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Reflexões Homiléticas para Novembro de 2011Pe.
Tomaz Hughes, SVDE-mail:
thughes@netpar.com.br
FESTA DE TODOS OS SANTOS (06.11.11)Mt 5,
1-12a“Fiquem alegres e contentes, porque será
grande para vocês a recompensa nos céus” Esses
primeiros versículos de Cap. 5 servem ao mesmo
tempo como introdução e resumo do Sermão da
Montanha. Nos apresentam um retrato das
qualidades do verdadeiro discípulo, daquele que,
no seguimento de Jesus, procura viver os valores
do Reino de Deus. Basta uma leitura superficial
para ver que a proposta de Jesus está na
contramão da proposta da sociedade vigente -
tanto a do tempo de Jesus, como de hoje. Embora
de uma forma menos contundente do que Lucas (Lc
6, 20-26), o texto de Mateus deixa claro que o
seguimento de Jesus exige uma mudança radical na
nossa maneira de pensar e viver.Enquanto os Dez
Mandamentos proclamam os deveres da humanidade
em relação aos direitos de Deus (oito proibições
e duas obrigação a serem observados pelo povo),
as bem-aventuranças proclamam os direitos da
humanidade em relação aos deveres de Deus... e é
Ele que estabelece para nós o direito ao Reino
dos Céus, dom gratuito d’Ele, no consolo, na
misericórdia, na justiça e na contemplação da
face d’Ele.Isso não nos garante vida sem
sofrimento; mas, nos dá um olhar diferente,
capaz de perceber o futuro, já sendo construído,
e experimentar em nossa vida cotidiana a graça
que garante a fidelidade generosa. Nada é
proibido neste texto, mas Deus mesmo assume
compromisso com a humanidade. O Sermão da
Montanha não pode ser visto fora do contexto do
Reino. Hoje, sabemos que o Sermão da Montanha,
que Mateus apresenta como o primeiro dos seus
cinco discursos, é uma composição de muitos
dizeres de Jesus. Mateus os teceu juntos em um
texto coerente. Temos que imaginar cada um
desses dizeres como resumo de algo como uma
discussão, ou sermão, ou algum ensinamento
importante, que talvez fosse resposta a uma
pergunta feita. Esses ditados isolados foram
primeiro reunidos dentro do Sermão da Planície
na tradição oral. Disso, por sua vez, o Sermão
da Planície de Lucas, e o Sermão da Montanha de
Mateus se desenvolveram. Chama-se o Sermão da
Montanha porque Jesus proclamou a mensagem e as
normas da Nova Aliança de um local elevado. Como
Moisés, que, de uma montanha proclamou os dez
mandamentos que formaram a base do Antigo
Testamento, agora Jesus proclama os mandamentos
que construirão os alicerces da Nova Aliança.
