A
MENTIRA DOS
CONVITES DE
CASAMENTO
Tereza Halliday
– Artesã de
Textos
Os noivos
costumam iniciar
com uma mentira
sua vida a dois
perante a
sociedade: a
hora indicada no
texto do convite
de casamento é
fictícia, um
embuste, não
quer dizer nada.
Ou melhor, quer
dizer que os
convidados vão
tomar abundante
chá de cadeira,
pseudo-consolados
por uma bela
trilha sonora em
desmesurados
decibéis.
Na espera
excessiva,
cansam as costas
e o bumbum,
prendem a
vontade de fazer
xixi (imagine as
grávidas e os
idosos!), ficam
com cara de
penitentes,
olham os
relógios,
suspiram, se
abanam e se
coçam,
esperando,
esperando,
esperando pelo
cortejo nupcial.
Até que enfim a
noiva aparece,
na falsa glória
de fazer-se
esperar e ser
esperada. E nós,
figurantes do
espetáculo,
massacrados na
longuíssima
espera,
desempenhamos o
papel de
embevecidos.
Apesar de
tratarem os
convidados a
pão-de-ló no
buffet
sensacional, os
convidantes
primeiro os
maltratam com a
falta de
pontualidade no
começo da
cerimônia. Mais
de 60 minutos de
atraso tem sido
a praxe. Às
vezes, chega a
duas horas.
Alega-se que, se
a noiva aparecer
na hora, os
convidados todos
ainda não
estarão lá. É
que eles
passaram a
retardar a
própria chegada
a fim de escapar
do grande
desconforto da
inditosa espera.
Aprenderam que a
hora escrita no
convite é de
mentirinha.
Outra desculpa
são os
imprevistos dos
preparativos:
vestido, cabelo,
maquilagem,
fotos... Para
uma festa tão
importante,
imprevistos
devem ser
previstos e os
preparativos
precisam começar
com muita, muita
antecedência a
fim de honrar a
hora prometida
no convite.
Acidentes e
transtornos
acontecem: o
noivo teve uma
dor de barriga,
a noiva torceu o
tornozelo, o
carro quebrou no
caminho. Mas são
raras
ocorrências que
deveriam tornar
os atrasos uma
raridade. O
atraso
sistemático,
incorporado ao
ritual do
casamento como
um hábito, é
impiedoso para
os convidados,
ligados aos
noivos e/ou seus
pais por laços
de afeto ou
trabalho, além
de terem ajudado
a montar a casa,
participando da
famosa Lista de
Casamento.
Quanta
desconsideração
nesse costume de
atrasar-se!
Ouvi dizer que
os organizadores
da festa chegam
a encorajar a
noiva a
retardar-se a
fim de que sua
aparição cause
mais impacto.
Estão
equivocados.
Quando ela
chega, o enfado,
a irritação
dissimulada e a
exaustão já
tomaram conta
dos convivas. O
impacto fica
xoxo. Os experts
do cerimonial
poderiam exercer
sua influência e
fazer escola,
inovando na
etiqueta:
casamento é para
começar na hora.
A criação de uma
cultura da
pontualidade e a
boa gerência dos
preparativos
para honrar o
horário
estabelecido,
honrariam a
todos os
envolvidos no
evento.
Exorto os noivos
de sensibilidade
a refletir sobre
essa mentira dos
convites de
casamento e
decidir se
querem realmente
faltar com a
palavra e com o
respeito aos
convidados, ou
inovar e passar
à História como
“o casamento que
começou na
hora”, com o
alívio encantado
e agradecido de
todos os
presentes. Daí,
se a moda pegar,
o mundo social
ficará muito
melhor.
(Diário de
Pernambuco,
27/9/2010,
p.A-11).
Tereza Lúcia Halliday, Ph.D.
Artesã de Textos
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