
Assunto: Advertência Bíblica
CUIDADO COM AS HIPÉRBOLES!
Tereza Halliday
– Artesã de Textos
Recebi por e-mail coletivo convite para o
lançamento de um livro. Visceralmente
deslumbrado com a obra lançada, o divulgador
achou por bem alegar que a autora é “uma das
maiores escritoras brasileiras de todos os
tempos”. Sim, ela tem excelente currículo e
goza de respeitabilidade no mundo da Literatura.
Por isto mesmo, dispensa hipérboles. Hipérbole é
aquela figura de linguagem que “engrandece ou
diminui exageradamente a verdade das coisas”.
Como suporte de argumento, a hipérbole é
recurso arriscado em qualquer mensagem
persuasiva, inclusive e-mails tentando convencer
os convidados a comparecerem a um evento. Se
laços muito antigos de afeto e admiração não me
ligassem à autora, eu não teria comparecido,
pois sou avessa à tática de sedução verbal do
bem-intencionado divulgador. Minha formação
acadêmica pôs-me um filtro contra assertivas
hiperbólicas. Aprendi a evitar até mesmo o
chavão dos relatórios de pesquisa: tal resultado
foi “bastante significativo”. Quão significativo
é “bastante significativo”?
Não creio que possamos dizer de escritor algum
que ele seja um dos maiores de todos os tempos,
ainda que apenas no seu país. Até um crítico
literário profissional seria cuidadoso nesse
terreno de avaliações. Como, na visão limitada
de nossa contemporaneidade, classificar o grau
de grandeza dos escritores? Nem mesmo as
continuadas re-edições das obras de Shakespeare,
Cervantes, Balzac, Tolstoi, Goethe, Machado,
Lispector, autorizam a dizer de cada um deles “é
um dos maiores de todos os tempos”. Como aferir
isto? Dos nomes ditos imortais, em qualquer
literatura, pode-se comentar: “é um dos grandes
escritores do seu tempo”, ou da língua na qual
escreveu. Mas, de todos os tempos? Quem saberá?
A expressão “um dos maiores de todos os tempos”
lembra anúncio de espetáculo de circo, ou
argumento de vendedor de ervas medicinais no
pátio do mercado, buscando mesmerizar os lesos.
Não obstante, os destinatários do e-mail
divulgando o lançamento do livro eram pessoas de
alto nível de formação escolar e discernimento.
E a escritora anunciada não precisa desse tipo
de lisonja para atrair numerosos admiradores à
fila de autógrafos. Na sua simplicidade e
modéstia, deve ter dado uma boa risada com a
hipérbole.
Francisco Gomes de Matos, Lingüista da Paz,
exorta à comunicação positiva: criticar sem
esculachar, elogiar sem afetação. Dizer bem de
alguém dispensa hipérboles, pois são passíveis
de levantar dúvidas sobre a perfeição do
elogiado ou a sinceridade do lisonjeador. Por
essa disfunção antiquíssima dos “acendedores de
incenso”, a Bíblia já adverte: “Comer mel em
demasia não é bom: use de moderação nas palavras
elogiosas” (Provérbios, 25, 27). Dica
atualíssima no século 21, para redatores de
mensagens que visem construir percepções sobre
temas, produtos ou pessoas. Além disso, em
tempos de propaganda eleitoral, é preciso
cuidado redobrado com as hipérboles perpetradas
por marqueteiros.
(Diário de Pernambuco,
16/08/2010, p.A-7)
Tereza
Lúcia Halliday, Ph.D.
Artesã de
Textos
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