|
|
|
|
|
|
O PRODUTO CINEMATOGRÁFICO
Guido Bilharinho
Em cinema, mais do que em qualquer outra
manifestação artística, confunde-se comumente
técnica, profissionalismo e habilidade com arte.
A realização fílmica pressupõe determinada
infra-estrutura, conquanto muito inferior ao que
se alardeia, mas, sempre, de qualquer modo,
necessária, por mínima que seja.
Por sua vez, toda infra-estrutura exige recursos
financeiros, os quais, reunidos, deflagram
processo técnico-industrial.
Quanto maiores e mais bem administrados esses
recursos, mais amplo o poder de contratação dos
melhores técnicos e profissionais do ramo, como
acontece nos demais empreendimentos industriais.
Requer-se, também, no caso, como em qualquer
caso semelhante, sucessão e acúmulo de
experiências individuais e coletivas que, com o
tempo, compõem, e, em muitas circunstâncias,
cristalizam-se numa tradição.
O cinema estadunidense reúne esses elementos em
alto grau de desenvolvimento, não sendo, pois,
nenhuma surpresa ou fenômeno o estágio (ou
estádio, como preferem os puristas) atingido por
sua indústria cinematográfica.
Alude-se propositadamente à indústria e não a
cinema, já que, com as exceções de praxe - uma
delas ocorrente em vários, não em todos, os
filmes do cinema independente dos Estados Unidos
- não se realiza mais cinema, porém, produzem-se
filmes, que saem dos estúdios como qualquer
outro artefato procedente das fábricas, a
exemplo de sabonete, sapato, pasta dental, etc.
Evidente que, à semelhança dos demais produtos,
sua “qualidade” é extremamente variada e
variável, não se podendo esquecer que a referida
“qualidade” configura-se a partir do objetivo
proposto. Como, na hipótese, a finalidade é
agradar o público para faturar, esses, pois,
seus parâmetros e medidas.
Realizam-se, então, filmes embasados por alta
proficiência técnica e elevado grau de
profissionalismo.
Em consequência, nessa perspectiva, existem os
filmes apropriados e os inapropriados e toda a
gama intermediária entre tais padrões,
incluindo-se também os que os extrapolam para
mais ou para menos.
Como a maioria absoluta dos espectadores encara
o cinema apenas como mero desfrute diversional,
seu critério de julgamento pauta-se também por
essa concepção. Apropriados, pois, seriam os
filmes técnica e profissionalmente bem feitos e
conduzidos, com estória atraente, recheada dos
ingredientes destinados a alegrar, seduzir e
emocionar.
Além dessa categoria de espectadores, boa parte
do jornalismo cinematográfico − não confundi-lo
com a crítica − ao procurar atender a essas
preferência e expectativa, incessantemente
alardeia esse tipo de produto (industrial)
cinematográfico, propositadamente ressaltando e
valorizando os aspectos e elementos que o
caracterizam como espetáculo e não como arte. O
produto é o espetáculo, resultado do processo
fílmico industrial. O espetáculo é o negócio.
Esse tipo de jornalismo cinematográfico
insere-se nos desdobramentos da indústria do
entretenimento e existe também em outras áreas,
a exemplo, principalmente, da música. É
confundido com crítica de cinema, quando, na
realidade, não passa de marketing promocional.
Daí a razão de filmes absolutamente
inexpressivos sob o ponto de vista artístico e
cultural, mas, possuidores de virtualidades
técnico-profissionais, que os tornam grandes
espetáculos, ocuparem excessivos tempo e espaço
nos meios eletrônicos de comunicação e nos
cadernos de variedades dos jornais, alimentando,
mantendo e procurando ampliar o mercado para
tais produtos, que rendem, em suas às vezes
gigantescas campanhas promocionais, grandes
verbas publicitárias. Negócios, comércio, renda
e lucro são, pois, os objetivos principais. De
quebra, como poderoso e eficiente efeito
colateral, a manutenção da inconsciência
coletiva.
Poucas são ainda as pessoas que conseguem se
livrar da imensa cortina de desinformação e
enganos que os meios ditos de informação
produzem na sociedade moderna, cada vez mais
dominada, mesmerizada e condicionada por sua
insidiosa, eficaz e permanente campanha
deformadora e enganosa, a serviço da grande
engrenagem industrial-comercial, na qual tais
meios também se incluem.
(do livro inédito Ficção e Cinema)
(Obras-Primas do Cinema Brasileiro - toda
segunda-feira novo artigo em
https://www.facebook.com/guidobilharinho/)
______________
Guido Bilharinho é advogado atuante em Uberaba,
editor da revista internacional de poesia
Dimensão de 1980 a 2000 e autor de livros de
Literatura (poesia, ficção e crítica literária),
Cinema (história e crítica), História (do Brasil
e regional). |
|
|
|