Lucas tem o Sermão da Planície, que parece ser
uma versão anterior do Sermão das Montanha. É
mais resumido e difere de uma maneira
significante da versão de Mateus. Um primeiro
elemento que chama a atenção no texto de hoje é
o fato de que a primeira e a última
bem-aventurança estão com o verbo no presente -
o Reino já é dos pobres em espírito e dos
perseguidos por causa da justiça - na verdade as
mesmas pessoas, pois os que buscam a justiça são
“pobres em espírito”. Eles já vivem a
dependência total de Deus, pois só com Ele esses
valores podem vigorar. Mas, quem luta pela
justiça será perseguido - e quem não se empenha
nessa luta jamais poderá ser “pobre em
espírito”. As outras bem-aventuranças traçam as
características de quem é pobre em espírito. É
aflito, por causa das injustiças e do sofrimento
dos outros, causados por uma sociedade
materialista e consumista. É manso, não no
sentido de passividade, mas porque não é movido
pelo ódio e violência que marcam a ganância e a
truculência dos que dominam, “amansando” os
pobres e fracos. Encarna o paradoxo da força
transformadora da não violência, tão bem
vivenciado por pessoas tão diferentes como Jesus
de Nazaré, Gautama Buddha, Francisco de Assis,
Mahatma Ghandi, Martin Luther King, Dom Helder
Câmara e Dom Oscar Romero, entre outros -
pessoas que tiveram uma influência determinante
sobre o mundo, enquanto os violentos passam
esquecidos ou escoriados nas pegadas da
história. Têm fome da justiça do Reino, não a
dos homens, que tantas vezes não passa de uma
legitimação oficial da exploração e do
privilégio, uma desordem institucionalizada,
como tantas vezes presenciamos no Brasil. Possui
coração compassivo, como o próprio Pai do Céu, e
é “puro de coração”, sem ídolos e falsos
valores. Promove a paz, não “a paz que o mundo
dá” (Jo 14, 27), mas o “shalom”, a paz que nasce
do projeto de Deus, quando existe a justiça do
Reino. O “Shalom” existe quando há o bem-estar
total para todos/as. Mas, Jesus deixa clara a
consequência de assumir esse projeto de vida - a
perseguição! Pois um sistema baseado em valores
anti-evangélicos não pode aguentar quem a
contesta e questiona, algo que a história dos
mártires do nosso continente testemunha muito
bem. Qualquer Igreja cristã que é bem aceita e
elogiada pelo sistema hegemônico precisa se
questionar sobre a sua fidelidade à vivência das
bem-aventuranças do Sermão da Montanha. O
martírio (testemunho) é pedra-de-toque dessa
fidelidade. Podemos agradecer a Deus pelo
testemunho profético das bem-aventuranças que
nos foi dado, por exemplo, pela Irmã Dorothy
Stang pelo Bispo Frei Luiz Cappio, bem como o
das vidas de tantos Santos e Santas que nunca
vão receber a honra dos altares, mas que são
consagrados como tais na memória de nosso povo.
TRIGÉSIMO TERCEIRO DOMINGO COMUM (13.11.11)
Mateus 25, 14-30“Muito bem, empregado bom e
fiel” O Evangelho de hoje situa-se no quinto e
último grande discurso do Evangelho de Mateus -
o Discurso Escatológico, ou aquele que trata do
fim último das coisas. O tema básico do discurso
é a vigilância, ilustrada pela leitura dos
sinais dos tempos (24, 1-44), a parábola do
empregado responsável (24, 45-51), a das virgens
prudentes e imprudentes (25, 1-13), e que vai
terminar no próximo domingo, Festa de Cristo
Rei, com o texto sobre o Juízo Final (25,
31-46). O texto de hoje versa sobre os
empregados e os talentos - no tempo de Jesus um
talento era uma soma considerável de dinheiro, e
hoje, no contexto da parábola, pode ser
interpretado em termos de dons recebidos de
Deus. O trecho demonstra que o importante é
arriscar-se e lançar-se à ação em prol do
crescimento do Reino de Deus, para que os dons
que recebemos de Deus possam crescer e se
frutificar (de forma alguma se deve interpretar
o texto ao pé-da-letra, como se ela tratasse de
investimentos e lucros financeiros, pois ele é
uma parábola, que é uma comparação que usa
imagens e símbolos conhecidos). Jesus confiou à
comunidade cristã a revelação dos segredos do
Reino e a revelação de Deus como o “Abbá”, ou
querido Pai. Esse dom é um privilégio, mas
também um desafio e uma responsabilidade. Nem a
comunidade cristã, nem o cristão individual
podem guardar para si essa riqueza. Embora
carreguemos “esse tesouro em vasos de barro”
(2Cor 4, 7), como disse São Paulo, temos que
partir para a missão, para que o maior número
possível chegue a essa experiência de Deus e do
Reino. Não é suficiente que estejamos preparados
para o encontro com o Senhor (mensagem do texto
anterior a este, o das virgens) - o outro lado
da medalha é a atividade missionária, que faz
com que o Reino de Deus cresça, mediante o
testemunho da nossa prática da justiça!
