CIDADANIA
DERRAPA NAS RUAS
Tereza
Halliday – Artesã de Textos
Amigo
motociclista reporta situações
perigosíssimas enfrentadas por ele nas
ruas desta cidade. Não
é devido aos automóveis e ônibus, mas
sim, por falta de infraestrutura para
acolher veículos motorizados de duas
rodas. E
os não motorizados também. Impávidos
ciclistas! As ciclovias ainda são de faz
de conta, mas, felizmente, os gestores
do espaço público estão correndo atrás
do prejuízo de não havê-las tornado
prioritárias, tempos atrás. Pressão
neles!
Motoqueiro e ciclista, meu amigo é
prudentíssimo, por seu rigor com o
aspecto “segurança”, devido à sua
formação de piloto profissional de
avião. Portanto, não sai por aí fazendo
besteira. Mas se arrisca além da conta,
simplesmente por estar montado numa moto
em ruas e avenidas impróprias para
motociclistas. Enfrenta, a cada metro,
desníveis de calçamento, bocas de lobo
abertas, restos inacabados de obras,
buracos de todos os tamanhos –
verdadeiros alçapões e arapucas para
derrubá-lo. Inconformado, ele pergunta:
“Por que o governo não cuida de dar vias
seguras para motoqueiros, que são mais
vulneráveis e usam um veículo muito
menos poluente e de mais fluidez no
tráfego?”. Sim, reconhece as loucuras de
certos motoqueiros. Mas define o descaso
com o chão das ruas como grande
desrespeito a todos os cidadãos
motociclistas que usam esse veículo para
trabalhar, seja ganhando a vida como
entregadores – motoboys e motogirls -
seja para
se deslocar até o local de trabalho.
Infelizmente, esse desrespeito brabo se
estende aos pedestres também, que usam o
veículo menos poluente do mundo: as
próprias pernas. Muitos
deixariam carros e motos em casa se
pudessem caminhar para o trabalho ou
escola, com segurança e fluidez.
Caminhante contumaz, fui vítima de
fratura por queda em calçada
destrambelhada e de alto risco, tal qual
as ruas enfrentadas pelos motoqueiros. E
olhem que já conheço os buracos e
monturos de cor, nos meus trajetos como
pedestre. O que me vitimou foi um buraco
novo, desconhecido.
Meu amigo
motociclista e eu tivemos o privilégio
de ser educados para ser bons cidadãos.
Daí a tendência a sermos “reclamões” e
indignados. Mas, muitos governantes não
foram educados para ser bons cidadãos e
assim, são incapazes de priorizar, em
decisões políticas e administrativas, o
respeito que jamais aprenderam. A
qualidade das nossas calçadas e ruas é
um ótimo indicador da péssima qualidade
da nossa cidadania. Quem puder emigrar
para um país onde haja pouca coisa a
reclamar, escapará da incúria com o
espaço público brasileiro. Quem for
residente desta cidade e deste país, por
escolha ou falta de opção, seja zen,
olhe o lado positivo de estar aqui e vá
levando. Como dizia minha sogra, “quem
pode, pode, quem não pode se sacode”. Por
isto, danço frevo, xaxado e baião.
(Diário
de Pernambuco, 3/6/2013)