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A banalização do mal
De: LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
Date: dom, 5 de mai de 2019
A BANALIZAÇÃO DO MAL
LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
É inacreditável que, depois de tanta discussão
sobre o assunto, de tantas manifestações da
população brasileira, de tantas tentativas de
sanar o mal, ainda estejamos a ver o mesmo
perverso problema: a reiterada tentativa de
parlamentares de trocarem seus votos a favor das
reformas apresentadas pelo Executivo, por
benesses e cargos na máquina burocrática de
governo.
Compreendemos o amplo significado dessa postura
tradicional da classe política? Salvo engano,
ela possui algumas características.
Primeiramente, um receio atávico de perder o
poder, ao aprovar medidas que, embora destinadas
a prover um futuro melhor para a sociedade,
signifiquem restrições de antigos direitos.
Trazendo descontentamento em eleitores. Mesmo
que a natureza destes direitos tenha perdido a
validade ao longo do tempo. Pois como aceitar
aposentadorias aos 50 anos ou benefícios para
uma pequena parcela da população, muito maiores
do que os concedidos a ampla base dos mais
pobres? Ou vitimizar a população do campo,
tornando-a um peso para os citadinos? Ou igualar
o benefício de quem nunca trabalhou com aquele
que contribuiu?
No fundo, é a questão da justiça social sendo
colocada na mesa. Tornando mais racional o
Estado de Bem-Estar, cujas concessões foram
discutidas e reformuladas há muito tempo em
vários países. Até como forma de torná-lo
viável. O importante são as Políticas
compensatórias, que deveriam ser rigorosamente
acompanhadas e em consonância com as
necessidades da população carente.
Um outro aspecto desta postura de
comercialização da política é o fato de que ela
invalida o mandato parlamentar. Quando o voto no
Parlamento não tem respaldo do conhecimento, da
convicção e da coragem políticas, ele não tem
valor. É apenas uma moeda de compra. Um atestado
da cínica inconsciência parlamentar para o valor
da representação política.
Por outro lado, trocar votos por cargos no
Governo é querer estender os tentáculos do
Legislativo sobre o Executivo. É ampliar um
campo de influência que serviu, no passado
recente, à corrupção que varreu e continua
presente no país, de ponta a ponta. Com a
efetiva degradação dos serviços públicos. E
mais, é menosprezar, um outro aspecto desta
situação, o significado da participação
política. Ou seja, o engajamento, a presença, o
debate, a apresentação do contraditório, o
controle político das reformas e das Políticas
em andamento. Trata-se de construir decisões,
assumindo a responsabilidade do momento político
e o amadurecimento das instituições.
Ao manter esta prática perversa de
comercialização da política, perde-se a
oportunidade de intervir na falta de
credibilidade do Congresso. Permanece a
percepção de sua fraqueza institucional, ao
permitir práticas casuísticas, voltadas para
seus interesses estritamente partidários e
pessoais, de poder e enriquecimento ilícito.
Fragmentando-se assim as instituições, do ponto
de vista ético e cívico. Colocando em risco a
função do Parlamento, quanto ao controle do
Executivo. Na medida em que aqueles que deveriam
ser avaliadores e críticos das políticas, se
tornam partícipes da burocracia governamental.
Enfim, em nenhuma hipótese é possível considerar
normal a troca de votos no Parlamento por cargos
e benesses, para aprovação de reformas
apresentadas pelo Executivo. Isto é fragilizar a
democracia, enfraquecer a cidadania, aumentar a
desconfiança e o desrespeito às instituições.
Isto é a banalização do mal na política.
(05/2019/luiza) |
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