FESTA DE JESUS CRISTO REI DO UNIVERSO
(20.11.11)Mateus 25, 31-46“Quando fizeram isso a
um dos menores dos meus irmãos, foi a mim” Hoje
encerramos as celebrações dominicais do ano
litúrgico com a festa de Cristo Rei. O evangelho
de hoje é o famoso texto de Mateus 25 sobre o
Juízo Final. Nesse texto, enfatiza-se a sorte
eterna dos que optaram ou não pela vivência da
“justiça do Reino dos Céus”. O primeiro discurso
do Evangelho - o Sermão da Montanha - enfatizou
que quem vivesse essa justiça seria perseguido
(5, 12); o segundo discurso, o Missionário,
insistiu que os discípulos não deveriam ter medo
diante dessas perseguições, sofrimentos e
rejeição (10, 23.28.31); o terceiro - as
parábolas do Reino - ensinou a paciência e
perseverança diante do lento crescimento do
Reino e da fraqueza da comunidade (13); o quarto
- o Discurso Eclesiológico, ou da Comunidade da
Igreja - traçou as características da comunidade
dos que procuram essa justiça. Agora, o último
discurso - o Escatológico, ou do fim último das
coisas - mostra que a vivência dessa justiça
será o critério de Deus para o julgamento final.
Ilustra-se, de uma maneira viva, o sentido da
frase lapidar do Sermão da Montanha: “Se a
justiça de vocês não for superior à dos doutores
da lei e dos fariseus, não entrarão no Reino do
Céu” (5, 20). Jesus - o Rei - não pergunta sobre
o cumprimento das leis de ritual e de pureza,
tão caras aos doutores da lei e fariseus, mas
sobre a prática da justiça do Reino, diante do
sofrimento de tanta gente - famintos, sedentos,
migrantes, esfarrapados, doentes e presos. A
prática de solidariedade com os oprimidos é a
única prova de uma verdadeira fé em Jesus, e do
seguimento fiel d’Ele. Esse texto não pode
deixar de nos questionar, vivendo como estamos
em uma sociedade cada vez mais excludente.
Celebramos hoje Jesus como “Rei do Universo”.
Mas, Ele se torna rei da nossa vida somente na
medida em que fazemos essa opção real pelos
oprimidos, e vivenciamos “a justiça do Reino do
Céu”, tema central do Evangelho de Mateus. Em um
mundo que nos apresenta tantas outras opções
“régias” - ou seja, opções que regem a nossa
vida e manifestam o que são os nossos valores
últimos, o texto nos leva a verificar se
realmente Jesus é o Rei da nossa vida - se é o
Evangelho d’Ele que nos rege, ou se o título não
passa de mais um dos rótulos vazios, sem
consequências práticas, tão queridos dos arautos
de uma religião intimista, sentimentalista e
individualista, tão em voga nos nossos tempos.
Será que a utopia do Reino de Deus, o seguimento
de Jesus até a Cruz, a prática da Justiça do
Reino são os elementos que norteiam as nossas
práticas, individuais e comunitárias? Se não,
então Jesus Cristo ainda não se tornou Rei do
nosso universo pessoal e eclesial. É o
questionamento do texto de hoje, que nos lembra
que Jesus não é Rei conforme os padrões deste
mundo, mas o Rei pobre e justo, tão esperado
pelos oprimidos de todos os tempos. A proposta
d’Ele para a sociedade não é a confirmação de
uma estrutura piramidal, conforme os modelos
históricos, mas a sua mudança radical para que o
mundo seja regido por princípios de
solidariedade e justiça, de partilha e
fraternidade. Ele é Rei, no sentido da esperança
dos “pobres de Javé” do Antigo Testamento, tão
bem retratada pelo profeta Segundo Zacarias: “O
seu Rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é
pobre, vem montado num jumento, num jumentinho,
filho de uma jumenta. Ele destruirá os carros de
guerra de Efraim e os cavalos de Jerusalém,
quebrará o arco de guerra. Anunciará paz a todas
as nações, e o seu domínio irá de mar ao mar, do
Rio Eufrates até os confins da terra” (Zc 9,
9s). Jesus será o nosso rei na medida em que
vivermos esses valores da verdadeira Shalom, que
inclui a paz, a não violência, a partilha e a
justiça. A crise atual no sistema financeiro
mundial, com as suas cifras astronômicas de
apoio aos bancos e banqueiros falidos - enquanto
somente migalhas são destinadas aos bilhões de
famintos e sofridos do mundo - demonstra bem
como a sociedade atual é dominada pelos
interesses do lucro e do capital, mesmo em
países que se dizem cristãos. Estamos longe de
um mundo onde Jesus Cristo seja realmente o Rei
- regido pelos valores que Jesus encarnou na sua
pessoa, projeto, ensinamento e opções, e que nós
herdamos como discípulos/as d’Ele.
