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De:
Reynaldo
Ferreira
Data: 9 de agosto de 2012 07:19
Assunto: Comentário: Intocáveis
Para: Theresa Catharina de Goes
Campos
Repassando comentário sobre o filme
"Intocáveis", de Olivier Kanache e
Éric Toledano (não confundir com "Os
Intocáveis", de Brian de Palma), o
mais visto na história do cinema da
França, a ser lançado,
comercialmente, no país, no dia 31
de agosto. Antes, a película poderá
ser vista durante a realização, em
várias capitais brasileiras, do
Festival Varilux do Cinema Francês,
a se iniciar no próximo dia 16
(Quinta-feira). Programa imperdível,
principalmente pela atuação dos dois
atores principais: François Cluzet e
Omar Sy
INTOCÁVEIS
O tema da valoração da amizade,
abordado em Intocáveis
(Intouchables), de Olivier
Nakache e Éric Toledano, é
recorrente, no cinema francês, nos
dias que correm. No caso dessa
comédia dramática, é improvável o
tipo de afeição que, tal como está
exposto, surge do relacionamento
entre um culto e milionário
tetraplégico desde 1993 - a lembrar
talvez o protagonista de O
Escafandro e a Borboleta (2007)
de Julian Schnabel - e um jovem
pobre e imigrante, originário do
Senegal e recém-saído da prisão.
O roteiro de Nakache e Toledano é,
contudo, inspirado em fatos reais,
no livro autobiográfico, editado
entre nós, sob o título Segundo
Suspiro, de Philippe Pozzo Di
Borgo. A obra é constituída não de
uma narrativa, mas de esparsas
reflexões do autor, até de cunho
religioso, sobre sua angústia após
perder a mulher, que lhe deixou uma
filha, e de sofrer uma queda ao se
lançar de parapente do pico de uma
das montanhas de Crest-Voland
- município da Savoia - nos Alpes
franceses.
No intróito, pontuado pelo tema
musical, de Ludovico Einaudi, os
roteiristas usam, como condão para
dar início a um longo flashback,
desabalada corrida, à noite, pelas
ruas de Paris, de uma Maserati,
quatro portas. Ela é dirigida por
Driss (Omar Sy) que, sem se importar
com a perseguição policial, e tendo
Philippe (François Cluzet), o
proprietário, no banco do
passageiro, comete todas as
imprudências no trânsito até ser
detido num ponto, quase à saída da
cidade.
Para se livrar da punição, Driss
alega aos policiais, com a
conivência de Philippe, que sua
pressa é causada pelo fato de estar
a caminho de uma emergência
hospitalar, pois seu patrão, que se
encontra ao seu lado, babando, além
de ser tetraplégico, acaba de sofrer
um AVC, necessitando de urgentes
cuidados médicos. Os policiais
acolhem a justificativa dada por ele
e, compadecidos, lhe oferecem
escolta até o próximo hospital. Ele
saberá, porém, escapulir antes de
dar ingresso no pronto-socorro,
para, em disparada, tomar destino
ignorado que, só ao final da
película, será conhecido pelos
espectadores.
Os bons conhecedores do cinema
francês não deixarão de identificar
nessa e em outras situações, criadas
por Nakache e Toledano, estreitas
semelhanças com as de Mon Pote
(2004), de Marc Esposito. O filme
narra a história da amizade, que se
consolida, entre o dono de uma
concessionária de automóveis, Victor
(Édouard Baer) e Bruno (Benoît
Magimel), um ex-presidiário - grande
admirador, por sinal, como declara,
de Ayrton Senna -, que lhe pede
emprego.
Ou então com as de Meu Melhor
Amigo (2006), de Patrice
Leconte, que mostra a desesperada
procura de um comerciante de
antiguidades, François Coste (
Daniel Auteil), por um amigo,
qualquer que seja, pois não tem
nenhum, a fim de vencer o desafio,
que lhe foi proposto por sua
secretária, Catherine (Julie Gayet).
É um motorista de táxi, também
chamado Bruno (Dany Boon), que vai
salvar a sua situação, isto é, a
carência de ter um amigo verdadeiro.
O que confere mais categoria ao
filme de Nakache e Toledano em
relação à dos anteriormente citados
- e que fez dele o mais visto na
história cinematográfica da França -
é, como se pode avaliar, o seu
aspecto político, relacionado com o
problema da imigração europeia.
Nesse sentido, é preciso compreender
que Driss é um imigrante como o
garoto curdo (Firat Ayverd), vindo
do Iraque que, no drama Bem-Vindo
(2009), de Philippe Lioret,
enternece a alma de um professor de
natação (Vincent Lindon), em Calais,
ao lhe deixar evidente o seu
intento de atravessar a nado o Canal
da Mancha para ir se encontrar com a
namorada, cuja família se mudou para
Londres.
A diretora de arte, Olivia
Bloch-Lainé, ao decorar a rica
mansão parisiense de Philippe,
suscita no espectador o aguçamento
da percepção de detalhes, que
definem não só a personalidade dele,
como também se torna meio de
expressão de suas preferências
artísticas. Vale destacar que tem
esse mesmo propósito a trilha sonora
de Einaudi, composta de peças de
Chopin ( Noturno n. 9), de Berlioz,
de Bach, de Albinoni, de Vivaldi e,
principalmente de Schubert.
É dele a Ave Maria que dá a
Driss, ao chegar, noção precisa do
ambiente em que vai viver durante o
período de adaptação no emprego e do
choque cultural que enfrentará, em
seguida - na verdade, com galhardia
-, dada a sua autenticidade, a qual
acabará por cativar, em definitivo,
o patrão. É bom ressaltar, a
propósito, que ele foi escolhido,
entre vários candidatos, todos
portadores de credenciais
aparentemente mais apuradas do que
as dele, a fim de servir como
acompanhante de Philippe.
Mais do que qualquer outro fator -
até mesmo da convencional direção de
Nakache e Toledano -, são as
interpretações de François Cluzet,
como Philippe, e de Omar Sy, no
papel de Driss, que dão à película o
seu extraordinário poder de sedução.
Os dois atores estão soberbos. Não
há como deixar de admitir, porém,
que Omar Sy - ganhador do Cesar de
Melhor Ator do Ano - incorporou de
tal forma as características de
Driss em sua própria personalidade,
que se faz difícil identificar nele
o que é interpretação. É possível
que, nas primeiras sequências, ele
se mostre um tanto caricato, o que
não seria desejável. Mas, se isso
acontece, é certamente porque os
realizadores quiseram antecipar pela
atuação da personagem o tom de
comédia que pretendiam (e
conseguiram) imprimir na linguagem
narrativa de um tema originalmente
dramático.
REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
ROTEIRO, Brasília, Revista
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FICHA
TÉCNICA
INTOCÁVEIS
INTOUCHABLES
França / 2011
Duração -113 minutos
Direção - Olivier Nakache e Éric
Toledano
Roteiro - Olivier Nakache e Éric
Toledano, inspirado no livro
Segundo Suspiro, de Philippe
Pozzo di Borgo
Produção - Gaumont, TF1 Films
Production, Quad Productions, Ten
Films
Fotografia - Mathieu Vadepied
Trilha Sonora - Ludovico Einaudi
Edição - Dorian Rigal Ansous
Elenco - François Cluzet (Philippe),
Omar Sy (Driss), Anne Le Ny
(Yvonne), Audrey Fleurot (Magalie),
Clotilde Mollet (Marcelle), Alba
Gaia Kraghed Bellugi (Elisa), Cyril
Mende (Adamo).
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