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De: Tereza
Lúcia Halliday
Data: 6 de dezembro de 2010 08:06
Assunto: Espaços de viver
VIAGEM À CASA COR
Tereza Halliday – Artesã de Textos
A Casa Cor 2010 instalou-se a dois quilômetros
de onde moro. Em vez de me emperiquitar e
entregar o carro ao manobrista, atrapalhando o
trânsito, resolvi incluir a visita na minha
rotina de caminhada. Os 25 reais do ingresso me
abriram as portas ao show anual de criatividade
no uso de espaços. De tênis, bermuda e camiseta,
percorri três andares do bom e do melhor em
ambientes e mobiliário.
Resolvi testar todas as cadeiras expostas – para
sala de estar, mesa de jantar, computador,
quartos, pátio. Além de dar gosto de olhar
também dariam gosto de sentar? O criativo
criador havia sido sensível o bastante para
casar perfeitamente forma e função? Este, o
grande desafio à genialidade de arquitetos e
ambientadores. Algumas cadeiras foram aprovadas
com nota 10. Outras tinham assento e/ou encosto
impróprios para o corpo humano. Umas eram
destinadas apenas a pessoas altas, outras
mereciam apenas estar na vitrine como peça de
museu. Só serviam para os olhos. E não eram
cadeiras antigas.
O atendimento estava impecável. Não poupei
perguntas, como dona de casa calejada: esta
linda mesa de jantar com tampo áspero, arrumada
com belo jogo americano: e se cair molho ou
vinho nela? Juraram que é fácil de limpar. E
esta cozinha espetacular, aço inoxidável
tinindo, seria à prova de diarista? Tenho uma
tábua de sanitário, de acrílico, arranhada pelo
Bombril de uma faxineira zelosa. E este
magnífico material enrugado revestindo a parede,
não seria também um celeiro de poeira e ácaros?
E esta pia baixíssima, não vai respingar água
quando lavarmos rosto ou mãos ? Não era pia para
cadeirante, era para usá-la de pé mesmo,
encurvados e espalhando água . Não preciso
perguntar a função de uma rosa. Basta ela ser
bela. Contudo, em móveis e utensílios de um
espaço de viver, a beleza é necessária mas não é
suficiente.
Entre livros de arte e peças de decoração novas
e antigas, instante de encantamento: uma trena
de couro, prudentemente amarrada, para não
sumir, igual à que meu pai usava ao medir
terrenos, entregando-me, em seguida, o estojo
redondo para rebobiná-la, usando a minúscula
manivela de metal. Uma viagem ao passado para a
menina que desenhava plantas de casa, perninhas
balançando, encarapitada num altíssimo banco de
prancheta, imitando o pai. Uma viagem ao futuro
para a adulta curiosa e desconfiada, na
contemplação do aqui e agora da bela Casa Cor.
(Diário de Pernambuco, 6/12/2010, p.A-11).
Tereza Lúcia Halliday, Ph.D.
Artesã de Textos
www.terezahalliday.com |
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