Agente do
FBI
designada para investigar a morte de um
radialista de origem
judaica,
conhece um membro de uma organização
racista,
que extermina judeus e negros, mas fica em
conflito, porque se envolve com ele antes de
saber de sua vida criminosa.
Artigo de
Aramis Millarch originalmente
publicado em 06 de junho de 1989
18 de junho de 1984, Denver,
Colorado: O radialista Alan Berg,
apresentador de um polêmico
programa, ao deixar a estação de
rádio é metralhado por um grupo
radical de direita, que utiliza
metralhadoras MAC-10, privativas das
forças armadas. 8 de maio de 1988,
Los Angeles: "Betrayed", em suas
primeiras exibições públicas,
provoca manifestações de protestos
dos espectadores. No "AMC Century
14", uma espectadora branca obriga a
sessão a ser interrompida, quando
começa a gritar que "nem todos os
brancos são assim", chocada pelas
imagens do filme. Cannes, festival
de 1988: é mostrado, em exibição
paralela, "Radio Talking", o último
filme de Oliver Stone, baseado no
livro-reportagem "Talked do Death -
The Murder of Alan Berg and the Rise
of the New Nazis" (Berkeley Book,
New Jersey, 1987, 309 páginas). xxx
Apesar da advertência de que "in
Betrayed - the story is fiction /
the horror is reality", destacado
nos releases, distribuídos pela
produção e, no final, ter sido
incluída a frase de que "os fatos
aqui abordados são ficção e qualquer
semelhança com pessoas e
acontecimentos é mera coincidência",
a força da realidade é maior.
Afinal, o grego Constantin
Costa-Gravas, 55 anos, não brinca em
serviço: em suas respeitabilíssima
filmografia, tem colocado sempre,
corajosamente, o dedo na ferida das
mais importantes questões políticas:
o colaboracionismo ("Um Homem a
Mais", 1966); a ditadura militar na
Grécia ("Z", 1968) e na América do
Sul ("Estado de Sítio", 1973,
"Desaparecido - Um Grande Mistério",
1982); os crimes do stalinismo ("A
Confissão", 1970); a (in)justiça na
República de Vicchy,
colaboracionista durante a ocupação
da França ("Seção Especial de
Justiça", 1975). Portanto, em sua
segunda produção nos Estados Unidos
(a primeira foi "Missing", há 7
anos, denunciando o golpe militar de
Allende e o assassinato de milhares
de pessoas no Chile), Costa-Gravas
não iria deixar de se voltar a uma
questão política: o racismo e o
crescimento das organizações de
direita, neo-nazistas, nos últimos
anos. Uma questão que embora
denunciada pela imprensa mais
independente tem passado, de forma
despercebida, externamente, no
roldão de notícias que, diariamente,
inundam o mundo. Como "Mississipi em
Chamas", "Betrayed" trata do racismo
nos Estados Unidos. Só que ao
contrário de "Mississipi Burning" -
que teve a superpromoção ao obter
seis indicações ao Oscar) está entre
os filmes de melhor bilheteria deste
ano, "Atraiçoados" está passando
despercebido: foi lançado em São
Paulo e saiu de cartaz em apenas uma
semana, o que se repetirá agora em
Curitiba (Lido I, somente hoje e
amanhã em exibição), já que o
público tem sido reduzidíssimo. Mais
uma prova daquilo que sempre
afirmamos: o mito de "cidade
marketing", com espectadores
"exigentes" (quá, quá, quá) se
dilui. Os curitibanos só vão aos
cinemas quando chegam filmes
badalados, com grandes esquemas de
marketing - e desprezam obras
sérias, importantíssimas como este
filme de Costa-Gravas. Deixa pra lá!
