Theresa Catharina de Góes Campos

 

 

 
RESGATAR  A  HONRA  DE  UMA  PALAVRA

Uma palavra vitoriosa através dos séculos - política - precisa de nosso empenho para o resgate de sua dignidade. A valorização necessária, que os tempos de hoje exigem de nós, começa por uma reflexão crítica do nível de afirmação de nossa cidadania.

Muitos não conhecem o significado etimológico: historicamente, POLÍTICA  é a arte de promover o bem comum. Esse legado cultural nós devemos à civilização greco-romana que, na Antiguidade Clássica Ocidental, definia a pessoa humana em sua condição de cidadã, portanto, em suas relações com a "polis", sua cidade, em contexto de direitos e responsabilidades. Em textos do século IV a.C., filósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles já ensinavam de acordo com uma perspectiva universal, com propostas de atitudes e pensamentos mais avançados e permanentes que as conquistas violentas, imperialistas dos exércitos gregos.

O motivo de nossas considerações está na deterioração que a palavra POLÍTICA vem sofrendo, ao assumir uma conotação negativa, relacionada às ações nada louváveis de candidatos e ocupantes de cargos públicos envolvidos em atos de corrupção dos mais variados tipos, iludindo, mentindo, praticando a ambiguidade de atitudes em nome de interesses inconfessáveis. 

Embora as Universidades ofereçam Departamentos e Cursos de graduação e pós-graduação na área de Ciência Política, os cidadãos leigos continuam a utilizar  o vocábulo POLÍTICA de forma preconceituosa. Assim, quando alguns denominam organizações, movimentos e ações como "políticas" com a pretensão de desmoralizá-los, ou numa tentativa de convencer os desavisados no sentido de negarem apoio ou sua solidariedade ativa, alegam que as razões daquelas manifestações são "políticas". Utiliza-se tal artifício vocabular para indicar o que seria uma ausência de fundamentação legítima. Acontece que a POLÍTICA trata da sociedade, de suas relações com o Poder e com o Estado, bem como dos direitos, de garantias e deveres dos cidadãos, no seu contexto histórico-legal e sócio-econômico. Males e benefícios, quase todas as conquistas sociais, em sua aplicação na vida de qualquer pessoa, envolvem aspectos e consequências políticas.

Bertolt Brech lembrou a responsabilidade de cada um de nós, denunciando a omissão: "O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político (...) se orgulha e estufa o peito, dizendo que odeia a política. Não sabe (...) que, da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, o assaltante e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio das empresas nacionais e internacionais."

De forma proposital ou não, os que se declaram viver com atitudes "não-políticas" estão reconhecendo a própria alienação, ignorando os benefícios advindos à sociedade pela atuação de movimentos políticos como a Renascença, a Revolução Americana, a Revolução Francesa e muitos outros que a História registra.

Voltando a citar Brechet: "A verdade é filha do Tempo", não deveríamos admitir o esquecimento das ações políticas de líderes como Simon Bolívar, Tiradentes e os Inconfidentes de Vila Rica, Frei Caneca, Evaristo da Veiga e tantos outros exemplos memoráveis de "interferência" no status quo. As campanhas de abolição da escravatura, do sufrágio universal e contra o "apartheid" sul-africano foram, todas, políticas. 

O Cristianismo também, ainda que seja uma transformação espiritual, continua atuando, por meio de suas lideranças clérigas e leigas, em dimensões político-sociais, denunciando situações e práticas de desrespeito à pessoa humana, exigindo mudanças em governos e legislações, visando à correção de injustiças, conclamando adeptos a trabalharem em prol dos irmãos carentes e das comunidades menos favorecidas ou negligenciadas.

Não sejamos alienados. Demonstremos nossa conscientização, engajemo-nos na promoção do bem comum, missão em conformidade com o mais autêntico significado desta palavra de nobreza histórica: POLÍTICA.         

Theresa Catharina de Góes Campos
Brasília - DF, junho de 1991

De: Milza Guidi
Data: 12 de fevereiro de 2017

Excelente artigo. Parabéns!
Milza Guidi
Advogada, escritora e poeta
Brasília - DF


De: Maria do Carmo Pereira Coelho 
Data: 13 de fevereiro de 2017 12:08

Ótimo! Um abraço!
MCarmo
Maria do Carmo


De: Só o Senhor é DEUS!
Data: 13 de fevereiro de 2017

Olá, Catharina, 
De acordo, no sentido de resgatar o Bem Comum (Política), não só pelo Poder Público, como também pelas empresas privadas, às quais o Estado tem delegado tarefas e prerrogativas, tipicamente dos entes públicos...  Entre vários dos primeiros artigos que redigi, e  publicados, há um sobre essa questão. E política (Moral)  significa Ética, outro conceito inseparável da mesma.
Atenciosamente,
Agnes Altmann


De: Reynaldo Ferreira
Data: 18 de fevereiro de 2017

Ao repassar este providencial artigo da jornalista Theresa Catharina de Góes Campos, sugerindo o resgate da dignidade, de outros tempos, da palavra "política", cujo significado etimológico é a arte de promover o bem comum, algumas reflexões, inevitavelmente, surgem também sobre a palavra "arte", que, como "cultura," é indissoluvelmente ligada a dinheiro, muito dinheiro.
Há mesmo uma personagem de um dos mais belos filmes de Jean-Luc Godard, "O Desprezo", o qual afirma que, ao ouvir as duas palavras, já mete a mão no bolso para tirar logo o talão de cheques. Para que artistas do cinema brasileiro, hoje estatizado, lamentem a queda de uma ex-presidente corrupta, no tapete vermelho de Cannes ou de Berlim, por exemplo, custa muito dinheiro, negado, no País, aos doentes e aos que passam fome. Qualquer arte, portanto, depende
 de muita grana. E, nem se fala, em se tratando dessa pretensa arte de promover o bem comum.
Os que a ela se dedicam, principalmente nos regimes republicanos, para se manterem como profissionais, agarrados sempre ao poder - a meu ver, um parlamentar só poderia se eleger para duas sessões legislativas - necessitam de muito dinheiro a fim de alimentar suas rasteiras campanhas eleitorais. Existem esquemas - que o cineasta José Padilha, um  ex-comunista, depois que foi viver em Los Angeles, agora denomina de mecanismos -, de dentro e de fora do governo, como o da Odebrecht, a seduzi-los, a toda hora, para que promovam isso ou aquilo, mas nada para o bem comum. 
Nos regimes monárquicos, o rei exerce o poder moderador para não deixar que essa distorção aconteça, causando prejuízo ao povo, que, nas repúblicas, fica a ver navios, num salve-se quem puder. Em vista disso, nos regimes monárquicos, como na Inglaterra,  um juiz anda de metrô, um parlamentar jamais tem a mordomia dos parlamentares das repúblicas. Não falta razão, portanto, para que as nações mais felizes e inovadoras do mundo - como a holandesa, a dinamarquesa - sejam as que vivem sob regime monárquico. Nesses países, sim, a palavra "política" tem a dignidade, que o legado cultural greco-romano lhe outorgou, reclamado pela articulista.. Agora, leiam o artigo da Theresa Catharina, RESGATAR  A HONRA DE UMA PALAVRA.
Reynaldo Domingos Ferreira
 

 

Jornalismo com ética e solidariedade.