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E O SILÊNCIO... INFORMA?
Não são apenas os países e os povos que dependem, para progredir
tecnologicamente, do acesso e intercâmbio das informações. Cada indivíduo, todo
cidadão, resida onde residir, sem ou com moradia, faminto ou não, analfabeto ou
letrado, desesperado ou tranquilo, precisa diariamente se alimentar de
informações.
Caso não venha participar desse fluxo hodierno, democrático, terá dificuldades
imensas em sua trajetória para se tornar, de fato, pessoa e cidadão, com direito
a buscar, em sua existência, independentemente de seu nível sócio-econômico,
realizar-se num processo contínuo e permanente de aperfeiçoamento de sua
condição humana. Negar-lhe informações equivale a negar-lhe a vida, significa
matá-lo lenta ou rapidamente – isso não importa -, numa atitude de poder
ditatorial que ignora o respeito aos direitos inalienáveis do homem.
O DIREITO À CULTURA
A sobrevivência unicamente nos aspectos físicos e materiais não é o bastante, e
pode ser classificada como injusta porque ignora o cidadão como pessoa humana,
dotada de intelecto, sentimentos, emoções; negligencia os seus anseios
espirituais, intelectuais; parece “esquecer” a sua condição de ser inquieto,
sempre procurando melhorar, compartilhar das manifestações culturais
disponíveis, constantemente desejando se expressar culturalmente, por meio da
comunicação solidária entre seus companheiros de existência, ou até superando as
barreiras de tempo e espaço presentes neste universo do qual fazemos parte, e
assim crescendo, realizando o seu potencial.
O alimentar o corpo para vivificar a mente e o coração – eis a meta de uma
sociedade modernizada porque humanizada. Conceder-lhe moradia digna – outro
dever da comunidade que pratica a solidariedade urgente e por isso não aceita
que seus irmãos não tenham abrigo. O que não conseguimos por ações individuais
constitui tarefa a ser exigida daqueles que têm esse poder e precisam ser
cobrados, numa exigência diária até que os objetivos se concretizem.
Mas... qual o papel dessa cultura que muitos consideram superficial, secundária
ou tesouro particular de alguns? Como transformá-la em instrumento essencial
para combater todas as formas – e todas terríveis, aterrorizantes – do
analfabetismo (pessoal, social, político)? Como inseri-la nos contextos mais
carentes, remotos, quase inconscientes? Como transfigurar essa cultura
incompreendida, desvalorizada, em alimento quotidiano disponível a todos, sem
exceção, porque não fazê-lo seria ignorar a dignidade de todo ser humano? Como
impedir que tal crime contra o cidadão continue a ser praticado, diariamente,
sem impedimento e punição? Como levar o povo a exigir, recusando a alienação que
o torna cada vez mais marginalizado, ter acesso às manifestações literárias e
artísticas ou participar ativamente das mesmas, ou até produzi-las, analisá-las,
interpretá-las e divulgá-las? Como formar os cidadãos de modo que tenham sede e
fome de cultura? E passem a desejar que seus irmãos e companheiros também façam
parte desse banquete do qual ninguém deverá ser excluído?
A INFORMAÇÃO NO PROCESSO DE CIDADANIA
Seria ingenuidade acreditarmos que se alcança a cidadania simplesmente por
decreto.... O processo pode ser lento, sendo tal lentidão resultante de uma
desinformação voluntária ou forçada, fruto de pressões exteriores visíveis ou
disfarçadas por instrumentos sutis de alienação, enfim, mascarada por supostos
benefícios ou conhecimentos forjados para enganar e continuar enganando...
Desde a Grécia Antiga, o conceito de cidadão estava essencialmente fundamentado
em seus deveres para com a cidade, sua comunidade mais próxima; por não serem
considerados pessoas humanas, os escravos também não eram, por conseguinte,
cidadãos... Ao recordarmos a origem etimológica da palavra POLÍTICA, vemos que,
no contexto da cultura greco-romana da Antigüidade Clássica, significou, desde o
início, arte ou ciência de promover o bem comum... todavia, os escravos não
compartilhavam do círculo restrito desse bem comum. Ora, para as massas
famintas, analfabetas, desabrigadas e carentes, ainda que não estejamos teórica
e cronologicamente na Idade Antiga, a criminosa escravidão de milhões de seres
humanos, desamparados em sua dor, continua a existir!
Como fica a nossa ética, diante de tal quadro de marginalização? Se não somos
culpados sozinhos, ainda assim somos culpados ... Embora não compartilhemos os
sofrimentos daqueles milhões de esquecidos e injustiçados, o bom seria que
tivéssemos uma profunda dor de consciência...
Com certeza, a nossa condição de cidadãos não será plena enquanto não incluirmos
aqueles milhões, que devemos chamar a partilhar desse inalienável processo de
cidadania.
SERÁ INALIENÁVEL O PROCESSO DE CIDADANIA?
Ouso dizer que “sim”... ainda que me lembre dos criminosos cumprindo pena, pois
estão na prisão para supostamente viverem um processo de reabilitação, e tal
proposta da sociedade que os alijou justamente de seus convívio indica a
promessa de cidadania.