PRIMEIRO DOMINGO DO ADVENTO (27.11.11)Marcos
13, 33-37“Digo a todos: fiquem vigiando!” Com a
celebração do Primeiro Domingo do Advento, a
Igreja inicia um novo Ano Litúrgico, um ciclo
que celebra todos os principais eventos da vida,
morte e ressurreição de Jesus Cristo. Advento é
um tempo não tanto de penitência, mas de
expectativa e preparação para a vinda do Senhor
no Natal. Três figuras muito importantes da
liturgia do Advento são: o profeta Isaías; o
Precursor, São João Batista; e, Maria de Nazaré,
a Mãe do Senhor. Um tema constante no Advento é
o da vigilância. “O que digo a vocês, digo a
todos: fiquem vigiando”. Obviamente, não no
sentido de vigiar os outros; mas, da vigilância
evangélica, uma atitude constante de compromisso
com o seguimento de Jesus. É preciso vigiar a
nós mesmos, para que não deixemos de pôr em
prática as mesmas atitudes e opções concretas de
Jesus de Nazaré. É vigiar para que façamos
sempre o que Jesus faria se estivesse no meio de
nós hoje. O convite à vigilância não é somente
pessoal, mas também comunitário. Pois, com o
decorrer dos anos, é possível que tanto os
indivíduos como as instituições eclesiais -
congregações religiosas, pastorais específicas,
movimentos de espiritualidade e até as próprias
igrejas - caiam no comodismo, perdendo de vista
a finalidade última da sua atuação, o Reino, se
contentando com uma prática meramente externa de
uma moral ou ética. O texto de hoje convida a
todos nós para que façamos do discernimento um
modo de viver, que sejamos sempre vigilantes
para que o nosso modo de ser, atuar e falar
estejam coerentes com as opções concretas de
Jesus de Nazaré, em favor do Reino de Deus, da
justiça, solidariedade e fraternidade. Daqui
quatro semanas, celebrar-se-á o Natal. Para
muitos, será simplesmente uma festa comercial ou
uma oportunidade de festejar e alegrar-se. Para
outros, mergulhados na miséria e na fome
endêmicas em muitas regiões do Planeta, será sem
sentido. A qualidade do nosso Natal dependerá em
grande parte da qualidade do nosso Advento. Se
fizermos desse tempo um verdadeiro momento de
discernimento, avaliação, vigilância e
renovação, então teremos realmente um Natal - um
renascimento de Jesus na nossa vida. Caso
contrário, somente teremos uma festa no dia 25
de Dezembro, que logo acabará e passará sem
deixar rastros, a não ser dívidas a pagar ou
ressacas! Atendamos o convite de Jesus! Façamos
do Advento deste ano um tempo de avaliação, de
oração, de renovação, e teremos a imensa alegria
de um verdadeiro Natal - um reencontro
verdadeiro com Jesus, o Emanuel - o
Deus-Conosco! “O que digo a vocês, digo a todos:
Fiquem vigiando”.
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