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ABANDRAI
Tereza Halliday – Artesã de Textos
Causo puxa causo. Foi o artigo “O Rei e eu” de
Valéria Barbalho, nesta página (DP 12/12/2012)
quem me inspirou a contar o meu e tornar este
último texto de 2012 mais uma homenagem a Luiz
Gonzaga, no ano do centenário de seu nascimento:
Envolvidos na campanha de doações para a
construção do Hospital Infantil Jesus Nazareno,
de Caruaru, meu pai, seus irmãos maçons e
companheiros rotarianos conseguiram que Luiz
Gonzaga doasse a renda de um show para a nobre
causa. Foram entregar-lhe, no palco, presente de
agradecimento, o mais fino da época: uma
caneta-tinteiro Parker 51, reluzente em seu
estojo de veludo. O homenageado sorriu e
comentou: “Quando você vê um vaqueiro todo
lorde, sela de couro brilhoso, espora de
ouro... vai ver, não sabe montar. Assim também
eu com esta caneta... rrê rrê...” (pronunciado
daquele jeito gaiato, muito seu).
Proposta decente para os propósitos do
Réveillon encontrei no Salmo dos Aflitos, também
conhecido como “Abandrai” - composição de Luiz
Gonzaga e Humberto Teixeira. Cito de memória,
respeitando a grafia dos metaplasmos
(deformações fonéticas de certas palavras, pelas
quais as línguas se transformam através dos
séculos):
“Menino de procissão, cordeiro do rebanho
sem fim / me lembro das graças que o povo pedia
pros céus, era assim: / As viurges todas
pocramam tua graça e fremosura / és a rainha dos
povos / e a potretora das almas da povoação de
Nossa Senhora da Raiz!/ Abandrai os corações dos
inguinorantes, abandrai, abandrai, abandrai”
(bis).
“Crescido, agora é que eu sei / que
há outros pra ouvir meu latim / Em nome dos céus
eu reclamo / as graças que pedem pra mim: / As
graças que eu reclamo, em nome dos irmãos
aflitos/ são já conhecidas de todos / e sem elas
o rebanho vai morrendo ou fingindo viver como
Deus é servido./ Abrandai os corações de todos
poderosos / abrandai, abrandai, abrandai” (bis).
O Salmo dos Aflitos é uma valsa composta pelo
Rei do Baião, no estilo das tocadas pelas bandas
de música do interior ao acompanharem
procissões. Neste fim de calendário, amplio sua
mensagem: abrandai os corações dos poderosos,
dos raivosos, dos cobiçosos, dos maldosos de
língua. E abrandemos todos nós no trato com os
outros, para que o novo ano seja realmente
melhor.
(Diário de Pernambuco, 31/12/2012). |
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