RESGATAR A HONRA DE UMA PALAVRA
Uma palavra vitoriosa através dos séculos -
política - precisa de nosso empenho para o
resgate de sua dignidade. A valorização
necessária, que os tempos de hoje exigem de nós,
começa por uma reflexão crítica do nível de
afirmação de nossa cidadania.
Muitos não conhecem o significado etimológico:
historicamente, POLÍTICA é a arte de promover o
bem comum. Esse legado cultural nós devemos à
civilização greco-romana que, na Antiguidade
Clássica Ocidental, definia a pessoa humana em
sua condição de cidadã, portanto, em suas
relações com a "polis", sua cidade, em contexto
de direitos e responsabilidades. Em textos do
século IV a.C., filósofos como Sócrates, Platão
e Aristóteles já ensinavam de acordo com uma
perspectiva universal, com propostas de atitudes
e pensamentos mais avançados e permanentes que
as conquistas violentas, imperialistas dos
exércitos gregos.
O motivo de nossas considerações está na
deterioração que a palavra POLÍTICA vem
sofrendo, ao assumir uma conotação negativa,
relacionada às ações nada louváveis de
candidatos e ocupantes de cargos públicos
envolvidos em atos de corrupção dos mais
variados tipos, iludindo, mentindo, praticando a
ambiguidade de atitudes em nome de interesses
inconfessáveis.
Embora as Universidades ofereçam Departamentos e
Cursos de graduação e pós-graduação na área de
Ciência Política, os cidadãos leigos continuam a
utilizar o vocábulo POLÍTICA de forma
preconceituosa. Assim, quando alguns denominam
organizações, movimentos e ações como
"políticas" com a pretensão de desmoralizá-los,
ou numa tentativa de convencer os desavisados no
sentido de negarem apoio ou sua solidariedade
ativa, alegam que as razões daquelas
manifestações são "políticas". Utiliza-se tal
artifício vocabular para indicar o que seria uma
ausência de fundamentação legítima. Acontece que
a POLÍTICA trata da sociedade, de suas relações
com o Poder e com o Estado, bem como dos
direitos, de garantias e deveres dos cidadãos,
no seu contexto histórico-legal e
sócio-econômico. Males e benefícios, quase todas
as conquistas sociais, em sua aplicação na vida
de qualquer pessoa, envolvem aspectos e
consequências políticas.
Bertolt Brech lembrou a responsabilidade de cada
um de nós, denunciando a omissão: "O pior
analfabeto é o analfabeto político. Ele não
ouve, não fala nem participa dos acontecimentos
políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o
preço do feijão, do peixe, da farinha, do
aluguel, do sapato e do remédio dependem das
decisões políticas. O analfabeto político (...)
se orgulha e estufa o peito, dizendo que odeia a
política. Não sabe (...) que, da sua ignorância
política nasce a prostituta, o menor abandonado,
o assaltante e o pior de todos os bandidos, que
é o político vigarista, pilantra, o corrupto e
lacaio das empresas nacionais e internacionais."
De forma proposital ou não, os que se declaram
viver com atitudes "não-políticas" estão
reconhecendo a própria alienação, ignorando os
benefícios advindos à sociedade pela atuação de
movimentos políticos como a Renascença, a
Revolução Americana, a Revolução Francesa e
muitos outros que a História registra.
Voltando a citar Brechet: "A verdade é filha do
Tempo", não deveríamos admitir o esquecimento
das ações políticas de líderes como Simon
Bolívar, Tiradentes e os Inconfidentes de Vila Rica, Frei Caneca,
Evaristo da Veiga e tantos outros exemplos
memoráveis de "interferência" no status quo. As
campanhas de abolição da escravatura, do
sufrágio universal e contra o "apartheid"
sul-africano foram, todas, políticas.
O Cristianismo também, ainda que seja uma
transformação espiritual, continua atuando, por
meio de suas lideranças clérigas e leigas, em
dimensões político-sociais, denunciando
situações e práticas de desrespeito à pessoa
humana, exigindo mudanças em governos e
legislações, visando à correção de
injustiças, conclamando adeptos a trabalharem em
prol dos irmãos carentes e das comunidades menos
favorecidas ou negligenciadas.