Todo esforço realizado na prisão, em busca de uma transformação interior dos
detentos, teria como objetivo principal, ao se procurar que aqueles indivíduos
não representem mais um perigo à comunidade, que voltem a assumir (ou pela
primeira vez em sua vida venham a assumir) seu papel de cidadão. Ora, sem
informações que lhes possibilitem ser pessoas úteis aos outros e a si mesmos,
como buscar a sua função social, como mudar, como crescer? Provavelmente
necessitarão, com urgência, logo que saírem das paredes que lhes foram
“familiares” durante algum tempo, de proteção especial. Se tal apoio não
ocorrer, o vazio será preenchido, de novo, por idéias e planos criminosos, em
grupo ou individuais.
As expressões culturais, iniciadas ou interrompidas naquela(s) prisão(ões),
constituiriam oportunidades de redenção interior, de crescimento pessoal voltado
para um público em potencial que representará a sociedade com rosto amigo, pois
a arte tem perfil universal porque tolerante e multidimensional, eclético e
pluralista. O princípio da liberdade norteia as manifestações artísticas, sem
restrição de tempo e espaço, capacitando a uma comunicação mais ampla entre os
seres humanos.
ASSESSORIA CULTURAL: ELO ENTRE ARTISTAS E PÚBLICOS
Formando, educando platéias, os assessores que divulgam eventos na área
cultural, muitas vezes enfrentam um desafio que, escondido, parece não existir.
Lutam contra vaidades pessoais, às vezes durante décadas, sem alcançar sucesso
no seu empenho diário para derrubar/galgar esse Muro de Berlim invisível... As
dificuldades são tantas que alguns desistem, voltando-se para outros setores de
retorno imediato, nos quais se vêem livres de implorar por informações que, na
verdade, se constituem um direito dos cidadãos. Os espaços lhes são negados,
construindo uma espécie de Muralha da China que prejudica artistas, obras e
público, impedindo estes espectadores desinformados de ver, ouvir, questionar,
participar. Como se arte não existisse para alcançar uma platéia sem limitações,
sem restrições de épocas e países; como se as manifestações artísticas e
culturais fossem – apesar de sua proposta tacitamente social – propriedades
egoisticamente eremitas, individualistas, ou político-partidárias.
Como o público que seria beneficiado com as informações ainda não se
conscientizou sobre a importância de uma diversidade de canais e fontes, uma
parcela de culpa também lhe cabe, por não se posicionar em prol de um fluxo
contínuo de dados culturais, valorizando obras, eventos e artistas; permitindo
acesso às propostas artísticas; destacando elementos pioneiros; analisando
pontos em comum ou contraditórios; criando novos espaços; incentivando
iniciativas; provocando experimentos; preservando manifestações tradicionais,
sejam locais, regionais e/ou nacionais. Ao adotar uma postura de quem não tem o
saudável hábito cultural, a platéia em potencial por si mesma se limita,
diminuindo suas oportunidades de lazer e aperfeiçoamento, suas chances de
encontrar uma oportunidade de intercâmbio de idéias e conhecimentos.
Na cumplicidade da omissão, o público se prejudica, acomodando-se em receber
informações de fontes únicas ou daqueles mesmos grupos poderosos, porta-vozes da
grande imprensa ou com interesses parciais porque divulgam somente os eventos
que desejam promover.
AFINAL, COMO O SILÊNCIO PODE INFORMAR?
Quando leitores, espectadores e ouvintes têm formação democrática, conscientes
das batalhas que se travam, diariamente, nos bastidores da informação,
habituam-se a perceber os meandros dessa luta, identificando os vazios, os
canais fechados, as opiniões deturpadas, as omissões tão frequentes... Esses
cidadãos não aceitam um comentário único, uma visão de maioria ou de minoria
rica e poderosa. Buscam outras fontes; enxergam possibilidades pluralistas;
diversificam acessos; visualizam interesses financeiros, apesar de seus
disfarces. São exigentes, ao invés de complacentes. Não se calam, reclamam,
reivindicam com persistência. Essa atitude não-alienada também se mostra
não-alienadora, ao chamar atenção, para outros, sobre os silêncios criminosos
nos meios de comunicação de massa.
É fácil constatar, porém, que analfabetos, famintos e desabrigados, doentes e
marginalizados, veriam essa conscientização, essa independência cultural sempre
atenta, como utopia, diante de sua própria tragédia, que os coloca num desespero
diário para tentar sobreviver nas condições mais adversas possíveis. Ao
reconhecermos isso, também deveremos compreender a enorme responsabilidade da
elite, inclusive a que não está no poder, pois sendo elite, detém uma outra
forma de poder, utilizando a sua visão esclarecida, o seu background
acadêmico-profissional, a sua capacidade hermenêutica, habilitada a interpretar
acontecimentos e informações; e, sobretudo, a sua obsessão maiêutica em
continuar formulando perguntas difíceis, perturbadoras, que tocam nas feridas da
incultura, que revelam.. enquanto questionam. Abençoadas sejam as perguntas que
iluminam nossos caminhos!
Theresa Catharina de Góes Campos
Brasília-DF (1992)
Membro e Assessora de Imprensa da ADUDF – Associação dos Docentes da
Faculdade A.E.U.D. F.
De: artemis coelho
Data: 26 de abril de 2012 14:11
Assunto: RE: O SILÊNCIO ... INFORMA? - Theresa Catharina de Góes Campos
Para: theresa.files
Muito bom, Theresa.
Abraços,
Artemis |
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