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EM UMA ARANDELA, A ESTRELA
REFUGIADA
(miniconto em verso e prosa)
Já no entardecer, ao titubear,
no gaguejar das penumbras
a sombra claudicante revela
os mistérios de uma arandela.
Trazida por mãos amigas, a peça
antiga, em madeira, encontrada
na simplicidade enriquecedora de
um vilarejo que se esconde nas
dobras do tempo, no interior de
Minas Gerais. Todavia, a roca de
fiar poderia vir de qualquer
outro lugar, de outros
endereços, sem nome de rua ou
número de casa. Já foi popular.
Uma presença comum, obrigatória,
nos lares e nas fazendas de
outrora.
Trêmula, uma arandela ilumina,
na varanda, a roca de fiar.
Exibindo arabescos na estrutura
metálica, esses recortes nas
laterais da arandela revelam
segredos, entrevistos nas
aberturas dos desenhos...
Sofrendo de ansiedade, uma
diminuta estrela se refugiou na
arandela, ainda em pânico,
depois que, surpreendida por uma
experiência de explosão nuclear,
ficou aterrorizada.Testemunha
relutante, com medo de relatar,
buscando esquecer o que viu.
Hesita em depor sobre o que não
consegue compreender.
Na varanda, a roca de fiar -
iluminada
por uma pequena estrela
atormentada -
foi colocada em posição
privilegiada.
À sua frente, o que se vê faz
bem aos olhos. Acredito que
também pode trazer a cura
emocional a quem escolheu
continuar a brilhar, mesmo
escondida.
No meu jardim terapêutico,
imaginário, mas nem por isso
menos verdadeiro, há um canteiro
só de livros (os favoritos, os
mais queridos, com anotações
manuscritas e trechos
sublinhados), ao lado de outro
canteiro, exclusivo para cartas
e bilhetes que considero
importantes demais para serem
jogados fora. Na estufa, estão
protegidas as sementes dos
projetos sonhados.
Em mais um outro recanto, ficam
as fotos, trazendo as memórias
do tempo veloz e fugidio. Nessas
fotografias, as recordações
visuais, evocadoras de instantes
e rotinas, recuperadas pelo
nosso olhar de carinho e
saudade, fazendo voltar, para
uma visita cordial, um "chá das
cinco", os anos que se foram e,
na realidade, não retornam mais
. Depositários de sua herança,
um tesouro impossível de
contabilizar, somos herdeiros
das lições de vida que nos
deixaram.
Mais adiante, vivem as flores,
em áreas separadas por espécie,
cores e tamanhos; junto a uma
incubadora espaçosa de lagartas,
à espera do tempo certo para a
metamorfose em borboletas. Para
acompanhar o voo dos anjos, as
borboletas abrirão as asas em
voos coloridos.
Tudo parece organizado, no
entanto, os vagalumes ignoram os
limites dos canteiros, as
restrições da estufa, exercendo
a liberdade de movimentação, na
espontaneidade da alegria com
que percorrem o terreno.
Na contemplação da saudade,
sinto a bênção do vento em ação,
a espalhar o perfume das rosas.
Não consigo impedir, porém,
que o dinamismo da ventania
fragilize ainda mais, com vigor,
todas as flores ali cultivadas.
No ostracismo a que ficou
relegada,
permanece em repouso a roca de
fiar,
esquecida, a evocar outras
épocas.
Uma imagem de ausências. De
muitas arandelas. Sem estrelas
refugiadas recebendo abrigo e
proteção. Despertando, no
entardecer do dia e nas
alvoradas, o nosso respeito por
uma luz que, em seu
recolhimento,
nos ajuda a vencer as sombras
para caminhar.
Theresa Catharina de Góes Campos
Brasília - DF, 13 de fevereiro
de 2014
De: Tereza Halliday
Data: 16 de fevereiro de 2014
Therezita:
Primeiro fui ao dicionário para
aprender o que é arandela.
Depois percorri seu conto em
verso e prosa, encantada com os
canteiros, mais do que a estrela
refugiada, esta em si, um
primor.
Nesta manhã de domingo, ótimo
passeio matutino em seu jardim e
nas iluminações reveladas ou
sugeridas.
Carinhoso abraço, Tereza Lúcia.
---------- Mensagem encaminhada
----------
De: Theresa Catharina de Goes
Campos
Data: 17 de fevereiro de 2014
Estimada Tereza Lúcia:
Sinto-me feliz e grata a você
pelo acolhimento ao meu pequeno
conto.
A inspiração surgiu quando
recebi, do amigo Walter
Rodrigues Ferreira (webmaster de
meus sites jornalísticos), uma
arandela (estava escrito na
caixa) como presente de
aniversário.
Confesso que eu também
desconhecia o significado da
palavra "arandela", o que me fez
recorrer ao dicionário.
Ao abrir a caixa, retirando o
objeto, encantei-me com a
lanterna antiga e a sonoridade
lírica do vocábulo! Percebi que
combinava bastante com uma de
minhas palavras favoritas -
estrela. Ambas - estrela e
arandela - evocam luz. A partir
dessa constatação, nasceu o
texto.
Com amizade e carinho,
Therezita
De: Malu Perlingeiro
Data: 17 de fevereiro de 2014
Lindo! Miniconto inspirador.
Beijos e carinho,
Malu
De: Walter Ferreira
Data: 17 de fevereiro de 2014
Estimada Theresa Catharina,
A Senhora, como de costume,
transformou algo simples em algo
especial!
Abraços e parabéns pela grande
sensibilidade,
Walter
De: Sonia Maria Ferraz
Esposito
Data: 17 de fevereiro de 2014
Muito lindo! Obrigada,Theresa,
seus textos são maravilhosos!
Abração,
Sonia*
De: Mathilde Maria Cota
Data: 18 de fevereiro de 2014
Obrigada, Therezita, pelo
belíssimo miniconto. Imprimi
para tê-lo sempre mais perto de
minha cabeceira.
Mathilde Maria
De: artemis
coelho
Data: 18 de fevereiro de 2014
Que lindo, Theresa! e achei
muito legal a forma em verso e
prosa. Gostei muito!
Artemis
De: Liman Pechliye
Data: 21 de fevereiro de 2014
Querida Catharina, amei o conto.
Como sempre, você consegue me
emocionar!
Espero que tudo esteja bem com
você. Muita saudade.
Beijos e abraços,
Leman
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