Passamos todos os anos das nossas vidas fazendo o que os outros gostariam que fizéssemos: pais, professores, chefes, colegas, amigos, namorados, cônjuges, filhos, demais parentes e até meros conhecidos. Muitos dos desejos deles foram e têm sido para nosso benefício, ou o legítimo bem-estar deles, ou “o bem de todos e felicidade geral da nação”. Também passamos a vida inteira fazendo o que os outros nos disseram para fazer: médicos, consultores, Governo. E continuamos fazendo, ora por bom senso, ora por obrigação.
Por isto, não quero assumir mais nenhum compromisso que minha alma não esteja a fim. Por exemplo, comparecer a isto e aquilo. Porque, se assumir, cumpro. E não quero mais cumprir além do que for absolutamente mandatório. Suportar atraso de noiva e excesso de decibéis em cerimonias de casamento e outras festas, participar de almoços semanais ou reuniões mensais, por mais gratificantes que sejam; comparecer regularmente a serviço religioso, por mais edificante que seja, ir a festas de aniversário e lançamentos de livros, por mais queridos que sejam os aniversariantes e autores; doar meu tempo a causas e tarefas. Somente o farei se e quando minha alma concordar.
Tenho prestado pouca atenção àquela que vive comigo todas as horas, todos os dias: minha alma. Forço a barra, em muitas ocasiões em que ela preferiria outra coisa. E vou, faço, participo, aceito – para ser gentil, seguir costumes, preencher expectativas. Doravante, quero mostrar-lhe que ela é tão importante quanto todos os outros pelos quais eu a preteri tantas vezes. Estarei atenta ao conforto de minha alma, que tem me suportado e sustentado todos esses anos. Claro que há compromissos intrínsecos ao viver que terei de cumprir, mesmo à revelia do seu bem estar. Por isso mesmo, em outras circunstâncias, escutarei bem direitinho o que é mesmo que minha alma quer, do fundo dela mesma, lá onde não há etiqueta, nem motivos de força maior exterior.
Assim, vocês me verão em certos lugares e em outros não, sem significar desprestígio ou falta de consideração a pessoas a cujos eventos não compareci. Simplesmente, farei do jeito da minha alma, naquele dia, naquela hora. Já não há muito tempo para dar prioridade a ela, que tanto me atura e tanto me apoia.
Estar em paz com a própria consciência é algo aprendido cedo, com os valores internalizados desde criança. Estar em paz com a própria alma é mais sutil, tem a ver com a parceria profunda entre ela e nós, até que a morte nos separe. Enquanto isto não acontece, demos a ela mais gostos na vida!
(Diário de Pernambuco, 23/5/2011, p.A-11)
Tereza Lúcia Halliday, Ph.D.
Artesã de Textos