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O NAUFRÁGIO*
Éramos três irmãos - Victoria e Fernando José,
ambos mais moços que eu -, chegando a Brasília
com os nossos pais.
Comigo, eu trazia um corpo diferente. Com essa
aparência física eu costumava ir, com a família,
todas as manhãs, ao Clube Cota Mil, onde
passávamos horas agradáveis (e saudáveis) na
piscina. Nadar nos renovava...no corpo e no
espírito.
Sim, naquela época, éramos três irmãos. E meu
corpo era esbelto. Eu simplesmente aceitava com
naturalidade essa bênção de nossa excelente
condição física, pois não se via obesidade em
nossa família. A obesidade nunca nos preocupou
porque, com o peso sempre adequado, todos nós
lhe desconhecíamos o rosto.
Até que, muitos anos depois, precisei sobreviver
ao naufrágio de meu corpo antigo. Resgatei a
minha vida, sem conseguir, até os dias de hoje,
recuperar aquele meu corpo antigo, que
naufragou, apesar de todos os meus contínuos
esforços, inclusive com ajuda médica e o
acompanhamento de professores de educação
física.
Vou precisar esquecer o meu corpo antigo. Porque
não consigo resgatá-lo. Do naufrágio, salvou-se
apenas o sorriso. Uma lembrança bonita dos
tempos em que éramos três irmãos. E nossos pais
estavam conosco. Fernando José, infelizmente,
deixou que o vício do cigarro lhe reduzisse o
tempo de vida. Nossos pais também já morreram.
Continuam vivos em nosso coração, nas memórias
que hoje nos acompanham em nossa imensa,
dolorosa saudade.
Diante dessas perdas de tão grandes afetos, que
nos causam profundo sofrimento, devo dizer que o
naufrágio do meu corpo antigo, da minha imagem
física de quase cinco décadas, como pessoa
esbelta, quase nada significa...
Theresa Catharina de Góes Campos
São Paulo - SP, 18 de junho de 2013
*In memoriam:
Fernando José Salvador Campos (01/01/1946
-18/06/2007)
De: VICTORIA ELIZABETH BARROS
Data: 21 de junho de 2013 17:13
Assunto: Re: O NAUFRÁGIO
Querida Therezita, me comoveu bastante ler este
belo texto, O Naufrágio, resgatando muitas
lembranças e alguns períodos marcantes de nossa
vida, ao lado dos entes queridos. Mudando de
residência, fazendo novos amigos, tendo que se
adaptar a diversas situações e transformações em
nosso corpo e nossa alma. A felicidade está
nestes pequenos momentos e nas lembranças que
nos levam a reviver fatos importantes, que
influenciaram nossa caminhada de vida e orientam
nossos passos agora, pensando no futuro e no que
poderemos deixar... Um beijo carinhoso da irmã
Victoria.
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Querida irmã Victoria:
Há dois anos eu tentava escrever esta pequena
crônica. Mas não conseguia passar das três
palavras iniciais, tal a emoção da saudade que
me comovia. A introdução lembrava o contexto de
nossa realidade familiar: uma relação fraternal,
de 1948 a 2007, portanto, durante 59 anos, quase
seis décadas. Para resolver esse impasse
literário, porque o coração repetia "Éramos três
irmãos" , precisei recorrer a um artifício, ou
melhor, usei o recurso de abordar, para
desbloquear a mente, travada pelo coração
saudoso, como se fossem desvios, todos
verdadeiros, outros temas e algumas conclusões,
igualmente autênticas. Agradeço a sua generosa
compreensão, ao interpretar o meu texto. Com
amor e carinho, Therezita
De: Suzana
Data: 22 de junho de 2013 04:16
Assunto: RES: Há dois anos eu tentava escrever
esta pequena crônica. Fwd: O NAUFRÁGIO
Muito bonito e, realmente, escrever sobre uma
coisa que a gente precisa encarar de frente nem
sempre é fácil. (...) Bom fim de semana, Suzana
De: Liman Pechliye
Data: 22 de junho de 2013 03:25
Assunto: Re: Há dois anos eu tentava escrever
esta pequena crônica. Fwd: O NAUFRÁGIO
Querida Theresa, não só você, mas a humanidade
vai perdendo muitas coisas ao longo do tempo.
Meu oncologista diz: (quando reclamo do meu
corpo, da minha falta de energia, da minha falta
de força, etc.) "Todos nós passaremos por esta
ponte".
Você acha que o seu corpo naufragou, mas
perguntou aos outros como enxergam você???
Acho você uma mulher forte, harmoniosa, com um
rosto e sorriso belíssimo, gentil e educada;
acima de tudo, boníssima!!! Além de tudo isso, é
poetisa e escritora sensível, que na maioria das
vezes, me comove profundamente. Resumindo, é um
ser belíssimo!!!
Todos temos perdas, você foi salva do naufrágio,
pois existem pessoas que perdem tudo,
principalmente a dignidade e não têm
absolutamente nada para contar!!!
São essas as palavras que lhe dedico, como amiga
que a respeita, admira e lhe quer muito bem.
Leman
De: Milza Guidi
Data: 12 de junho de 2015
Muito belo, o seu texto. No balanço de perdas e
ganhos da vida, você, com certeza, apesar das
perdas, saiu ganhando!
Milza Guidi |
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