Não sejamos alienados. Demonstremos nossa
conscientização, engajemo-nos na promoção do bem
comum, missão em conformidade com o mais
autêntico significado desta palavra de nobreza
histórica: POLÍTICA.
Theresa Catharina de Góes Campos
Brasília - DF, junho de 1991
De: Milza Guidi
Data: 12 de fevereiro de 2017
Excelente artigo. Parabéns!
Milza Guidi
Advogada, escritora e poeta
Brasília - DF
De: Maria do Carmo Pereira Coelho
Data: 13 de fevereiro de 2017 12:08
Ótimo! Um abraço!
MCarmo
Maria do Carmo
De: Só o Senhor é DEUS!
Data: 13 de fevereiro de 2017
Olá, Catharina,
De acordo, no sentido de resgatar o Bem Comum
(Política), não só pelo Poder Público, como
também pelas empresas privadas, às quais o
Estado tem delegado tarefas e prerrogativas,
tipicamente dos entes públicos... Entre vários
dos primeiros artigos que redigi, e publicados,
há um sobre essa questão. E política (Moral)
significa Ética, outro conceito inseparável da
mesma.
Atenciosamente,
Agnes Altmann
De: Reynaldo Ferreira
Data: 18 de fevereiro de 2017
Ao repassar este providencial artigo da
jornalista Theresa Catharina de Góes Campos,
sugerindo o resgate da dignidade, de outros
tempos, da palavra "política", cujo significado
etimológico é a arte de promover o bem
comum, algumas reflexões, inevitavelmente,
surgem também sobre a palavra "arte", que, como
"cultura," é indissoluvelmente ligada
a dinheiro, muito dinheiro.
Há mesmo uma personagem de um dos mais belos
filmes de Jean-Luc Godard, "O Desprezo", o qual
afirma que, ao ouvir as duas palavras, já mete a
mão no bolso para tirar logo o talão de cheques.
Para que artistas do cinema brasileiro, hoje
estatizado, lamentem a queda de uma
ex-presidente corrupta, no tapete vermelho de
Cannes ou de Berlim, por exemplo, custa muito
dinheiro, negado, no País, aos doentes e aos que
passam fome. Qualquer arte, portanto, depende
de muita grana. E, nem se fala, em se tratando
dessa pretensa arte de promover o bem comum.
Os que a ela se dedicam, principalmente nos
regimes republicanos, para se manterem como
profissionais, agarrados sempre ao poder - a meu
ver, um parlamentar só poderia se eleger para
duas sessões legislativas - necessitam de muito
dinheiro a fim de alimentar suas
rasteiras campanhas eleitorais. Existem esquemas
- que o cineasta José Padilha, um ex-comunista,
depois que foi viver em Los
Angeles, agora denomina de mecanismos -, de
dentro e de fora do governo, como o da
Odebrecht, a seduzi-los, a toda hora, para que
promovam isso ou aquilo, mas nada para o bem
comum.
Nos regimes monárquicos, o rei exerce o poder
moderador para não deixar que essa distorção
aconteça, causando prejuízo ao povo, que, nas
repúblicas, fica a ver navios, num salve-se quem
puder. Em vista disso, nos regimes monárquicos,
como na Inglaterra, um juiz anda de metrô, um
parlamentar jamais tem a mordomia dos
parlamentares das repúblicas. Não falta
razão, portanto, para que as nações mais felizes
e inovadoras do mundo - como a holandesa, a
dinamarquesa - sejam as que vivem sob regime
monárquico. Nesses países, sim, a palavra
"política" tem a dignidade, que o legado
cultural greco-romano lhe outorgou, reclamado
pela articulista.. Agora, leiam o artigo da
Theresa Catharina, RESGATAR A HONRA DE UMA
PALAVRA.
Reynaldo Domingos Ferreira
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