Mais importante do que lamentar o
fracasso em termos de público é
lembrar que "Atraiçoados" se inclui
naquela categoria de
cinema-político, com reflexões para
o espectador consciente da
brutalidade contemporânea. Alguns
críticos lamentaram que o ritmo de
thrilling político, tão
característico da obra de
Costa-Gravas, esteja um tanto
diluído no roteiro que Joe Eszterhas
desenvolveu. Realmente, se comparado
a "Z", "Estado de Sítio" ou "Missing",
"Betrayed" deixa de ter aquela ação
do real, com citações diretas. Na
ficha técnica não consta que
Eszterhas tenha buscado o episódio
da morte do assassino do radialista
Alan Berg para desenvolver o roteiro
- embora a citação inicial seja
óbvia": a investigação do FBI sobre
o grupo terrorista parte da decisão
de levar os assassinos de "Kurt" (o
nome do radialista morto, no filme)
à prisão. Para tanto, uma agente do
FBI, a bela Katherine Weaver (Debra
Winger), envolve-se com o principal
suspeito de liderar o grupo de
extrema direita, o ZOG (Zionist
Occupation Government), Gary Simmons
(Tom Berenger). Surpresa! Gary é um
amoroso pai de dois filhos - as
encantadoras crianças Brian Bosak /
Maria Valdez - herói de guerra do
Vietnã, cujo pai lutou na Europa
contra os nazistas. Viúvo (a esposa
foi assassinada na Califórnia,
depois que o abandonou), oferece, a
princípio, uma imagem de americano
idealista e honesto. A realidade é
bem outra: na verdade, lidera um
grupo de fanáticos poderosos, que
com conexões por todo o país, com
sofisticadas formas de operação
(inclusive a utilização de
computador), prepara um golpe
nacional, a partir do assassinato de
um candidato à presidência dos
Estados Unidos - para que o seu
vice, ligado à organização
extremista, ocupe seu espaço. Neste
aspecto a ficção é que entra no
roteiro - e a love story entre
Katherine e Gary, traz uma certa
quebra no ritmo habitual dos
thrillers políticos de Costa-Gravas,
para decepção de seus admiradores
mais ortodoxos. O que, entretanto,
não invalida a seriedade da denúncia
- bem mais ampla do que a feita por
Parker em "Mississipi em Chamas" -
ao colocar a questão das
organizações de extrema direita - da
medieval Ku Kux Klan a novas siglas,
ZOG, Order, Aryan Nations - como
resultados de uma brutal realidade
dos EUA. Há inclusive alguns
diálogos que procuram uma explicação
para este fenômeno comportamental -
o renascimento do nazismo/racismo
(atingindo judeus, negros,
orientais), quando um velho
fazendeiro diz a Katherine que "eu
possuía uma fazenda e um filho:
sonhava que ele um dia fosse cuidar
da terra. A guerra do Vietnã levou
meu filho, o banco tomou minha
fazenda". Uma referência a questão
econômica, que por força de uma
política cruel tem penalizado também
os pequenos fazendeiros do
Meio-Oeste dos Estados Unidos -
conforme filmes recentes ("Um Lugar
no Coração / Places in the Heart",
1984, de Robert Benton, e
especialmente, "Minha Terra, Minha
Vida / Country", 1984, de Richard
Pearce) denunciaram. Privilegiando,
talvez, a ficção e mesmo um aspecto
do romantismo - no dilema do amor e
do dever entre Katherine e Gary -
"Atraiçoados" é um filme de vigor,
que levanta uma questão importante -
discutida já em "Mississipi Burning"
e que, em maiores detalhes, Oliver
Stone ("El Salvador", "Platoon", "Wall
Street") aborda em "Radio Talking",
que, ao menos em vídeo, tem
programação para chegar dentro de
alguns meses (via Look Vídeo),
detalhando o assassinato (e a ação
dos grupos de extrema direita), de
Alan Berg. LEGENDA FOTO - Debra
Winger interpreta a agente Katherine
Weaver em "Atraiçoados", um filme
político sobre o Neo-nazismo em
escalada nos EUA. Em exibição no
Lido .